Decisões conflitantes
Deveria entrar em vigor em 4 de setembro uma regra da Federal Trade Commission (FTC) dos Estados Unidos, aprovada em maio, que anularia, nos contratos de emprego, os acordos de não concorrência (noncompete agreements — ou “cláusulas de não concorrência”). Mas uma juíza federal anulou a regra.
A juíza Ada Brown, de um tribunal federal no Texas, decidiu que a FTC não tem autoridade legal para emitir a regra que proibiria empregadores de forçar novos empregados a assinar acordos que os impediriam de trabalhar para empresas concorrentes ou de abrir uma empresa no mesmo ramo de negócios, caso deixassem o emprego.
A FTC aprovou a regra por 3 votos (democratas) a 2 (republicanos). Os democratas da comissão, bem como os defensores da regra, argumentam que tais acordos limitam injustamente a competição, o que viola a lei antitruste do país, e restringem o salário e a mobilidade dos trabalhadores.
Os republicanos da comissão, bem como entidades empresariais, argumentam que o Congresso não pretendeu dar à FTC esses poderes tão amplos e que banir acordos de não concorrência torna difícil proteger segredos comerciais e outras informações confidenciais.
De certa forma, isso repercute a recente decisão da Suprema Corte que revogou o precedente “Chevron Deference”, que criou a “Doutrina Chevron”, segundo a qual os juízes devem acatar a regulamentação, pelos órgãos governamentais, de leis que são ambíguas ou omissas.
“A FTC excedeu sua autoridade ao banir práticas que considera métodos injustos de concorrência, criando regras com efeitos tão amplos. O papel de um órgão governamental é fazer o que o Congresso lhe diz para fazer, não o que pensa que deve fazer”, escreveu a juíza.
“Mesmo que tivesse poder para adotar tal regra, a FTC não justificou o banimento de, praticamente, todos os acordos de não concorrência, em vez de visar apenas a acordos de não concorrência específicos e danosos. Isso torna a regra arbitrária e caprichosa”, declarou a julgadora, que foi nomeada pelo ex-presidente republicano Donald Trump.
Decisões conflitantes
Na Pensilvânia, a juíza federal Kelley Brisbon Hodge, nomeada pelo presidente democrata Joe Biden, decidiu o contrário. Em julho, ela declarou que “a FTC agiu dentro de sua autoridade para emitir a regra e que concluiu razoavelmente que os acordos de não concorrência dificilmente são devidamente justificados”.
Com essas duas decisões conflitantes — e uma terceira da Flórida —, seguidas de possíveis decisões conflitantes nos tribunais federais de recurso, o destino da questão será, certamente, a Suprema Corte.
Nos estados também há regras conflitantes. Três estados — Califórnia, Dakota do Norte e Oklahoma — têm pelos menos algumas cláusulas que limitam acordos de não concorrência. Em 11 estados e no Distrito de Colúmbia os empregados com salários abaixo de um certo limite ou pagos por hora não estão sujeitos a esses acordos.
Declarações contraditórias
A porta-voz da FTC, Victoria Graham, declarou: “Estamos decepcionados com a decisão da juíza Ada Brown e continuaremos lutando para impedir a não concorrência que restringe a liberdade econômica dos trabalhadores americanos, dificulta o crescimento econômico, limita a inovação e congela os salários. Estamos considerando seriamente um possível recurso e a decisão de hoje não impede a FTC de abordar esses acordos por meio de ações de fiscalização caso a caso”.
A secretária de Imprensa da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, distribuiu uma declaração que diz: “O governo ainda apoia a proibição de acordos de não concorrência que, segundo a FTC, afetam cerca de 20% dos trabalhadores do país. Interesses especiais e grandes corporações trabalharam juntos hoje para impedir que quase 30 milhões de trabalhadores americanos conseguissem melhores empregos ou iniciassem pequenos negócios”.
“O governo Biden-Harris continuará a lutar para capacitar os trabalhadores para escolher onde trabalhar, para iniciar um negócio e para receber o salário que merecem e a apoiar a proibição da FTC de acordos de não concorrência.”
Por “interesses especiais e grandes corporações”, a Casa Branca se referiu especialmente a entidades empresariais que aderiram à ação movida pela firma de consultoria tributária Ryan LLC, de Dallas, no Texas — entre elas a U.S. Chamber of Commerce, a Business Roundtable, a Texas Association of Business e a Longview Chamber of Commerce.
A presidente e CEO da Câmara de Comércio dos EUA, Suzanne Clark, distribuiu uma declaração que, entre outras coisas, inclui a ideia de que os acordos de não concorrência são vantajosos para os trabalhadores:
“Essa decisão é uma vitória significativa na luta da Câmara contra a microgestão governamental das decisões empresariais. Uma proibição abrangente de acordos de não concorrência por parte da FTC foi uma extensão ilegal de poder que teria colocado os trabalhadores americanos, as empresas e a nossa economia em desvantagem competitiva”.
Funções do acordo
Segundo o site Doc 365, os objetivos dos acordos de não concorrência nos Estados Unidos são:
— Proteger a propriedade intelectual e os segredos comerciais, bem como informações proprietárias e dados confidenciais de uma empresa. Eles impedem que ex-empregados utilizem esse conhecimento para beneficiar concorrentes ou iniciar empresas concorrentes;
— Preservar o relacionamento com os clientes. Em setores em que o relacionamento com os clientes é crucial, os acordos de não concorrência evitam que empregados que estão de saída procurem ou solicitem clientes da empresa, protegendo, assim, a base de clientes da empresa;
— Manter a participação de mercado. Os acordos de não concorrência podem ajudar as empresas a preservar sua participação de mercado por impedir que antigos empregados estabeleçam negócios rivais que possam competir diretamente com os seus produtos ou serviços;
— Incentivar o investimento na formação dos funcionários. Algumas indústrias investem fortemente na formação de empregados ou na aquisição de conhecimentos especializados. Os acordos de não concorrência podem incentivar as empresas a investir em sua força de trabalho sem o risco de perder profissionais qualificados para os concorrentes;
— Incentivar a inovação e a investigação. Em certas indústrias, como a tecnológica e a farmacêutica, os acordos de não concorrência ajudam a proteger os esforços contínuos de pesquisa e desenvolvimento, evitando que antigos empregados levem segredos a empresas rivais.
Assim, esse tipo de acordo é necessário na contratação de executivos e quaisquer outros empregados que tenham acesso a conhecimentos especializados e a informações confidenciais, como os que estão em setores tecnológicos, farmacêuticos etc., por um certo período de tempo e em uma área geográfica preestabelecida.
No entanto, a prática se disseminou para todo tipo de atividade. Hoje, estão sujeitos a ela profissionais tais como cabelereiros, professores de dança, técnicos de várias áreas (eletricistas, operadores de máquinas e equipamentos), médicos e qualquer outro empregado que, supostamente, aprendeu a exercer seu ofício em uma determinada empresa, de acordo com um levantamento do Washington Post. Com informações de CNN, Washington Post, National Review, Reuters e Doc 365.