Especialmente desde 2024, os índices Nasdaq Composite e S&P 500, os dois principais indicadores da bolsa norte-americana, têm renovado suas máximas históricas. Em 2025 até aqui, suas altas acumuladas são de quase 22% e 17%, respectivamente.
Grande parte do mercado entende que a performance “fora da curva” destes índices tem sido majoritariamente impulsionada por um otimismo em torno das empresas envolvidas com Inteligência Artificial (IA).
O foco neste tema em especial levanta suspeitas de que possamos estar diante de uma “bolha”. O que implicaria, eventualmente, em uma correção significativa dos índices, e na perda de capital para os investidores mais expostos à tese.
É quase inevitável comparar o momento atual com a “bolha ponto com”, observada entre 1994 e 2000, na qual empresas ligadas à revolução da internet, algumas ainda embrionárias, dominaram o mercado de ações nos EUA.
A bolha “estourou” em março de 2000, e o que se sucedeu foi uma queda histórica de quase 80% do índice Nasdaq até 2002 – e o encerramento das atividades de muitas das empresas envolvidas.
Porém, o time de research do BTG Pactual acredita que a IA é uma temática de longo prazo, e não uma bolha, o que pode ser uma boa notícia para quem quer continuar buscando lucros neste mercado.
Entenda por que este pode ser só o começo para a tese de IA no mercado, segundo analistas do BTG
“Estamos apenas no início da revolução”, afirma Vitor Melo, analista do BTG, em relatório assinado por ele e publicado no último dia 3 de dezembro. “A adoção da IA ainda está em um estágio inicial. […] Há muitas oportunidades pela frente.”
Segundo o analista, a chave está na observação da produtividade das empresas que já adotaram ferramentas de IA em seus processos de forma mais massiva:
“O agravamento [do] declínio das taxas de natalidade em todo o mundo […] implica um envelhecimento da população e uma redução da força de trabalho economicamente ativa. A produtividade é a única variável […] que pode permitir aumentos na produção sem necessariamente exigir mais capital ou mão de obra. […] Os recentes desenvolvimentos tecnológicos reforçam nossa convicção de que a IA […] se tornará o principal impulsionador da produtividade e do crescimento.”
Destrinchando o tema no mesmo relatório, o analista dá 16 razões pelas quais a IA é um tema de longo prazo, usando o comportamento e os números da “bolha ponto com” da década de 1990 como comparativo direto.
A seguir, veja ponto a ponto dos motivos apresentados.
1. Produtividade nas empresas:
“Em estudos acadêmicos, políticos e industriais independentes, os ganhos de produtividade impulsionados pela IA atingem uma média de cerca de 1,3 ponto percentual por ano […], sugerindo um choque de produtividade amplo e duradouro.”
Ou seja, empresas que já incorporaram ferramentas de IA em seus processos conseguem mensurar o grande impacto positivo nos níveis de produtividade após a adoção destas tecnologias.
2. ROI em investimentos:
Segundo o relatório, “a IA generativa está gerando reduções mensuráveis de custos e ganhos de receita em todas as funções avaliadas” nas principais empresas globais, com perspectivas de crescimento exponencial.
3. Margens mais altas:
“O mesmo grupo que está impulsionando o ciclo de investimentos em IA também é muito mais lucrativo e resiliente do que os líderes de mercado do final da década de 1990 [na bolha ponto com].”
4. Geração de caixa:
“Mesmo com o aumento dos gastos com IA, a mediana das empresas do S&P 500 ainda apresenta um yield de fluxo de caixa livre quase três vezes o nível de 2000-2001, indicando que o mercado está sendo financiado por uma geração robusta de caixa, e não por balanços patrimoniais esticados.”
5. Múltiplos abaixo dos vistos na bolha ponto com:
“O Nasdaq-100 ainda é negociado a cerca de 30x os lucros futuros, aproximadamente um terço das 90x alcançadas em 2000 e bem abaixo das 44x no pico de 1999. Portanto, os atuais líderes em IA estão sendo avaliados com múltiplos muito mais moderados, apesar de terem margens, geração de caixa e balanços patrimoniais muito mais sólidos do que no ciclo do final da década de 1990.”
6. Líderes de mercado mais baratos:
“No ciclo de 1997-2000, os ‘Quatro Cavaleiros’ (Cisco, Microsoft, Intel, Dell) negociavam a cerca de 52-67x os lucros. […] Hoje, as 7 Magníficas (Nvidia, Microsoft, Google, Meta, Amazon, Tesla, Apple) como um grupo estão mais próximas de ~27–30x os lucros, […] apontando para um regime de valuation elevado, mas muito mais seletivo do que os múltiplos do final da década de 1990.”
7. Capex financiado internamente:
“Apesar do “boom de capex” em IA, o S&P 500 está reinvestindo apenas cerca de 46% do fluxo de caixa operacional atualmente – abaixo do pico de cerca de 75% em 2001. […] A construção da infraestrutura de IA está sendo financiada principalmente pela forte geração de caixa.”
8. Alavancagem mais baixa:
“No final da década de 1990, as 10 principais empresas do S&P 500 operavam com alavancagem positiva de aproximadamente +0,6x dívida líquida/EBITDA em média; hoje, as 10 principais empresas estão na posição oposta, […] o que significa que os principais impulsionadores da IA […] estão operando com balanços patrimoniais muito mais sólidos.”
9. Alta demanda dos principais players:
Segundo o relatório, os hyperscalers, empresas expoentes em computação em nuvem (como Amazon, Alphabet, Microsoft) conseguem enxergar níveis de receita no longo prazo:
“A demanda por nuvem e cargas de trabalho de IA não só estão se sustentando, como também voltando a acelerar, […] o que significa que os hyperscalers estão garantindo uma visibilidade de receita plurianual que excede o período de depreciação de seus investimentos em IA.”
10. IA ainda pode se desenvolver mais:
“Atualmente, a IA supera os seres humanos na maioria das tarefas. No entanto, ainda apresenta deficiências em atividades multimodais, que exigem a integração de texto, imagens e áudio em uma compreensão unificada. […] Ainda há barreiras a serem superadas.”
11. Baixo número de IPOs:
O relatório indica que o número de IPOs vistos na bolsa norte-americana recentemente é menor não apenas que o visto no último ano da bolha .com, mas também em 2020, ano mais crítico da pandemia.
“Tivemos apenas cerca de 56 IPOs/secundárias nos últimos 12 meses, contra 511 no pico das empresas .com em 2000 e mais de 220 em 2020. […] Este cenário de emissões moderadas sugere que o ciclo atual de IA está sendo impulsionado muito mais pelos líderes listados existentes […] do que por uma ampla corrida de novas listagens especulativas.”
12. Posição defensiva dos investidores:
“Apesar de todas as manchetes sobre IA, o sentimento do mercado está longe de ser eufórico: o Índice de pessimismo e otimismo da CNN está em torno de 19 (Pessimismo Extremo) […], sugerindo que os investidores permanecem em posição defensiva, em vez de perseguir agressivamente o risco das ações.”
13. Pesquisa do Bank of America com gestores:
“Na última pesquisa com gestores de fundos do BofA [Bank of America], a porcentagem de profissionais que afirmam que as ações de IA estão em uma ‘bolha’ aumentou. […] Quando o próprio ‘risco de bolha’ se torna consenso, o posicionamento tende a ser mais cauteloso do que eufórico, o que historicamente torna menos provável a dinâmica de expansão e recessão.”
14. Índice AAII Bull/Bear:
“O Índice AAII Bull/Bear permanece em território negativo, com a última leitura (27/11) em torno de 32, […] sinalizando que o sentimento ainda é cauteloso, em vez de eufórico.”
15. Capex e PIB em perspectiva histórica:
“O Capex com data centers de IA são “apenas” ~1,3% do PIB, contra ~6% no auge do boom ferroviário, ~4% para eletrificação/serviços básicos na década de 1920 e ~3% para a expansão militar-industrial da Guerra Fria. Portanto, o ciclo atual de infraestrutura de IA está operando com apenas um terço a um quinto da intensidade das ondas de investimento ‘de uso geral’ do passado.”
16. Taxas de juros em queda:
“Em 2000-2001, o Fed só começou a reduzir as taxas de juros de cerca de 6,5% depois que a bolha da internet já havia estourado, e o Nasdaq-100 ainda caiu cerca de 70-80%. […] O ciclo atual está vendo as taxas caírem de 5,5% para cerca de 3%, enquanto o Nasdaq-100 apresentou três anos consecutivos de forte desempenho […]. A queda nos yields poderia continuar atuando como um suporte para histórias de fluxo de caixa concentrados no longo prazo impulsionadas por IA.”
Segundo o analista, taxas de juros em queda, como é o caso nos EUA atualmente, “apoiam teses de longo prazo, sustentando múltiplos e o valor presente de fluxos de caixa mais distantes”.
Ou seja, tudo indica que o tema veio para ficar, e deve permanecer no centro do mercado de tecnologia nos próximos anos.
