postado em 30/11/2025 06:00 / atualizado em 30/11/2025 06:00
Thais Borges é diretora comercial da Systax e autora do livro: “Furei a Bolha” – (crédito: Vinícius Cavalcante)
“Oque a vida quer da gente é coragem.” A frase de Guimarães Rosa, no clássico Grande Sertão: Veredas, resume a vida de Thaís Borges. Quando entrou no emprego de telemarketing, ela não sabia o impacto que a vaga geraria na sua vida. Ao terminar o ensino médio, sem condições financeiras para pagar uma faculdade privada — ou oportunidade de prestar vestibular para uma pública —, Thaís viuse encurralada: precisava ganhar dinheiro. Na rotina de trabalhar de segunda a segunda, sem vida social, descobriu a vocação: as vendas. “Falo até hoje que sou operadora de telemarketing de sucesso com muito orgulho.”
Ao atender chamadas telefônicas e negociar preços, viu que essa era sua chance e “cavou a oportunidade”. Descobriu uma empresa na área fiscal e tributária, onde os operadores de telemarketing ganhavam muito bem. “Fiz contato e falei que queria uma vaga”, lembra Thaís.
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No entanto, ela percebeu que, para se destacar, precisava ir além do discurso pronto. Sempre batendo as metas de venda, em um momento crucial da carreira, queria mais. Candidatou-se a uma vaga em uma empresa fora do seu radar de atuação e conseguiu o emprego. Anos depois, ocupa o cargo de diretora de Comercial e de Marketing na Systax, no segmento onde é especialista há mais de 20 anos: o de vendas de soluções e serviços para a área fiscal e tributária.
Infância
A infância de Thaís na periferia de São Paulo foi marcada pelo racismo
(foto: Arquivo Pessoal)
Nascida na periferia de São Paulo, cresceu em meio ao comércio. A carreira começou no pequeno negócio dos pais. “É um empreendedorismo periférico. Meus pais tinham uma sorveteria, onde trabalhei quando era pré-adolescente.” Foi no comércio de bairro dos pais que aprendeu sobre noções de responsabilidade, sobre lidar com clientes e a importância do esforço no resultado do trabalho. Em casa, na Zona Norte, convivia com os pais, avós, tias e primos. “É uma família de gente guerreira”, afirma. “Sempre tive essa raça de me virar. De fazer alguma coisa, não deixar faltar nada para minha família.” Ela lembra que, desde nova, teve garra de correr atrás dos objetivos. Ao passar roupas para fora, ganhava o próprio dinheiro. Depois de um tempo, para viabilizar o sonho da sorveteria, a família mudou-se para um local alugado, no bairro da Casa Verde. Chegaram a residir, por nove meses, nos fundos do estabelecimento.
A executiva apoia mulheres da periferia que sonham em empreender: impacto social
(foto: Arquivo Pessoal)
“No tempo que morei no Cambuci, lembro que sofria racismo durante as brincadeiras com as crianças. A gente gostava de imitar o Xou da Xuxa, que estava no auge na época, e eu sempre ficava de fora, com a alegação de que não existia paquita preta”, lembra. Mesmo com os casos de racismo, recorrentes desde a infância, Thaís conta que nunca ligou de ser a “figurinha premiada”: a única negra no meio de brancos. “Mesmo sem ter isso muito elaborado dentro de mim, eu resistia em ser ‘deixada no meu lugar’.”
Na sua trajetória, que inspirou o livro Furei a bolha, ela destaca que suas principais referências foram as mulheres. Posteriormente, Thaís foi a primeira pessoa de sua família a conquistar uma graduação. “Para eles, com o fim do ensino médio, deve-se procurar um emprego. No máximo, conhecer marido, casar.”
Thaís Borges e filha, que está fazendo intercâmbio em San Diego
(foto: Arquivo Pessoal)
A ascensão de Thaís foi confrontada com as barreiras do machismo e do preconceito racial, desafios recorrentes no mercado de tecnologia fiscal, historicamente dominado por homens brancos. A empresária focou nos resultados para se manter e prosperar. “Em vendas, o resultado é o que te mantém”, pontua. Os resultados preservaram sua relevância no mercado, mesmo diante de investidas negativas.
Formação
Exibindo o livro Furei a bolha
(foto: Arquivo Pessoal)
A formação acadêmica de Thaís não seguiu uma linha tradicional. O primeiro passo foi um curso de tecnólogo — de dois anos — em marketing, para conseguir o diploma de nível superior exigido pelo cargo de gerente que ela ocupava. Em seguida, ingressou no curso de administração, um Master of Business Administration (MBA) e uma pós-graduação no Mackenzie.
A executiva ressalta a importância de valorizar a educação, tanto a não estruturada (o aprendizado prático) quanto a estruturada. A paixão pela área tributária se deu pela correlação entre o conhecimento e o retorno financeiro. Mas ela defende que sua capacidade está na garra e no processo técnico de venda, onde “faria sucesso em qualquer outra área”
A entrada de Thaís na área fiscal e tributária, pela empresa IOB — especializada em softwares de gestão empresarial e contábil — deu-se inicialmente como temporária. A passagem rápida para um cargo efetivo foi assegurada pela determinação e pela diferença no trabalho: “Em vendas, quanto mais técnica você tiver, uma abordagem construtiva, e o posicionamento como consultor, melhor. Faz toda diferença”
Para elevar o desempenho nas vendas, Thaís adotou uma tática: investiu em conhecimento técnico. Ela não se limitava a vender manuais e informativos, mas absorvia o conteúdo sobre legislação e Imposto de Renda, o que a conectava diretamente com as necessidades do mundo empresarial. Passou a frequentar os cursos que a própria empresa vendia, ao perceber que a abordagem técnica fazia o cliente valorizar e comprar o produto. “O conhecimento técnico me fez vender, gerando dinheiro”, resume. Essa capacidade de articulação especializada a fez “estourar em vendas”, e foi o diferencial que moldou o restante de sua carreira.
A executiva permaneceu na IOB por 12 anos, trilhando um caminho de ascensão contínua: de operadora, passou por processos de renovação, subiu de posição e chegou a executiva senior de vendas externas.
Livro e legado
Livro Furei a Bolha, da autora Thais Borges
(foto: Reprodução/ Trend Editora)
A trajetória foi materializada em livro, Furei a Bolha, em que Thaís relata, em detalhes, a própria história. Hoje, além de diretora comercial de uma grande empresa, atua como investidora de impacto social, apoiando mulheres periféricas que sonham em empreender e romper ciclos de vulnerabilidade. Ela conta que o objetivo do livro é mostrar que, independente de sua origem, é possível “furar a bolha”.
A mensagem de Thaís para o leitor é um convite a “sair do automático” e a “estar em movimento”. A inércia, segundo ela, garante que se permaneça no mesmo lugar. “Se eu me mexer, eu tenho certeza de que vou chegar em algum lugar”, garante. A empresária conta que a tentativa e o erro fazem parte, e é preciso se movimentar para criar oportunidades.
ortunidades. Thaís usa sua posição não apenas na função executiva, mas também como mentora e investidora- -anjo, visando inspirar mulheres e pessoas que não se veem em posições de liderança e mostrando ser possível “furar essa bolha grossa”
*Estagiária sob a supervisão de Ana Sá.

