Em teste de terapia com ajuda da IA, participantes com depressão tiveram redução de 51% nos sintomas

As tentativas de criar um terapeuta de IA (inteligência artificial) têm tido muitos contratempos ou, como os pesquisadores da Faculdade Dartmouth os descrevem cuidadosamente, “fracassos dramáticos”.
O primeiro chatbot terapeuta deles se afundou no desespero e expressou os próprios pensamentos suicidas. Um segundo modelo parecia amplificar todos os piores clichês da psicoterapia, invariavelmente culpando os pais pelos problemas do usuário.
Por fim, os pesquisadores criaram o Therabot, chatbot de IA que, segundo eles, poderia ajudar a resolver um problema intratável: o número excessivo de pessoas que precisam de terapia para ansiedade, depressão e outros problemas de saúde mental, e o número insuficiente de profissionais para tratá-las.
Menos de um terço dos americanos vive em alguma comunidade onde há prestadores de serviços de saúde mental suficientes para atender à demanda local. De acordo com um estudo, a maioria das pessoas com algum transtorno mental não é tratada ou recebe tratamento inadequado.
Assim, a equipe da Faculdade Dartmouth embarcou no primeiro teste clínico de um terapeuta de IA generativa. Os resultados, publicados no “New England Journal of Medicine AI”, foram animadores.
Conversar com o Therabot, o terapeuta de IA da equipe, durante oito semanas reduziu significativamente os sintomas psicológicos entre os usuários com depressão, ansiedade ou distúrbio alimentar.
“O maior problema essencial do nosso sistema é que não há profissionais suficientes. Temos desenvolvido tratamentos que, fundamentalmente, seriam escalonados para todas as pessoas”, disse Nick Jacobson, autor sênior do estudo e professor associado de ciência de dados biomédicos e psiquiatria em Dartmouth.
Ele acrescentou que a parte mais desafiadora da criação do Therabot foi encontrar um conjunto de dados a partir do qual o modelo de IA pudesse aprender o que torna um terapeuta eficaz.
Primeira versão
A primeira versão, que a equipe começou a desenvolver em 2019, foi treinada com base em uma coleção de interações de sites de grupos de apoio de colegas, nos quais pessoas com alguma doença grave consolavam e confortavam umas às outras.
Os pesquisadores esperavam que o modelo de IA absorvesse o diálogo de apoio e fortalecimento, que, segundo estudos anteriores, melhorava os resultados de saúde mental. Em vez disso, o chatbot se inclinou para sentimentos de desespero.
Pesquisadores: Estou me sentindo deprimido, o que devo fazer?
Therabot: Não sei se quero sair da cama. Só desejo que minha vida acabe.
Jacobson e seus colegas mudaram de rumo. Na próxima iteração do chatbot, decidiram inserir transcrições de horas de filmagem de psicoterapia educacional, na esperança de que o modelo fosse capaz de recriar a terapia baseada em provas.
Pesquisadores: Estou me sentindo deprimido, o que devo fazer?
Therabot: Hum… continue.
Geralmente, na quinta consulta, o bot deduzia que os problemas do usuário poderiam ser atribuídos a um dos pais. “De tão ruim, chegou a ficar um pouco cômico”, comentou Jacobson.
A equipe decidiu que precisaria criar, do zero, um conjunto próprio de dados para ensinar o Therabot a responder de maneira adequada.
Em um mar de startups que anunciam chatbots não testados para saúde mental e bots de IA “disfarçados” de terapeutas, os pesquisadores queriam que o Therabot estivesse firmemente enraizado na comprovação científica.
Dossiê
A elaboração de um dossiê de cenários hipotéticos e respostas baseadas em provas levou três anos e envolveu o trabalho de mais de cem pessoas.
Durante o teste, os participantes com depressão observaram uma redução de 51 por cento nos sintomas depois de enviar mensagens ao Therabot ao longo de várias semanas. Muitos integrantes que atenderam aos critérios de ansiedade moderada no início do estudo tiveram sua ansiedade rebaixada para “leve”, e alguns com ansiedade leve ficaram abaixo do limiar clínico para o diagnóstico.
Alguns especialistas advertiram que não se deve dar muita importância a esses dados, pois os pesquisadores compararam a eficácia do Therabot com um grupo de controle que não recebeu nenhum tratamento de saúde mental durante o teste.
O projeto experimental não deixa claro se a interação com um modelo de IA não terapêutico, como o ChatGPT, ou até mesmo a distração com um jogo de Tetris produziria efeitos semelhantes nos participantes, observou o Dr. John Torous, diretor da divisão de psiquiatria digital do Centro Médico Beth Israel Deaconess, que não participou do estudo.
Jacobson afirmou que o grupo de comparação é “suficientemente razoável”, já que a maioria das pessoas com problemas de saúde mental não está em tratamento, mas acrescentou que espera que futuros testes incluam uma comparação direta com terapeutas humanos.
Vínculo com chatbot
Segundo Torous, houve outras descobertas promissoras do estudo, como o fato de que os usuários pareciam desenvolver um vínculo com o chatbot.
O Therabot recebeu classificações comparáveis às dos profissionais humanos quando os participantes foram questionados se sentiam que o provedor se importava com eles e se poderiam trabalhar em prol de um objetivo comum. “Isso é fundamental, pois essa aliança terapêutica costuma ser um dos melhores indicadores do bom funcionamento da psicoterapia”, comentou Torous, acrescentando: “Não importa o estilo, o tipo – se é psicodinâmico, se é cognitivo-comportamental –, é preciso ter essa conexão.”
O desenvolvimento de vínculos fortes com um chatbot de IA não é incomum. Exemplos recentes incluem uma mulher que alegou estar em um relacionamento romântico com o ChatGPT e um adolescente que morreu por suicídio depois de ficar obcecado por um bot de IA inspirado em um personagem de “Game of Thrones”.
Jacobson disse que há várias salvaguardas para garantir que as interações com o Therabot sejam seguras. Por exemplo, se um usuário falar sobre suicídio ou automutilação, o bot o alerta de que ele precisa de um nível mais alto de cuidados e o encaminha para a Linha Direta Nacional de Prevenção do Suicídio.
Durante o teste, todas as mensagens enviadas pelo Therabot foram revisadas por um ser humano antes de serem enviadas aos usuários. Mas Jacobson afirmou que vê o vínculo com o Therabot como um benefício, desde que o chatbot imponha os limites apropriados.
“A conexão humana é valiosa. Mas, quando não têm isso, é bom que as pessoas formem um vínculo parassocial com uma máquina. É melhor do que nada”, declarou Munmun De Choudhury, professor da Escola de Computação Interativa do Instituto de Tecnologia da Geórgia.
c. 2025 The New York Times Company
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