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Quanto de trabalho escravo custa uma milanesa argentina em POA

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Foto: MPT-RS/Divulgação

As fiscalizações foram coordenadas pela equipe de auditores fiscais do Trabalho do MTE com apoio do Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT-RS) e da Polícia Federal (PF).

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Foto: MPT-RS/Divulgação

Em julho deste ano, seis mulheres e quatro homens, de nacionalidades boliviana e argentina, foram recrutados fora do país para trabalhar no restaurante Club Milanesa, no Bairro Moinhos de Vento, zona nobre de Porto Alegre, com a expectativa de receber salário de 4 mil bolivianos (cerca de R$ 3.100,00), jornada de oito horas diárias, registro em carteira, alojamento adequado, alimentação e transporte.

A realidade encontrada foi outra: alojamentos precários e nada instagramáveis no bairro Azenha (a 5 quilômetros do local), refeições incompletas, jornadas de até 15 horas em pelo menos três dias da semana e salários de R$ 1.500. Pagamento de horas extras e vale-transporte, nem pensar. Não bastasse a carga horária superar as 220 horas mensais e os salários ficarem abaixo do mínimo nacional (R$ 1.518,00) e regional (R$ 1.789,04, na primeira faixa), os trabalhadores precisavam se deslocar a pé, em um trajeto de cerca de uma hora tanto para ir quanto para voltar — inclusive de madrugada — ou arcar com custos de transporte particular.

Esta foi a realidade constatada pela força tarefa do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério Público do Trabalho (MPT-RS) e Polícia Federal (PF) na sexta-feira, 8, quando os trabalhadores foram resgatados em condições análogas à escravidão.

Uma semana depois, na quinta-feira, 14, foi firmado um TAC entre o MPT-RS e o Club Milanesa. O acordo foi assinado após audiência administrativa presidida pelo procurador Carlos Carneiro Esteves Neto, titular do procedimento instaurado pelo MPT para apurar o caso.

O documento contempla 13 obrigações de fazer e não fazer, pelas quais a empresa se compromete a adequar seu processo de contratação e gestão de pessoal, garantir o cumprimento da legislação trabalhista e das normas de saúde e segurança no trabalho, além de pagar valores rescisórios.

Foto: MTERS/Divulgação

Não havia camas para todos, roupas de cama e cobertas suficientes, armários, geladeira, fogão ou micro-ondas, mesa com cadeiras ou utensílios para preparo e consumo de refeições

Foto: MTERS/Divulgação

Quais as obrigações do restaurante

Entre as obrigações assumidas pelo Club Milanesa estão: abster-se de manter trabalhadores em situações que se assemelhem à escravidão e de agenciar, aliciar, transportar ou alojar pessoas mediante ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, com o objetivo de submetê-las a trabalho forçado ou qualquer forma de servidão.

A empresa também se obriga a garantir a formalização dos trabalhadores, incluindo o registro em Carteira de Trabalho (física ou digital) antes do início do deslocamento para o local de prestação de serviços, no caso de contratação de mão de obra estrangeira.

O acordo ainda determina o pagamento devido de direitos previstos em lei, como quitação do salário até o quinto dia útil, pagamento de horas extras e fornecimento de vale-transporte. As instalações e o ambiente de trabalho também devem ser adequados às normas de saúde e segurança.

Além das obrigações de caráter geral, o restaurante assumiu compromissos específicos em relação ao grupo de resgatados. A empresa deve regularizar os vínculos de trabalho e pagar as respectivas verbas rescisórias, além de indenização por danos morais individuais a cada um dos dez trabalhadores identificados.

Ação de resgate por trabalho análogo à escravidão

Foto: MPT-RS/Divulgação

Auditor da força-tarefa realiza escuta de uma das vítimas no interior do estabelecimento

Foto: MPT-RS/Divulgação

Segundo o MPT-RS, o grupo de bolivianos estava alojado em um imóvel no bairro Azenha, em precárias condições de conservação e sem mobiliário básico: não havia camas para todos, roupas de cama e cobertas suficientes, armários, geladeira, fogão ou micro-ondas, mesa com cadeiras ou utensílios para preparo e consumo de refeições. Não havia lâmpadas nos cômodos, entrava água da chuva e, quando chegaram, não havia chuveiro no banheiro.

Já o grupo de argentinos estava submetido à mesma sistemática de exploração — jornadas exaustivas, não pagamento de horas extras e demais direitos trabalhistas — e já havia passado por esse alojamento. No momento da ação, tentava arcar com os custos da locação de um imóvel na capital gaúcha.

Segundo a Inspeção do Trabalho, a empresa buscava mão de obra de migrantes internacionais, mantinha esses trabalhadores na informalidade, não pagava os direitos previstos na legislação brasileira e os submetia a condições degradantes e jornadas exaustivas.

Os trabalhadores bolivianos foram retirados do alojamento e permaneceram em hotel custeado pelo empregador até segunda-feira, 11. Todos receberão o seguro-desemprego do trabalhador resgatado, emitido pelo MTE.

O empregador foi notificado a regularizar os vínculos de trabalho, efetuar o pagamento das verbas rescisórias e garantir o retorno dos trabalhadores à cidade de origem.

Como até o dia 14 nenhuma dessas obrigações havia sido cumprida, o que levou à audiência e à assinatura do TAC pelo MPT para disciplinar a questão.

O outro lado

Foto: Reprodução/Instagram

Restaurante fica na Rua Tobias da Silva, no bairro Moinhos de Vento

Foto: Reprodução/Instagram

Se por um lado a empresa firmou acordo com o MPT-RS, por outro, no mesmo dia contestou publicamente a ação da Justiça em sua conta no Instagram. O que alega o restaurante:

“No Club da Milanesa, lamentamos profundamente a divulgação de informações falsas e mal-intencionadas, promovidas por ex-colaboradores e reproduzidas por alguns funcionários do Ministério Público do Trabalho. Estamos apresentando uma resposta documentada e verificável, que deixará evidente a total ausência de fundamentos desta operação. Em breve, a verdade virá à tona e cada parte não terá lugar que lhe corresponda. Pedimos que acompanhem as novidades. Não vamos ser dobrados por mentiras: a verdade prevalecerá”, diz a postagem.

No dia 13, menos de uma semana após a ação do Ministério Público, a empresa usou a mesma rede social para anunciar vagas para garçom/garçonete, ajudante de cozinha e auxiliar de limpeza. “Se você está comprometido, gosta de trabalhar em equipe e quer fazer parte de um ambiente animado e acolhedor, essa é a sua chance!”, dizia o post.

O local é um ponto concorrido no bairro, com consumo médio de R$ 100 por pessoa (milanesas mais guarnições e bebida).

Foto: Reprodução/Instagram

Milanesas argentinas são o prato típico da casa

Foto: Reprodução/Instagram

 

Foto: Reprodução/Instagram

Oferta de emprego na semana seguinte ao resgate realizado pelo MPT-RS

Foto: Reprodução/Instagram

 

Foto: Reprodução/Instagram

Oferta de emprego na semana seguinte ao resgate realizado pelo MPT-RS

Foto: Reprodução/Instagram

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