Câmara aprova acordo pela desoneração da folha

Plenário da Câmara dos Deputados pautou desoneração no último dia do prazo determinado pelo STF | Foto: Mário Agra/Câmara dos Deputados
Plenário da Câmara dos Deputados pautou desoneração no último dia do prazo determinado pelo STF | Foto: Mário Agra/Câmara dos Deputados

O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira, 11, o texto-base do projeto de lei que materializa o acordo pela reoneração da folha de pagamentos a 17 setores da economia a partir de 2025 (PL 1847/2024), prevendo compensações para o impacto financeiro. A deliberação ocorreu no último dia do prazo determinado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) como condição para que o benefício siga em vigor até o final deste ano.

Para garantir a segurança jurídica, no início da madrugada, a Advocacia-Geral da União (AGU), juntamente com a Advocacia do Senado Federal, pediram que a Corte conceda mais três dias úteis “unicamente a fim de que se ultime o processo legislativo em sua etapa derradeira de sanção / veto pelo Presidente da República”. A solicitação deve ser analisada pelo relator, ministro Cristiano Zanin.

A análise se deu em meio à incertezas, que motivaram até mesmo na formalização de um outro pedido de prorrogação do prazo para o acordo por parte da Brasscom (Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais) ao STF, no final da tardem por mais 30 dias. O motivo do impasse na Câmara só foi admitido publicamente no início da noite, quando o líder do governo, José Guimarães (PT-CE), anunciou que seria necessária uma mudança no texto para que ele fosse analisado.

A mudança em questão foi o acolhimento de sugestão do Banco Central para uma das medidas de compensação previstas no projeto, que trata da apropriação de valores esquecidos em instituições financeiras, estimados em R$ 8,6 bilhões. Guimarães explicou que o montante entrará como “efeito contábil” ao invés de receita primária, como previsto inicialmente, por impasse jurídico.

Para que o projeto não tivesse que voltar para o Senado Federal por conta da alteração substancial, o ajuste se deu como “emenda redacional”. Caso contrário, o prazo determinado pelo STF seria descumprido.

A votação ocorreu tumultuada, em meio a tentativas de obstrução pela oposição. O resultado da aprovação do texto-base só foi proclamado por volta das 23h55. Nesta quinta-feira, 12, os deputados seguem na análise de destaques.

Desoneração

A desoneração da folha de pagamento, em vigor desde 2011, permite que as empresas recolham de 1% a 4,5% sobre a receita bruta em vez de 20% sobre o salário dos empregados. O acordo pela reoneração prevê um acréscimo gradual, sendo: 5% (sobre a folha) em 2025, 10% em 2026, 15% em 2027 e 20% a partir de 2028.

Quanto às compensações, o projeto de lei lista uma série de medidas que podem gerar receita aos cofres públicos que, somadas, representariam cerca de R$ 17 bilhões. Entre elas está um programa de negociação –  Desenrola –  de multas cobradas pelas agências reguladoras, calculado em R$ 2,5 bilhões (saiba mais abaixo).

Manutenção dos empregos

O acordo costurado pela manutenção da desoneração prevê que as empresas “deverão firmar termo no qual se comprometem a manter, em seus quadros funcionais, ao longo de cada ano-calendário, quantitativo médio de empregados igual ou superior a 75% do verificado na média do ano-calendário imediatamente anterior”. Em caso de descumprimento, a empresa será cortada do benefício durante todo o ano.

Inicialmente, não havia percentual delimitado, o quantitativo seria “igual ou superior ao verificado em 1º de janeiro de cada ano-calendário”, o que ficou entendido como desproporcional à gradação proposta na reoneração.

Desenrola

Parte da compensação pela desoneração, a chamada “medida de Desenrola” para agências reguladoras está prevista como alterações na Lei do Perdão de Dívidas (Lei nº 13.988, de 14 de abril de 2020) e na Lei da Dívida Ativa da União (a Lei nº 10.522, de 19 de julho de 2002).

Na Lei do Perdão de Dívidas cria-se um novo capítulo, que prevê a criação de “Centrais de Cobrança e Negociação de Créditos”, no âmbito do Poder Executivo Federal e sob a governança da Advocacia-Geral da União (AGU).

As Centrais teriam “competência transversal para realizar acordos de transação resolutiva de litígio relacionado ao contencioso administrativo, judicial ou a cobrança de débitos inscritos em dívida ativa ou de titularidade da União, Autarquias e Fundações detidos por pessoas físicas ou jurídicas, observadas as regras aplicáveis à transação na cobrança da dívida ativa”, “salvo matéria envolvendo créditos tributários”.

Caberia à AGU, como coordenadora, disciplinar as condições para instalação das centrais, “cuja operacionalização, conforme respectiva competência, se dará no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, da Procuradoria-Geral do Banco Central, da Procuradoria-Geral Federal e da Procuradoria-Geral da União”.

Ainda de acordo com o projeto, a Procuradoria-Geral Federal poderá propor aos devedores transação na cobrança da dívida ativa das autarquias e fundações públicas federais, “quando houver relevante interesse regulatório previamente reconhecido por ato do Advogado-Geral da União”.

Na avaliação do que será considerado “relevante interesse regulatório”, a proposta leva em consideração “quando o equacionamento de dívidas for necessário para assegurar as políticas públicas ou os serviços públicos prestados” pelas reguladoras, além de outros critérios, como “a manutenção das atividades dos agentes econômicos regulados”, “”a preservação da função social da regulação” e “o tempo necessário à execução da medida”.

Conforme o texto em discussão, “a apresentação da proposta individual ou a solicitação de adesão do devedor à proposta suspenderá o andamento das execuções fiscais, salvo oposição justificada da Procuradoria-Geral Federal”.

A Procuradoria-Geral também terá o papel de definir prazos e descontos.

O substitutivo apresentado ao plenário sugere a exigência dos seguintes compromissos adicionais ao devedor:

  • manter a prestação dos serviços públicos, nos termos do ato de delegação;
  • concluir a obra de construção, total ou parcial, conservação, reforma, ampliação ou melhoramento, nos termos do ato de delegação;
  • manter a regularidade dos pagamentos à autarquia ou fundação pública federal detentora do poder concedente, nos termos do ato de delegação; e
  • apresentar à autarquia ou fundação pública federal credora plano de conformidade regulatória.

Na Lei da Dívida Ativa da União, a proposta prevê a possibilidade de inclusão no rol do Cadastro Informativo de créditos não quitados do setor público federal (Cadin), as inscritas na dívida dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, conforme convênio firmado com a União, representada pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.

A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), especificamente, vem convertendo as multas em obrigações. O relatório de gestão da autarquia de 2023 indica que houve 668 multas, mas 67% delas não foram arrecadadas. Em valores, as sanções do ano passado somaram R$ 225 milhões, enquanto que o montante recolhido foi de R$ 127 milhões. Dos R$ 98 milhões não arrecadados, R$ 78,9 milhões finalizaram o ano suspensos judicialmente.

Próximos passos

Apesar de reconhecer o projeto como um acordo, o governo já havia antecipado que os termos alcançados no Congresso não resolvem totalmente o problema, pois estima-se um impacto maior do que o previsto.

Os cálculos da equipe econômica indicaram inicialmente a necessidade de R$ 26 bilhões, mas após analisar dados mais recentes compartilhados pelas empresas, ele pode chegar a R$ 35 bilhões. Por isso, a Fazenda encaminhou duas propostas para tramitar separadas, fora do acordo, com objetivo de cobrir o recurso que falta.

Uma das sugestões é o aumento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CLSS), que já havia sido apresentada durante a construção do acordo pela desoneração, mas não obteve apoio dos setores econômicos e dos parlamentares.

A CSLL  funciona atualmente nos percentuais de 9% a 20%. Inicialmente, o governo pretendia ampliar em um ponto percentual. A proposta mais recente, no entanto, amplia em até dois pontos percentuais. Sugere-se que entre 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2025, a alíquota passe a ser de:

  • Para bancos: de 20% para 22%;
  • Para empresas de seguros privados, de capitalização, corretoras e sociedades de crédito: de 15% a 16%; e
  • Para as demais empresas: de 9% para 10%.

A outra medida seria mexer na alíquota do imposto sobre a renda retido na fonte incidente sobre os juros sobre capital próprio (JCP), passando de 15% para 20%.

As alterações tramitam no PL 3394/24, que está sob urgência constitucional, o que impõe prazo de 45 dias para análise em cada Casa.

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