1. Como apareceu a bitcoin?
Apareceu por iniciativa do movimento cypherpunk no início de 2009, com a publicação do whitepaper do Satoshi (pseudónimo que até hoje ninguém sabe quem é). Na minha opinião foi uma resposta tecnológica aos problemas inerentes ao nosso sistema monetário que ficaram a nu com a crise de 2008.
2. O que é o blockchain?
É uma tecnologia inovadora que permite transações em segurança sem intermediários. Uma espécie de base de dados distribuída e imutável cujos blocos (registos) são assegurados criptograficamente pelos vários operadores (normalmente chamados mineradores). Mas existem vários tipos de blockchains (aberta, fechada, mais ou menos centralizada ou descentralizada, etc.), umas mais interessantes que as outras.
3. Por que é a bitcoin tão valiosa se não tem existência física nem sequer utilidade, como têm o ouro ou os diamantes?
Porque pela primeira vez na história conseguiu-se criar um ativo digital com escassez assegurada (nunca haverá mais de 21 milhões de BTC em circulação) e que ninguém (seja bilionário, empresa ou país) consegue controlar, censurar, adulterar, etc. Daí ser muitas vezes chamada de ouro digital porque tem todas as propriedades do ouro e mais algumas (fácil de transportar já que não é físico, fácil de guardar, fácil de converter em qualquer fração, fácil de enviar de forma segura para qualquer parte do mundo, não pode ser confiscada, etc.).
4. Como posso comprar bitcoins?
É fácil. Só precisa de registar-se numa corretora conceituada como a Coinbase, Bitstamp, Kraken, Binance, Crypto.com ou numa corretora nacional como a CriptoLoja. Depois de feito o registo e passado no KYC, transfere euros para a sua conta lá e dá ordem de compra de bitcoin, igual a se estivesse a comprar ações da Apple. Mas cuidado na escolha da corretora. Convém usar uma das que referi aqui porque existem muitas burlas e corretoras de vão de escada que prometem mundos e fundos (logo aí temos uma gigante red flag de que é burla) e depois desaparecem com o nosso dinheiro e impossibilitam fazer o resgate de qualquer bitcoin que o cliente supostamente teria ‘comprado’.
5. Posso usar bitcoinpara fazer compras online?
Claro. Hoje em dia isso é muito fácil. Ou paga em bitcoin diretamente, já que cada vez mais vendedores aceitam essa forma de pagamento direto, ou então usa um cartão de débito Visa ou Mastercard associado à sua conta numa das corretoras que referi e paga normalmente como qualquer cartão normal. A diferença é que com o cartão cripto a conversão entre bitcoin e moeda fiat (euros ou dólares) é feita automaticamente pela sua corretora.
6. As criptomoedas são todas iguais?
Nem por sombras. Há dezenas de milhares, já que é facílimo criar uma, mas 99% não valem nada. Aliás, muitas dessas ‘criptomoedas’ nem sequer são verdadeiras criptomoedas e apenas usam essa designação porque é sexy e assim conseguem enganar os mais incautos a investir nas suas ‘moedas’. Para os mais puristas, apenas a bitcoin é uma verdadeira criptomoeda, e todas as outras são apelidadas de shitcoins, com a honrosa exceção da ethereum. Aconselho toda a gente a cingir-se às principais criptomoedas e a ignorar as ditas shitcoins.
7. Donald Trump lançou uma criptomoeda nas vésperas da tomada de posse.E ganhou milhões de dólares às custas de muitos investidores que perderam o seu dinheiro. Isso não desacredita as criptmoedas?
Infelizmente sim. A moda das meme coins é, a meu ver, puramente especulativa e 99,9% valem zero. Mas as meme coins de que os media adoram falar representam um pequeno nicho de shitcoins altamente especulativas. Nada têm a ver com bitcoin ou ethereum. É preciso separar o trigo do joio. Com Trump, os EUA vão liderar neste mundo novo das cripto, precisamente porque inverteu 180 graus o rumo da administração Biden, que era claramente hostil à indústria. Esta administração tem pessoas muito competentes que percebem bem as potencialidades enormes e por isso estão a avançar rapidamente para tornar os EUA no cripto hub mundial. Infelizmente, neste capítulo, a UE está a ficar cada vez mais irrelevante. Resumindo, Trump tem sido (e acredito que continuará a ser) grande apoiante dos cripto ativos, mas essa triste história da ‘sua’ meme coin foi um tiro no pé.
8. Nessa altura a bitcoin atingiu 100 mil dólares e depois caiu. Não terá atingido já o pico do seu valor? Ainda vale a pena investir?
Ouço essa pergunta recorrentemente desde que chegou pela primeira vez aos 1000 dólares e a minha resposta é sempre a mesma há mais de uma década. Não, não atingiu o pico de valor e vale sempre a pena investir com a perspetiva de médio/longo prazo. Na minha análise, cada bitcoin vai um dia valer muitos milhões de dólares mas não gosto de falar sobre o preço ou dar conselhos financeiros. Cada um terá de estudar o assunto e gerir o seu próprio risco. Apenas alerto para o facto dos EUA estarem a implementar por ordem do Trump uma Reserva Estratégica Nacional de Bitcoin. Como é um ativo finito (nunca existirão mais de 21 milhões de BTC), quando outros países entrarem nessa corrida global às bitcoins o preço irá inevitavelmente subir. Eu defendo há mais de uma década que Portugal deveria ter uma Reserva Estratégica Nacional de Bitcoin para assegurar o futuro das gerações vindouras.
9. Em janeiro deste ano foi noticiado o maior roubo de sempre de criptoativos, quando a firma Bybit anunciou que hackers tinham roubado 1,5 mil milhões de dólares em moeda digital. É seguro investir em bitcoin?
Sim, bitcoin é a rede (além de ser uma moeda e um protocolo) mais segura do mundo. Hoje tem um market cap de 1,6 triliões de dólares [1.600.000.000.000] e é atacada diariamente há 16 anos sem nunca ter sido comprometida. Aliás, nesse exemplo recente que refere não foi bitcoin que foi hackeada, mas sim essa corretora centralizada. A filosofia de bitcoin é ‘not your keys, not your coins’. Isso quer dizer que, ao contrário de qualquer outro ativo existente, qualquer um pode e deve guardar as suas bitcoins num cold wallet (carteira que não está ligada à internet) que só ele controla. Aliás aconselho sempre as pessoas a resgatarem as suas bitcoins para o seu próprio cold wallet depois de comprar numa corretora centralizada. Os clientes da Bybit que fizeram isso não foram minimamente afetados por esse furto, uma vez que só eles podem movimentar as suas bitcoins utilizando o tal cold wallet.
10. Os computadores quânticos não vão tornar a bitcoin obsoleta?
Não. Esse é outro mito que ouço recorrentemente. Se alguém tivesse hoje um computador quântico capaz de fazer factoring large prime numbers aí, sim, seria uma desgraça, uma vez que quase toda a criptografia moderna baseia-se nesse problema matemático que os computadores clássicos (que temos agora) não conseguem quebrar, mas que um computador quântico suficientemente robusto conseguiria resolver em pouco tempo. Aliás esse momento em que teremos computadores quânticos suficientemente robustos para quebrar a criptografia clássica é apelidado pelos especialistas de ‘cryptogeddon’, uma mistura de criptografia e Armagedão. Mas ao contrário do que os media nos fazem crer, estamos ainda muito longe (décadas?) de ter esses computadores quânticos, por isso temos tempo para preparar a transição para a criptografia pós-quântica. Aliás na minha empresa Privus já usamos desde 2024 algoritmos pós-quânticos para proteger as comunicações dos nossos clientes, e nada impede bitcoin (o protocolo) de também fazer um update para deixar de usar ECDSA e SHA256 e passar a usar cifras pós-quânticas para proteger a sua blockchain. Tenho a certeza que esses updates irão acontecer na próxima década, já que é do interesse de todos e bitcoin sempre teve updates desde o primeiro dia. Mas acho engraçado que as pessoas se preocupem com a ameaça quântica à bitcoin mas não parecem compreender que todos os seus dados sensíveis atuais, desde homebanking, impostos, compras online, etc., estão vulneráveis a essa ameaça. Se o mundo não fizer essa transição, a ameaça à bitcoin será o último dos nossos problemas.