Pular para o conteúdo

amigas e rivais? — Gama Revista

Banner Aleatório

Ferramentas como ChatGPT e Midjourney podem acelerar processos criativos, ajudar no brainstorming e sugerir caminhos inesperados, mas pedem uso crítico, ético e com os dois pés no mundo real

Banner Aleatório

O avanço das inteligências artificiais generativas e como elas vêm sendo utilizadas no dia a dia estão mexendo com os padrões da criatividade e com a nossa capacidade cognitiva — um estudo do MIT Media Lab mostrou que o ChatGPT pode corroer as habilidades de pensar criticamente. Ferramentas como o assistente da OpenAI e o Midjourney já são capazes de simular, com rapidez e precisão, tarefas antes consideradas essencialmente humanas, como rascunhar ideias, montar estruturas narrativas e compor imagens. Mas, ao automatizar parte desse percurso criativo, arriscamos renunciar a algo mais valioso do que o tempo: o exercício da imaginação.

LEIA MAIS NA GAMA

O que acontece com a criatividade quando ela é reduzida a um prompt? É possível continuar tendo pensamentos engenhosos e saídas inventivas para questões profissionais e artísticas fazendo uso das tantas IAs disponíveis?

“A IA faz você perder a proximidade com a escrita, o que é péssimo para a criatividade”, alerta o escritor e jornalista Sérgio Rodrigues, autor do livro “Escrever É Humano” (Companhia das Letras, 2025). “A IA dá conta de e-mails, relatórios e resumos com competência. Mas a criatividade de um escritor vem da briga dele com as palavras. Se a gente terceiriza esse embate, acaba perdendo a própria voz, a própria forma de se expressar.”

Receba nossos melhores conteúdos por email

Inscreva-se nas nossas newsletters

Obrigada pelo interesse!

Encaminhamos um e-mail de confirmação

Para a designer e artista visual Larissa Ribeiro, sócia do Estúdio Rebimboca e da produtora literária Sabichinho, esses mecanismos podem ajudar a expandir possibilidades — desde que usados com ética, responsabilidade, sabedoria e intencionalidade. “Sempre que vou utilizar a IA para o meu trabalho, tento aplicar algo que não poderia ser atingido sem ela. Não uso a imagem pura e simples como vem cuspida pelo robô. Uso como insumo para colagem e composição, nunca para tentar dissimular uma coisa que poderia ser real”, explica.

No texto abaixo, Gama aponta caminhos para usar esses artifícios tecnológicos de maneira positiva e como aliados.

Use a IA como provocadora, não como autora

Para quem escreve, desenha, compõe ou cria campanhas publicitárias, um dos jeitos mais úteis de usar a inteligência artificial é como uma provocadora de ideias. Ela jamais deve substituir o trabalho criativo completo. Ribeiro conta que costuma recorrer aos modelos para um “brainstorming visual”: coloca obras autorais na ferramenta, diz que, se misturar com outra colagem, pode sair algo bom, e espera a devolutiva da máquina. “De repente, os resultados que vêm me levam para algumas imagens que me dão certas sensações, aí eu começo a recortá-las e, a partir disso, vou pegando certos caminhos.”

Nesse sentido, Sérgio Rodrigues acredita que a IA pode ser uma aliada da produtividade, mas não da criatividade em si. “Mesmo que você dê um prompt que a provoque, que estimule respostas menos convencionais, criativo aquilo não vai ser”, afirma. “Isso porque a IA não pensa, ela apenas copia e cola.”

Questione, duvide e saia do raso

Os modelos de IA generativa, como sabemos, foram treinados com grandes volumes de dados disponíveis na internet e, por isso mesmo, reproduzem o que está lá, sobretudo o que está no raso, o clichê, o preconceituoso.

Segundo a artista Larissa Ribeiro, isso pode ser um problema: “A IA nivela por baixo e traz um caldo de preconceitos com o que raspa da internet, e a maneira como as coisas estão ali organizadas hoje é preconceituosa, racista, colonial”, comenta.

Ela dá um exemplo: ao pedir a imagem de “uma mulher”, a ferramenta quase sempre entrega uma figura branca, magra e dentro dos atuais padrões de beleza. Para burlar esse viés, é preciso ser específico, criativo e crítico. “Se eu quiser uma mulher gorda, velha, com traços mais realistas, tenho que especificar com muito cuidado”. E ainda assim o resultado pode sair enviesado, frisa Ribeiro.

Por isso, a recomendação é desconfiar das respostas, principalmente dos primeiros retornos do chatbot. Teste outros caminhos, provoque o modelo, peça uma crítica, troque o prompt de direção. E, se possível, entenda como aquela ferramenta foi treinada. Isso vai tornar o seu uso mais consciente e ético.

Misture ferramentas, suportes e linguagens

Criar com IA não precisa ser uma experiência isolada dentro da tela. Pelo contrário: integrar o digital ao manual pode render trabalhos mais ricos. Larissa Ribeiro, por exemplo, costuma usar manchas de tinta, desenhos feitos à mão e colagens físicas como ponto de partida para gerar imagens com a inteligência artificial. “Eu misturo as duas coisas e vou retrabalhando, produzindo com o que vou encontrando”, conta. Essa miscelânea de materiais e linguagens é uma forma de reapropriação criativa e também de uso crítico das IAs.

Cuidado com a sedução da eficiência

Uma das propagandas mais sedutoras do que a inteligência artificial é capaz de fazer por nós é a de facilitar tarefas e poupar tempo. Mas essa eficiência toda pode se voltar contra o próprio criador. “Na minha profissão de ilustradora, já estou vendo um impacto enorme”, fala Ribeiro. “A IA traz para a gente mais um problema capitalista. Tudo vai ter que ser feito muito mais rápido porque supostamente a ferramenta está aqui para facilitar o seu trabalho, só que o que vai acontecer é que o seu trabalho será cobrado em muito menos tempo.”

Ou seja, a facilitação que a máquina oferece não é convertida em mais tempo para o pensamento e para a criatividade.

Sérgio Rodrigues concorda: “A IA é tão boa que quer deixar de ser ferramenta. E isso é perigoso. Essa demanda por uma produtividade sem freio pode atropelar o tempo necessário da criação.”

Evite a dependência e mantenha o treino autoral

Tanto Ribeiro quanto Rodrigues fazem um alerta sobre o risco da dependência por máquinas que fazem tudo o que pedimos, do início ao fim do processo, em segundos. “O meu maior medo é com quem está começando e fazendo as primeiras experiências com a escrita diretamente com a inteligência artificial”, diz o escritor. “Se você não desenvolve o seu próprio jeito de fazer as coisas, pode ser engolido pela IA. Ela é original, mas não é criativa.”

A artista visual aponta o risco de certa bitolação profissional, além da perda da sensibilidade tátil da criação. Quando isso acontece, ela volta ao papel e, muita vezes, faz um detox de IA. “Desenho, pinto, rasuro, volto ao gesto. Desenhar, para mim, precisa de corporeidade. Preciso manter viva a experiência de criar com o corpo.”

A inteligência artificial está aqui para ficar — e seus impactos sobre o trabalho criativo só vão crescer. O desafio está em saber como usá-la sem perder o tato, o olhar e a voz própria.

“Não dá para ignorar que o uso da IA já está mudando a nossa relação com a maneira como pensamos e produzimos criativamente, assim como o celular mudou a nossa relação com a comunicação e a atenção”, sinaliza Ribeiro. “Acho que isso vai criar um problema para quem usa a IA com um cabresto, se limitando pela resposta dela e apenas pelas possibilidades que ela traz.”

Dicas

Para quem quer usar a IA como uma aliada da criatividade, a artista visual e designer Larissa Ribeiro sugere:

  • Desconfie da IA: “Ela tende a te agradar. Então, provoque, critique, pergunte o contrário.”
  • Não terceirize tudo: use como apoio, não como substituto.
  • Misture materiais: utilize referências manuais, físicas, analógicas como input criativo.
  • Não se feche em um único processo. Vá ao mundo real também.
  • Informe-se: entenda como os modelos são treinados e os vieses que reproduzem.
  • Atualize-se com calma: a tecnologia muda rápido, mas você deve respeitar o seu tempo de aprendizado.



Source link

Join the conversation

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *