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‘A inteligência artificial vai gerar milhões de empregos’, prevê diretor da OpenAI no Brasil

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Das três bilhões de mensagens enviadas ao ChatGPT todos os dias, 140 milhões partem de usuários brasileiros. Terceiro país que mais usa a ferramenta no mundo, atrás apenas dos EUA e da Índia, o Brasil está também entre os que mais desenvolvem soluções próprias a partir da inteligência artificial (IA), com modelos da OpenAI.

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Para Nicolas Robinson Andrade, primeiro funcionário da startup americana na América Latina e atualmente seu diretor para a região, o brasileiro é criativo e domina como poucos os comandos para IA (chamados de “prompts”). O entusiasmo com o país, no entanto, diminui quando o tema é regulação.

Com passagens por Zoom e Meta, o executivo tem como uma de suas principais missões aqui a articulação com governo, legisladores e sociedade civil em meio às preocupações com o avanço rápido da IA generativa e a tramitação de um marco regulatório no Congresso.

Em entrevista ao GLOBO, ele explica porque a empresa tem se posicionado de forma contrária ao texto em discussão.

Nicolas Robinson Andrade, primeiro funcionário da OpenAI na América Latina e atualmente seu diretor para a região,, diz que a IA vai criar milhões de empregos no país — Foto: Edilson Dantas/Agência GLOBO
Nicolas Robinson Andrade, primeiro funcionário da OpenAI na América Latina e atualmente seu diretor para a região,, diz que a IA vai criar milhões de empregos no país — Foto: Edilson Dantas/Agência GLOBO

Você nasceu em Londres, morou na Espanha e na Índia, e há uma década está no Brasil. Por que escolheu viver aqui?

Não tem nenhum lugar melhor no mundo para trabalhar com tecnologia. Tivemos algumas conversas com usuários de diferentes idades no Brasil que usam o ChatGPT e percebemos que os brasileiros sabem muito como fazer prompts. Não é algo tão natural.

Há países com milhões de usuários que não são tão bons. Mas o brasileiro tem uma criatividade diferente. Acredito que algumas das maiores soluções, e a gente tem visto isso em grandes e pequenas empresas a nível regional e global, vão sair daqui.

O CEO da OpenAI, Sam Altman, costuma dizer que uma Inteligência Artificial Geral (AGI) está próxima. Como ela será?

Entendemos que é uma IA pelo menos tão inteligente como um ser humano. A OpenAI publica uma série de documentos sobre o tema e a forma como pensamos sobre riscos e capacidades. O desenvolvimento dos modelos tem avançado rapidamente e cada vez mais podem realizar tarefas que geram descobertas revolucionárias.

Mas o momento exato da AGI, pelo menos para mim, não é tão importante como a missão que temos nesse meio tempo.

A OpenAI nasceu de uma organização sem fins lucrativos, mas há quem diga que tem ficado cada vez mais parecida com uma big tech…

Eu trabalho em uma empresa controlada por uma entidade sem fins lucrativos, cujos únicos funcionários no Brasil não têm um papel comercial. Não sei quais são as estratégias de big techs ou não big techs. O que vejo é uma empresa com pessoas extremamente inteligentes, que lançou um produto com cerca de 200 pesquisadores, que é amado por milhões, e que claramente vai marcar as nossas vidas.

Nicolas Andrade, diretor de Relações Internacionais da OpenAI no Brasil — Foto: Edilson Dantas/Agência GLOBO
Nicolas Andrade, diretor de Relações Internacionais da OpenAI no Brasil — Foto: Edilson Dantas/Agência GLOBO

Você diz que a OpenAI quer levar “os benefícios da IA” para todos e que seu papel é fazer isso na América Latina. Como?

Por um lado, com insumos técnicos e, por outro, no processo de elaboração de política pública, não só para regular, mas para promover a tecnologia. Uma das vertentes do meu trabalho é encontrar aliados que acreditem nisso.

Dependendo da situação, também contribuímos com licenças gratuitas e trabalhamos com créditos para que desenvolvedores criem soluções, como nos casos do AmazôniaGPT (que faz monitoramento ambiental) e do FavelaGPT (que leva licenças de acesso ao ChatGPT para comunidades).

O Brasil é importante para a OpenAI?

O Brasil não é só o terceiro maior usuário do ChatGPT no mundo, mas está entre os cinco com mais desenvolvedores usando a API (plataforma que permite acesso aos modelos por trás do ChatGPT). O Brasil está criando num ritmo mais rápido que o resto do mundo.

O Brasil é conhecido como um adotante precoce de tecnologias, mas é também um criador precoce. Está construindo e desenvolvendo tecnologia.

Quais casos de uso local são referências para vocês?

Um deles é o JusBrasil, que usa o GPT-4 para ajudar pessoas leigas a interpretar e navegar no sistema jurídico. Como não advogado, acho fantástico. Outro que eu gosto muito é o Fatima, de verificação de fatos.

A IA já está fazendo parte de muitos processos ao nosso redor. Está ajudando em colheitas de laranja ao café. Quando alguém toma um café, está bebendo um pouco de IA. Quando as pessoas usam um método de pagamento ou um atendimento, estão usando IA.

São apenas dois funcionários no Brasil. Há planos para ampliação?

Queremos muito ampliar a equipe. Acredito que no médio e longo prazo isso deve acontecer.

Existem visões distintas sobre como a IA afetará o emprego, algumas mais ou menos pessimistas. Em qual caminho estamos?

É uma tecnologia que vai gerar milhões de empregos. Vejo isso com os data centers que estamos construindo nos EUA, com o projeto Stargate, de US$ 500 bilhões. Há um outro debate interessante sobre qual vai ser o impacto na economia. E as estimativas variam muito, de 0,5% até 20% do PIB por ano.

O que vejo agora é a IA ajudando as pessoas a serem mais eficientes, e isso, em muitos casos, não vai levar a uma substituição. O mercado vai continuar se transformando, como nos últimos 100 anos.

É saudável o Brasil tornar-se dependente de modelos de IA apenas de empresas estrangeiras?

A nossa prioridade é trazer insumos e conhecimento técnico, porque é um assunto complexo e nós acreditamos que o desenvolvimento local é extremamente importante. É importante ter um ecossistema.

Nicolas Andrade, diretor da OpenAI no Brasil — Foto: Edilson Dantas/Agência O GLOBO
Nicolas Andrade, diretor da OpenAI no Brasil — Foto: Edilson Dantas/Agência O GLOBO

Mas com a legislação proposta (projeto de lei de regulação da IA), vamos dar um passo atrás em investimentos, desenvolvimento, treinamento de modelos e construção de data centers, que irão para países com ambientes regulatórios adequados.

Qual a posição da OpenAI sobre o PL em tramitação no Congresso?

O primeiro ponto é que as definições técnicas no PL não estão corretas. Fala-se em modelos quando se deveria falar em sistemas ao longo do texto. O segundo ponto é que é preciso muito mais entendimento sobre a cadeia de valor da IA. A responsabilização, por exemplo, não está clara.

Muitas empresas estão falando também sobre direitos autorais. Outra questão é o projeto não conversar com o Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA). Eles vão em direções opostas.

Sobre direitos autorais, o PL prevê remuneração por conteúdo protegido usado para treinar modelos…

O Brasil está propondo um projeto que o faria o único do mundo, até onde eu sei, a cobrar remuneração obrigatória para treinamento de modelos. É como se o Brasil se tornasse o único país do mundo a taxar a fabricação de cadeiras. Aí é natural que as fábricas de cadeiras no futuro não sejam construídas aqui.

A proposta atual favorece duas ou três empresas que acumulam dados há décadas, e impediria as outras empresas, da OpenAI para baixo, incluindo brasileiras, de treinar modelos no Brasil. Não seria um resultado bom para o país.

Nos EUA, a OpenAI adota o argumento do ‘fair use’ (uso justo, em tradução livre, uma exceção da lei americana de direitos autorais). É justo que conteúdo jornalístico, por exemplo tenha treinado modelos de IA sem remuneração? Ou obras de artistas?

Treinamos, sim, nos EUA, usando o fair use e fomos a primeira empresa a implementar o sistema de opt-out, adotado por muitas depois e que é usado de forma conhecida por muitos meios de comunicação e detentores de direitos autorais no mundo todo, inclusive no Brasil.

Mas o ‘fair use’ não é um conceito que exista no direito brasileiro…

Todos os países estão pensando que legislação de direitos autorais pode funcionar num futuro e presente em que a tecnologia tenha avançado. Essa é a nossa estratégia nos EUA. E eu acredito que as empresas que queiram treinar modelos, americanas ou de qualquer outro lugar do mundo, vão procurar países, e há vários, onde elas possam fazer isso usando fair use ou exceções parecidas como as da União Europeia.

A posição é de que não se remunere nada?

Enxergo de outra forma essa questão. Recebo muitas perguntas sobre os modelos de IA não serem suficientemente “brasileiros”, pela língua ou viés. A solução para isso é treinar com mais dados que reflitam determinada realidade. Um estudo recente da Universidade de Stanford mostra que modelos de IA, de forma geral, foram treinados quase sem dados da América do Sul, sem falar do Brasil.

Para mim, a pergunta é outra. No PL também não se fala em artistas, mas em detentores de direito autoral. Quando falo com artistas, e eu venho de uma família de artistas, todos eles estão usando LLMs. São debates importantes e farei parte deles sempre que puder.

A OpenAI firmou acordos com veículos de imprensa, mas só americanos. Devem fazer isso na América Latina?

Acredito que é possível, sim, termos acordos no futuro. A equipe responsável tem analisado como esses acordos (atuais) estão funcionando. O que fizemos foram acordos para que os usuários do ChatGPT pudessem, com um clique, passar para a página de um jornal, por exemplo, que tenha uma matéria sobre o assunto e ler com mais detalhes.

Existe uma ideia de que a abundância de fontes de energia poderia ser uma vantagem para o Brasil atrair data centers. Há planos de ter infraestrutura aqui?

Uma parte muito importante da IA é a infraestrutura. Nós temos conversas com vários países. Acredito que há iniciativas dentro do governo brasileiro para atração de data centers, mas no momento não temos nenhum plano avançado. Mas voltando à questão anterior, se a gente instalar um pedágio único no mundo, ou taxar o fabricante de cadeiras, não faz muito sentido (os data centers) fluírem justamente para cá.

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