Os tribunais do país devem receber, somente em 2025, 800 mil novos processos com demandas de saúde. A expectativa é de reduzir o tempo de análise com o uso de inteligência artificial.
Em 2026, o Brasil contará com um modelo de IA para acelerar decisões judiciais na área da saúde e reduzir o tempo de espera por pareceres técnicos que apoiam magistrados nas tomadas de decisão nestes processos.
O novo Modelo de Linguagem Especializado (SLM, na sigla em inglês) – que resulta de parceria entre a Amazon Web Services (AWS), divisão de serviços de nuvem da Amazon, o Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo (IME-USP) e o Núcleo de Inovação Tecnológica do Hospital das Clínicas (InovaHC) – começa a ser testado em setembro, informaram os parceiros, nesta quarta-feira (13), durante o evento AWS Summit São Paulo.
A proposta do SLM é reduzir a sobrecarga dos Núcleos de Apoio Técnico do Judiciário (NatJus), responsáveis por pareceres técnicos que, antes emitidos em até 24 horas, agora podem levar até 20 dias em algumas jurisdições.
O prazo para os pareceres reflete o ritmo acelerado da judicialização da saúde. Este ano, a projeção é de 800 mil novos processos no setor em 2025, um aumento de 25% em relação a 2024, segundo dados do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde (Fonajus).
Em setembro, o modelo de IA passa por um teste-piloto na área de fornecimento de medicamentos, informou o professor titular do departamento de Ciência da Computação do Instituto de Matemática da USP, João Eduardo Ferreira. Atualmente, o projeto conta com a dedicação de 22 analistas da USP e dois arquitetos da AWS.
Para acelerar o processo de aprendizado do modelo de IA, uma das técnicas é a segmentação de textos. “Os textos, relatórios e pareceres estão bem estruturados para criar a premissa para o modelo aprender rapidamente e de forma específica”, explicou Ferreira.
“O Brasil tem um conjunto de dados muito bem elaborado. É o ponto de partida para termos um modelo condizente, pragmático e fiel”.
A IA acelera um projeto iniciado há oito anos para dar apoio aos magistrados na análise técnica dos processos, informou o professor titular da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) e presidente do Conselho do Instituto de Radiologia do HCFMUSP e do InovaHC, Giovanni Cerri, durante o AWS Summit São Paulo.
“Oito anos atrás, achou-se importante, dentro desse fórum do judiciário da saúde, buscar uma forma para que a judicialização corresse dentro de parâmetros mais científicos. Até então, o juiz não tinha dados. Ele podia até estudar ou perguntar, mas não havia uma formalização baseada em dados ao juiz”, explicou Cerri.
Nos últimos sete anos, contou o presidente do InovaHC, especialistas do Hospital Sírio-Libanês ingressaram no projeto do Hospital das Clínicas dando suporte à emissão de notas técnicas e, posteriormente, o Hospital Israelita Albert Einstein passou a emitir pareceres emergenciais, mas o volume de processos seguiu aumentando.
“A judicialização continuou aumentando e não diminuindo como nós pensávamos”, disse Cerri. “Em determinado momento, por iniciativa do professor [João Eduardo Ferreira] e essa parceria com a AWS, pensou-se em dar um instrumento que pudesse acelerar e sumarizar essas notas técnicas para os juízes”.
Com a ajuda da IA, o novo modelo propõe fazer uma triagem automatizada de até 80% dos casos e reduzir o tempo médio de resposta. Uma das funcionalidades será a classificação automática dos processos conforme categorias estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), como fornecimento de medicamentos ou tratamentos fora do rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
“É uma forma de trazer mais eficiência, utilizando a IA, e fazendo com que essas informações possam chegar aos juízes, de forma mais rápida, precisa e sempre baseadas em comprovação científica e informações concretas, sem suposições”, ressaltou Cerri.
Segundo a AWS, a IA também fará um sumário técnico-jurídico das petições, manifestações e decisões, com inclusão de referências da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) e de jurisprudência correlata.
Além disso, o novo modelo contará com um agente virtual de apoio aos magistrados, capaz de responder perguntas em linguagem natural, eliminando a necessidade imediata de encaminhamento aos Núcleos de Apoio Técnico do Judiciário (NatJus).
A tecnologia seguirá parâmetros pré-definidos, consultando bases de dados públicas para verificar pendências, classificar casos por urgência, aplicar “checklists” e analisar evidências clínicas e jurídicas, em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), acrescentou a AWS, em comunicado.
