O texto a seguir é de Roger Finger, head de Inovação da Positivo Tecnologia. Elaborado especialmente para esta coluna, ele mergulha em parte do mundo infinito da Inteligência Artificial e emerge com novidades sobre o que está chegando para mudar a vida das empresas e, principalmente, das pessoas.
Bem elaborado, de fácil entendimento, didático, objetivo, o texto de Finger é o presente de Natal que a coluna oferece aos seus milhares de leitores. Leiam-no devagar, com atenção, e perceberão que muita coisa mudará nas nossas vidas nos próximos anos. Eis o texto:
“A Inteligência Artificial aumenta a presença entre as pessoas quando passa a organizar o que fazemos todos os dias. Em 2026, a vida digital tende a dar outro salto. A IA deixa o papel de ferramenta brilhante para assumir o de camada que articula tempo, atenção, saúde, segurança e dinheiro. Isso acontece porque agentes inteligentes e modelos generativos deixam de atuar de forma isolada e passam a operar como um ecossistema que entende contexto, assume tarefas e protege dados, quase sempre em segundo plano.
“Os números já contam essa história. Pesquisa com quase 4 mil consumidores nos Estados Unidos mostraram que quase quatro em cada dez pessoas mergulharam no uso de IA generativa, com 85% dos usuários voltados a fins pessoais, 34% a tarefas de trabalho e 24% a atividades educacionais. A IA já edita documentos, resume conteúdos, ajuda em pesquisas, conversa, desenha imagens e produz planos de estudo. A fronteira agora se desloca do uso pontual para a orquestração da rotina.
“Estudo do National Bureau of Economic Research mostra a mesma curva em outro ângulo. Quase 40% da população de 18 a 64 anos nos Estados Unidos já utilizam IA generativa, com 23% dos trabalhadores relatando uso para o trabalho ao menos uma vez por semana e 9% recorrendo à tecnologia em todos os dias úteis. Entre 1% e 5% de todas as horas trabalhadas já recebem assistência da IA, com economia de tempo equivalente a 1,4% do total de horas. A IA já entrou na planilha de produtividade, mesmo quando a empresa tenta agir com cautela. Quando uma tecnologia chega a esse nível de infiltração, o próximo passo é inevitável: ela estrutura a experiência da pessoa, não apenas atividades isoladas.
“A peça que destrava 2026 é a IA agêntica. Há projeções de que 40% dos aplicativos corporativos incluirão agentes de IA específicos para tarefas até o fim de 2026, ante menos de 5% em 2025. Esses agentes executam fluxos inteiros de ponta a ponta, como os de resposta a ameaças que varrem tráfego de rede, logs e padrões de uso, classificam riscos e já iniciam ações de contenção. Quando esse tipo de arquitetura se consolida em sistemas empresariais, o consumidor sente o impacto na outra ponta: calendários, bancos, planos de saúde e casas conectadas passam a falar entre si, mediados por agentes pessoais.
“O assistente pessoal de 2026, portanto, não é apenas um chatbot simpático no celular. Ele se comporta como curador de decisões. Lê compromissos, entende padrões de deslocamento, cruza alertas de saúde com metas de produtividade, negocia automaticamente reagendamentos, compara assinaturas, renegocia serviços e até antecipa compras recorrentes com base em hábitos. A pessoa passa a delegar microdecisões operacionais a um conjunto de agentes coordenados. O foco humano se desloca de escolher cada detalhe para definir princípios: quanto tempo dedicar ao trabalho, qual o nível aceitável de risco financeiro, que limites de exposição digital tolerar.
“Na esfera da personalização, a evidência já aponta para uma intimidade crescente entre pessoas e IA. Há indicações de que a maioria dos usuários de IA generativa deseja utilizar essas ferramentas para planos personalizados de condicionamento físico, nutrição, compras e orientação financeira, além de saúde mental e relacionamentos. Esse apetite revela algo essencial. Quanto mais a IA se mostra capaz de entender o corpo, o humor, as escolhas e os desejos, maior a disposição para conceder a ela um papel de conselheira permanente.
“A saúde se torna o campo mais visível dessa virada. Revisão publicada no Journal of Personalized Medicine descreve como sensores vestíveis reforçados por IA já permitem monitoramento contínuo, análise em tempo real e diagnósticos rápidos, com impacto direto em medicina personalizada. O artigo aponta que esses biossensores vestíveis, alimentados por modelos de IA, viabilizam rastreamento preciso e não invasivo de parâmetros fisiológicos, fundamentais para detecção precoce de doenças e tratamentos personalizados. Em 2026, essa combinação deixa a zona experimental e se aproxima da rotina: relógios, anéis, adesivos cutâneos e roupas inteligentes deixam de ser gadgets curiosos para se converter em radares clínicos permanentes.
“A implicação é profunda. O corpo passa a emitir um fluxo constante de sinais interpretados por modelos especializados que buscam padrões sutis de fadiga, arritmia, alterações de sono, variações de pressão ou mudanças metabólicas. Agentes de IA conectados a esses dispositivos conseguem disparar alertas, sugerir ajustes de hábitos, acionar consultas remotas ou recomendar exames complementares antes do surgimento de sintomas claros. Em vez de visitar o sistema de saúde apenas diante de crises, a pessoa passa a habitar um ambiente em que a prevenção se distribui no tempo, com decisões graduais e personalizadas.
“Esse mesmo modelo de agentes vigilantes aparece na esfera da segurança digital. Pesquisas relatam a observação de mais de 600 milhões de ataques de cibercriminosos e atores estatais por dia contra clientes da empresa, além do processamento de 78 trilhões de sinais de segurança por dia em 2024, ante 65 trilhões em 2023, e do acompanhamento de mais de 1.500 grupos de ameaça únicos, com uso crescente de IA em spear phishing e deepfakes. A superfície de ataque cresce, o arsenal dos criminosos incorpora IA e o usuário médio se vê em franca desvantagem.
“Por isso, em 2026, a principal inovação em segurança para pessoas deixa de ser mais um antivírus e passa a ser um “agente de defesa pessoal”. Em vez de esperar que alguém desconfie de um e-mail suspeito, agentes de IA passam a ler mensagens, transações, telas e voz em tempo real, cruzando padrões de linguagem, histórico de uso e reputação de remetentes para bloquear tentativas de fraude antes de qualquer clique. Senhas se tornam menos relevantes do que o comportamento; o sistema estuda “jeitos” específicos de digitação, localização, horários típicos de acesso e sinais sutis de anomalia. A proteção deixa de depender da atenção constante da pessoa para se apoiar em modelos capazes de vigiar o ambiente digital 24 horas por dia.
“A integração da IA com tecnologias emergentes fecha o círculo. O mesmo agente que reorganiza a agenda conversa com o carro conectado, ajusta rotas para evitar congestionamentos, sincroniza compras com horários de menor movimento e transforma os óculos de realidade aumentada em uma interface de assistência contextual. A casa deixa de ser apenas “inteligente” para se tornar alinhada a intenções: luz, temperatura, som e eletrodomésticos reagem a rotinas aprendidas, mas com camadas de segurança reduzem o risco de perda de controle.
“Tudo isso, porém, só faz sentido se a pessoa permanecer no centro. Cerca de 26% dos consumidores percebem políticas claras de privacidade e controle de dados em seus provedores de tecnologia, mas essa minoria exibe níveis de confiança e gasto significativamente maiores do que o restante dos usuários. Empresas que oferecem IA como camada essencial da vida diária e, ao mesmo tempo, concedem controle granular sobre dados, ganham adesão, lealdade e disposição para experimentar novas formas de automação pessoal.
“Em 2026, a inteligência artificial passa a atuar como sistema operacional silencioso da vida cotidiana, ao articular assistentes autônomos, personalização radical, monitoramento contínuo de saúde e escudos inteligentes de cibersegurança. Pessoas que abraçam essa camada agêntica e generativa, com consciência dos riscos e exigência de proteção de dados, colhem mais tempo livre, mais segurança e maior bem-estar. Já quem recusa essa transição por completo corre o risco de conviver com serviços menos eficientes, experiências digitais mais frágeis e maior exposição a ameaças.
“A escolha que se coloca para a sociedade é menos sobre aceitar ou rejeitar a IA. É mais sobre definir em quais termos essa convivência ocorrerá. Agentes que decidem por nós podem aprisionar ou libertar. Quando operam com transparência, limites claros e compromisso real com privacidade, esses agentes ampliam a autonomia humana em vez de reduzi-la. Em 2026, a fronteira decisiva é clara. Quem governa a camada agêntica, governa a nossa rotina. Onde a pessoa assume o comando dessa resposta, a IA deixa de ser fantasma. A inteligência artificial se consolida como aliada concreta, exigente e, sobretudo, profundamente transformadora. Ainda mais se olharmos alguns anos à frente. Só não está claro ainda, se o palco será o celular, um óculo, um browser ou algo ainda não inventado.“

