O ritmo de crescimento da economia brasileira acelerou no segundo trimestre de 2024, com expansão de 1,4% sobre o trimestre anterior, feito o ajuste sazonal. É uma taxa mais alta que o 1% registrado de janeiro a março, equivalendo a quase 6% em termos anualizados, a maior desde os 3,7% do quarto trimestre de 2020.
Pelo lado da demanda, os destaques foram o investimento, o consumo das famílias e também o consumo do governo. Pelo lado da oferta, a indústria e os serviços puxaram o avanço do PIB.
A atividade avança num cenário marcado por um mercado de trabalho forte, com grande impulso fiscal, especialmente por meio de transferências de renda, e pela retomada do crédito. Os efeitos das chuvas no Rio Grande do Sul, em maio, não tiraram o dinamismo da economia no período.
Além de o crescimento no segundo trimestre ter superado o consenso dos analistas, de uma alta de 0,9%, houve revisão para cima na variação do PIB nos dois trimestres anteriores. O avanço do primeiro trimestre subiu de 0,8% para 1%, e o do quarto trimestre de 2023, de queda de 0,1% para aumento de 0,2%, sempre na comparação com os três meses anteriores.
Com esse ritmo de crescimento, as projeções para a expansão do PIB no ano devem se aproximar de 3%. A herança estatística do segundo trimestre ficou em 2,5%. Isso significa que, se o PIB ficar estável no nível registrado de abril a junho, o avanço em 2024 será de 2,5%.
O Goldman Sachs elevou a estimativa para o ano de 2,5% para 3%, por exemplo. Com isso, aumenta a perspectiva de uma alta dos juros já em setembro.
Com peso de mais de 60% na economia pelo lado da demanda, o consumo das famílias cresceu no segundo trimestre 1,3% sobre o trimestre anterior. O aumento do emprego e da renda, turbinado também pelos programas sociais e pela alta do salário mínimo acima da inflação, contribui para a alta da demanda das famílias.
A melhora do crédito também ajuda. Na comparação com o mesmo período do ano anterior, o consumo privado acelerou, passando de um aumento de 4,4% no primeiro para 4,9% no segundo trimestre.
Uma das melhores notícias do PIB foi a terceira alta consecutiva do investimento, e a um ritmo expressivo. A formação bruta de capital fixo (FBCF, medida do que se investe em construção civil, máquinas e equipamentos e inovação) cresceu 2,1% em relação aos três meses anteriores.
Investir mais é fundamental para o país crescer a um ritmo mais forte de modo sustentado. Com o resultado, a taxa de investimento ficou em 16,8% do PIB no segundo trimestre, acima dos 16,4% do PIB do mesmo período de 2023. Ainda assim, é um nível baixo, bem inferior aos 20,5% a 21% do PIB registrados entre 2010 e 2013.
O consumo do governo surpreendeu os analistas, com alta de 1,3% em relação ao primeiro trimestre. O consenso dos economistas ouvidos pelo Valor era de um aumento de 0,3% para o indicador.
Para o diretor de pesquisa para a América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos, a alta do consumo do governo está em linha com o recente ativismo nos gastos públicos.
“A política fiscal tem sido claramente expansionista e pró-cíclica”, afirma ele, para quem a economia está aquecida demais. Ramos avalia que a queda da taxa de poupança, de 16,8% do PIB no segundo trimestre de 2023 para 16% do PIB no mesmo trimestre deste ano, reflete principalmente a piora da situação das contas públicas.
Segundo o IBGE, a expansão forte do consumo do governo se deve ao calendário eleitoral, que antecipa despesas para a primeira metade do ano, e aos gastos para combater os efeitos das enchentes no Rio Grande do Sul.
O economista-chefe da corretora Tullett Prebon, Fernando Montero, diz ainda que o aumento do número de funcionários públicos e da remuneração desses servidores também contribui para a alta do consumo do governo.
Com uma atividade econômica mais forte, as importações cresceram com força, a um ritmo bem superior ao das exportações. As compras do exterior tiveram alta de 7,6%, enquanto as vendas externas subiram 1,4%.
Nesse cenário, o setor externo contribuiu negativamente para o crescimento. Nas contas de Ramos, tirou 1,21 ponto percentual da expansão do PIB no segundo trimestre.
Do lado da oferta, a indústria teve o crescimento mais expressivo, de 1,8%, mesmo com o encolhimento de 4,4% do setor extrativo.
A indústria de transformação avançou 1,8%, mas o desempenho mais forte foi da construção civil, com alta de 3,5%, e do segmento de eletricidade, gás, água e esgoto, que avançou 4,2%. Segundo o IBGE, o resultado desse último setor refletiu “o maior consumo de eletricidade, principalmente nas residências”, além do fato de a manutenção da bandeira tarifária verde ter ajudado o segmento.
Os serviços, por sua vez, tiveram mais uma expansão firme, de 1%. É o setor com maior peso na economia pelo lada da oferta, respondendo por mais de dois terços do valor adicionado.
Vários segmentos de serviços se destacaram. O comércio cresceu 1,4% e transportes e armazenagem avançaram 1,3%, enquanto informação e comunicação subiu 1,7% e atividades financeiras teve alta de 2%.
Fechando o PIB pelo lado da oferta, a agropecuária teve queda de 2,3%, após subir 11,1% no primeiro trimestre. É um recuo que já era esperado.
Em resumo, a economia brasileira teve um primeiro semestre muito forte, com a atividade acelerando no período de abril a junho em relação aos primeiros três meses do ano. Esse resultado aumenta a chance de mais um crescimento na casa de 3%.
No segundo semestre, os analistas acreditam que o ritmo será mais fraco. Ainda assim, os economistas têm sistematicamente subestimado a força da economia, algo que tem ocorrido desde 2021.
De qualquer modo, a taxa de expansão observada na primeira metade do ano não deverá se manter. Além disso, cresceu a possibilidade de o Banco Central (BC) começar um ciclo de alta de juros, talvez já neste mês. Isso terá impactos defasados sobre a atividade, mas poderá produzir algum efeito mais imediato sobre o investimento, por exemplo.
Para que a alta de juros, se ocorrer, não seja intensa, é importante uma contenção do ritmo de gastos.