Mesmo com um decreto que impõe teto de gastos no estado, o governo de Romeu Zema (Novo) tem a previsão de aumentar os benefícios fiscais em 15% entre 2025 e 2028. Com a medida, Minas Gerais tem uma previsão de renúncia tributária de R$ 95,17 bilhões no período, sendo R$ 21,8 bilhões em desonerações já para o ano que vem.
A dívida pública de Minas chegou a marca de R$ 165 bilhões na gestão do governador, que, recentemente, firmou um acordo com o governo federal para retomar o pagamento do débito, limitando os gastos, congelando salários e a carreira dos servidores públicos e suspendendo a realização de concursos.
Weslley Cantelmo, doutor em economia pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Faculdade de Ciências Econômicas (Cedeplar) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), questiona os retornos práticos das renúncias fiscais.
Segundo ele, apesar dos benefícios oferecidos aos setores produtivos, como o automotivo e o de locadoras de veículos, os resultados em termos de geração de empregos e aumento de arrecadação a longo prazo são frequentemente limitados.
“O que observamos nos últimos anos é que as contrapartidas não justificam as perdas fiscais. Há um desequilíbrio claro e, muitas vezes, o lobby de setores específicos influencia na concessão desses benefícios, sem que haja um impacto econômico significativo”, explica.
O governo mineiro defende que os benefícios são fundamentais para garantir investimentos e manutenção de empregos no estado, argumentando que o aumento das renúncias é um incentivo necessário para atrair empresas e, consequentemente, fomentar a economia. Em 2025, a arrecadação tributária estimada é de R$ 69 bilhões, o que significa que cerca de 31% desse valor será perdido com as desonerações.
Privilégios
O setor automotivo foi o maior beneficiado nos últimos anos, especialmente com a redução do Imposto Sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) para locadoras de veículos.
Weslley argumenta que essas concessões são feitas a setores de baixo impacto tecnológico e de baixa complexidade, o que, segundo ele, não contribui para a transformação estrutural da economia mineira.
“Conceder benefícios a empresas de serviços básicos, como aluguel de carros, dificilmente traz uma mudança econômica de longo prazo. Precisamos de investimentos em indústrias mais complexas e tecnologias que possam aumentar a competitividade do estado”, defende o economista.
Medida não se sustenta a longo prazo
Marco Túlio da Silva, economista e vice-presidente da Associação dos Funcionários Fiscais do Estado de Minas Gerais (Affemg), observa que a renúncia fiscal deve ser vista sob a ótica do interesse público e não apenas como uma decisão de governo. Ele explica que o objetivo dos benefícios fiscais é proteger setores estratégicos da economia e, em alguns casos, evitar a saída de empresas do estado.
“Em um ambiente de guerra fiscal, como o brasileiro, os estados competem para atrair investimentos e empresas. A renúncia fiscal é, muitas vezes, uma forma de evitar que companhias migrem para outros estados, o que, a longo prazo, preserva empregos e movimenta a economia local”, pontua.
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No entanto, o economista também observa que alguns setores estão concentrados em poucas empresas e, ao direcionar o benefício para determinados setores, o governo beneficia poucas organizações que, por vezes, até pertencem a poucos proprietários.
“É inegável que o poder de barganha nesse contexto de concentração de riquezas é diferente, daí a importância do debate democrático no tocante à questão orçamentária e a questão do gasto tributário”, realça.
Weslley Cantelmo lembra que a principal questão que permanece em aberto é até que ponto essa política de desoneração é sustentável, especialmente considerando o elevado endividamento de Minas Gerais.
“Estamos em um ciclo vicioso de incentivos fiscais sem planejamento estratégico. Isso limita a capacidade do estado de investir em áreas fundamentais”, acrescenta.
RRF
No que se refere ao teto de gastos, Marco Túlio da Silva ressalta que a abordagem do governo, que defende o Regime de Recuperação Fiscal (RRF), merece uma melhor reflexão.
“Recuperação fiscal significa mudança estrutural que permita uma recuperação das contas públicas, mas o RRF envolve medidas que colocam as contas públicas, o estado e o servidor público em uma camisa de força, com o propósito de rever uma avaliação creditícia por parte do governo federal e aumentar o endividamento sem nada de recuperação fiscal”, argumenta.
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“Não se limita às necessidades sociais, por meio de teto de gastos, com restrições à saúde, à educação, e tantos outros serviços. Ainda mais em uma sociedade das mais desiguais do mundo, onde a maior parte depende dos serviços públicos”, alerta.
Outro lado
O Brasil de Fato MG entrou em contato com o governo de Minas para comentar sobre o assunto, mas não obteve resposta até a publicação desta matéria. O espaço segue aberto para manifestações.
Fonte: BdF Minas Gerais
Edição: Ana Carolina Vasconcelos