A maneira como usamos diferentes programas e aplicativos de produtividade em nossos computadores e celulares pode estar com os dias contados. Com o avanço da inteligência artificial, navegar por muitas telas de sistemas distintos para coletar informações tende a ser substituído por simples conversas com um robô. Mas como tudo que se refere a essa tecnologia, precisamos compreender bem a proposta para que um benefício não se transforme em uma armadilha.
Especialmente no mundo dos negócios, mesmo com a ampla digitalização de processos, obter informações para uma tomada de decisão pode ser uma tarefa morosa e sujeita a falhas. Uma nova geração de assistentes de IA promete resolver isso, entendendo o que o usuário deseja e acessando todos os sistemas necessários para coletar os dados e organizá-los em uma resposta pronta.
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Mais do que uma evolução técnica, esse movimento nascente traz uma mudança de paradigma na experiência do usuário e na governança de dados. Essa camada transforma sistemas complexos em “motores de dados” para respostas contextuais.
Os benefícios são evidentes, com ganhos em eficiência e produtividade. Mas alguns riscos não podem ser ignorados, como o aumento da dependência tecnológica e uma potencial exclusão digital entre aqueles que não souberem usar a IA.
Para muita gente, pode parecer um contrassenso alguém não conseguir usar uma tecnologia criada para facilitar processos. Mas precisamos entender que isso depende de habilidades que nem todos têm. Nesse caso, a sociedade precisa se organizar para capacitar essas pessoas, evitando ampliar o abismo digital já existente no país, e as empresas têm um papel fundamental nesse processo.
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No SAP Now AI Tour, evento anual da gigante de software alemã, que aconteceu em São Paulo nos dias 19 e 20, foi possível ver a Joule, assistente de IA da empresa, realizando esse tipo de integração com sistemas e dados da própria SAP e de terceiros. O robô também se ajusta automaticamente ao cargo de cada usuário, exibindo alertas, relatórios e soluções adequadas para cada função.
Para Rui Botelho, presidente da SAP Brasil, esse é o caminho. “O cliente escolhe se quer ter uma única experiência pela Joule ou se quer conectá-la a outros assistentes, como o Copilot da Microsoft”, disse. Segundo ele, “o futuro é que a gente consiga integrar o máximo possível e que esta camada de aplicações alimente a inteligência artificial, para que ela possa executar melhor as tarefas através dos agentes”.
A democratização da informática sempre foi associada à evolução da interface. Até os anos 1980, usar um computador exigia dominar comandos pouco intuitivos digitados no teclado, o que limitava esses equipamentos a uma parcela reduzida da população.
Isso começou a mudar com as interfaces gráficas, difundidas pelo Apple Macintosh (1984) e pelo Microsoft Windows (1985). Na década seguinte, os hiperlinks da Web mudaram como acessamos documentos. As telas sensíveis a toque, popularizadas há 20 anos pelo iPhone e pelo Android foram a etapa seguinte. Agora a IA contribui com a possibilidade de conversarmos com a máquina, como se fosse uma pessoa.
Isso permite que usuários sem conhecimento técnico operem sistemas complexos, apenas descrevendo suas necessidades, além de reduzir muito a curva de aprendizado para novos funcionários. Com processos mais rápidos e menos tempo em tarefas repetitivas, as decisões se tornam mais assertivas e ágeis.
Mas isso pode ampliar nossa dependência tecnológica, com risco de perda de conhecimento técnico profundo. Empresas também podem se tornar reféns de plataformas que centralizem toda a operação.
Isso se agrava com a falta de transparência das big techs, que normalmente não explicam as decisões e o funcionamento de sua tecnologia. Com isso e com todos os dados passando pela IA, o risco de vieses, vazamentos e erros aumenta.
Impacto no trabalho
Esse avanço da IA traz benefícios e dispara alertas também no mundo do trabalho. Se ela potencializa as entregas, como já explicado, pode ampliar a exclusão digital de quem não tiver acesso à tecnologia ou não se adaptar a ela. E a automação de tarefas pode reduzir os empregos de certas funções técnicas, como já se observa.
A SAP divulgou dados da Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais (Brasscom), que indica que o Brasil forma 53 mil profissionais de tecnologia por ano, mas abre 150 mil vagas de trabalho no mesmo tempo. Isso levará a uma falta de meio milhão de profissionais até o fim da década.
Nos EUA, observa-se inesperadamente o contrário. Segundo o Federal Reserve Bank de Nova York, profissionais de Ciência da Computação e de Engenharia de Computação enfrentam taxas de desemprego de 6,1% e 7,5% respectivamente, contra 3% entre os de Biologia e História da Arte. Isso se deve à demissão de centenas de milhares de profissionais nas empresas de tecnologia, pelo fim do seu crescimento acelerado durante a pandemia e justamente pela adoção de IA em tarefas técnicas.
Botelho não acredita que vejamos algo assim no Brasil. “Eu acho que a IA reduzirá nosso déficit profissional, mas não vai zerá-lo”, afirma. Tanto que a SAP intensificou seus esforços para apoiar a formação e a requalificação de profissionais no Brasil, com a meta de chegar a 10 mil pessoas por ano. “A gente tem essa orientação de que o ser humano precisa estar sempre no processo”, acrescenta.
O Brasil tem uma janela de oportunidade para não cair naquele cenário americano. Precisamos de políticas públicas que democratizem o acesso à alfabetização em IA, regulamentação que incentive a transparência algorítmica e investimentos que garantam que pequenas empresas não fiquem para trás nessa transição.
Seria um erro acreditar que a IA por si só melhorará nossa produtividade e competitividade. Ela pode democratizar os ganhos tecnológicos, mas apenas se nós mesmos fizermos escolhas conscientes sobre como usá-la. O futuro ideal inclui uma sociedade em que máquinas processam, mas humanos decidem, com a automação liberando tempo para criatividade, estratégia e relacionamentos genuínos.
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