Sim. Conduzir veículo sem portar a Carteira Nacional de Habilitação configura infração de trânsito de natureza leve, prevista no artigo 232 do Código de Trânsito Brasileiro, sujeita a multa e retenção do veículo até apresentação do documento. A lei considera indispensável que o motorista esteja apto e demonstre essa aptidão no momento da fiscalização, ainda que, posteriormente, possa regularizar a situação apresentando a CNH dentro do prazo previsto e transformar a penalidade em advertência por escrito. A seguir, aprofundo cada aspecto jurídico, prático e procedimental, passo a passo, para que o leitor compreenda em detalhe todas as consequências, exceções e formas de defesa.
Contexto normativo
O Código de Trânsito Brasileiro (CTB), lei federal que disciplina a circulação de veículos e o comportamento dos condutores, estabelece no artigo 159 a obrigatoriedade de portar a CNH sempre que se dirige. O porte funciona como prova imediata de que o condutor possui habilitação válida, categoria adequada ao veículo e não está suspenso ou cassado. Já o artigo 232 tipifica como infração leve a condução sem o documento de porte obrigatório, estendendo-se a Certificado de Registro e Licenciamento do Veículo (CRLV). Embora leve em termos de pontuação, a conduta gera multa e pontos na CNH, além da retenção do automóvel.
Diferença entre portar e possuir habilitação
Possuir habilitação significa ter sido aprovado nos exames, com registro regular no órgão executivo de trânsito. Portar é ter o documento físico ou digital disponível naquele instante. Logo, quem está habilitado mas esqueceu a CNH no bolso de outra calça incorre apenas na infração do artigo 232, ao passo que quem dirige sem nunca ter sido habilitado comete infração gravíssima autossuspensiva.
Tipificação da conduta
A infração leve aplica três pontos ao prontuário do motorista, e retenção até apresentação de condutor habilitado ou do documento. Diferentemente da infração gravíssima por inabilitação, não há medida administrativa de recolhimento da CNH, porque ela simplesmente não está presente. O agente de trânsito deve lavrar auto de infração mencionando a ausência do documento e orientar o motorista sobre o prazo para regularizar.
Penalidades previstas
A multa corresponde ao valor definido pelo artigo 258 do CTB para infrações leves, atualmente R$ 88,38, atualizado periodicamente. Os três pontos têm repercussão na soma geral para fins de suspensão do direito de dirigir. A retenção do veículo depende de apresentação imediata de outro condutor habilitado ou do retorno ao local com o documento. Na prática, muitos órgãos permitem que o motorista vá buscar a CNH e volte, desde que não transite novamente sem o porte, mas essa liberalidade varia.
Abordagem de agentes de trânsito
Durante a fiscalização, o agente solicita documento de identificação com foto e CNH. Na impossibilidade de exibir, ele registra no talonário eletrônico, seleciona o enquadramento específico, descreve a situação e libera ou retém o veículo conforme regulamentação local. O motorista deve permanecer calmo, fornecer dados corretos e assinar o auto apenas para ciência, jamais como admissão de culpa. Recusar a assinatura não impede o prosseguimento do procedimento.
Apresentação posterior do documento
O artigo 270, §2º, do CTB permite que a autoridade ou seu agente restitua o veículo ao condutor mediante apresentação do documento posteriormente, dentro de prazo razoável. Além disso, o artigo 267 abre a possibilidade de conversão da multa leve em advertência por escrito, caso o condutor não tenha reincidido nessa mesma infração nos últimos doze meses. Para isso, deve-se protocolar requerimento junto ao órgão autuador, anexando cópia da CNH e comprovando a regularidade.
Aplicação do princípio da razoabilidade
Embora o texto legal seja claro, a jurisprudência administrativa reconhece que infrações meramente formais podem, em situações específicas, ser desconsideradas com base em razoabilidade. Por exemplo, motorista surpreendido em blitz levando parente ao hospital e esquecido de carteira conta com precedentes que anularam a penalidade em face de emergência comprovada. Cada caso depende de prova robusta e argumentação baseada em princípios constitucionais.
Consequências administrativas
O registro da infração soma pontos e pode contribuir para atingir o limite de 20, 30 ou 40 pontos, conforme o condutor possua ou não infrações gravíssimas no período. Se o limite for excedido, instaura-se processo de suspensão, com ônus defensivo maior. Portanto, mesmo sendo infração leve, o efeito acumulado preocupa quem já carrega pontuação elevada.
Repercussão em seguradoras
Embora pontuação leve não costume impactar calculadoras de risco de modo significativo, seguradoras que adotam modelos analíticos avançados podem analisar histórico completo. Um prontuário sem infrações transmite imagem de condutor responsável, podendo refletir em prêmios menores. Além disso, em sinistro, a ausência de CNH válida no momento do acidente pode gerar negativa de cobertura.
Impugnação da infração
O motorista dispõe de defesa prévia e dois recursos administrativos. Na defesa prévia, recomenda-se alegar eventual erro de enquadramento, falta de descrição minuciosa ou ausência de comprovação de abordagem. Se a CNH estava no painel do veículo e o agente não aguardou busca rápida, pode-se argumentar cerceamento de defesa. Nos recursos posteriores, invocam-se princípios, falhas processuais, falta de motivação e possibilidade de advertência.
Jurisprudência administrativa
Juntas Administrativas de Recursos de Infrações (JARI) e Conselhos Estaduais de Trânsito têm anulado autuações quando demonstrado que o documento digital poderia ser exibido mas houve falha de sinal ou aplicativo. Também existem decisões favoráveis a motoristas que apresentaram vídeo de corpo mostrando a CNH guardada mas não localizada de imediato. A tendência é equilibrar rigor normativo com razoabilidade diante das novidades tecnológicas.
Casos práticos ilustrativos
Um condutor de aplicativo esquecera a CNH impressa, porém tinha CNH digital salva no celular descarregado. O agente aplicou multa. Em recurso, anexou print-screen posterior da CNH-e e nota fiscal do power bank quebrado no momento da blitz. A JARI converteu a penalidade em advertência. Em outro caso, motociclista multado mostrou que sua carteira havia sido furtada na manhã do mesmo dia e apresentou boletim de ocorrência; o conselho anulou a autuação.
Dirigir sem habilitação versus não portar
Dirigir sem habilitação envolve infração gravíssima, multa multiplicada por três e recolhimento do veículo. Se ocasiona lesão, pode configurar crime de trânsito. Já não portar o documento atinge apenas a formalidade, mas mantém a pressuposição de que o condutor é habilitado. Essa distinção reflete a ideia de que a sociedade pune com maior severidade quem nunca adquiriu competência técnica ou quem está suspenso.
Documentos digitais e CNH-e
A CNH digital tem validade jurídica plena desde 2018. Portar o celular com o aplicativo Carteira Digital de Trânsito atende ao requisito legal. No entanto, o motorista deve garantir bateria e acesso, pois o agente não é obrigado a fornecer carregador ou conexão. Se o aplicativo não abre, configura-se a mesma infração por falta de comprovação imediata.
Recomendação para motoristas
Mantenha a CNH física num local definido do veículo ou junto a objetos pessoais indispensáveis, como carteira ou chave; instale a CNH-e; verifique validade do documento; e acompanhe pontos acumulados no Portal de Serviços Senatran. Em viagens longas, leve cópia autenticada ou digitalizada armazenada na nuvem para eventuais emergências. A prevenção evita gastos e transtornos.
Responsabilidade do proprietário
Caso o condutor flagrado sem portar CNH não seja o proprietário do veículo, este será notificado para indicar quem dirigia. Se não cumprir, responderá por multa de não indicação de real infrator, mais onerosa que a infração original. Empresas de logística devem ter protocolos internos de checagem documental antes de liberar frota.
Perguntas e respostas
Esqueci a CNH e fui multado. Posso anular a multa?
Sim, desde que prove que possuía habilitação válida no momento e requeira conversão em advertência, se não houver reincidência no último ano.
A CNH digital substitui a física?
Substitui, mas necessita de celular funcional e aplicativo atualizado. Falta de acesso na hora da abordagem resulta em infração.
Quanto tempo tenho para apresentar o documento depois da retenção?
Depende do órgão autuador, mas geralmente até a conclusão da lavratura ou prazo fixado na notificação. Apresente o quanto antes.
Perco pontos se a multa for convertida em advertência?
Não. A advertência cancela a multa e a pontuação.
E se eu estiver com CNH vencida há menos de trinta dias?
A infração por documento vencido é diferente e classificada como gravíssima após o trigésimo dia. Dentro do prazo de tolerância, portar CNH vencida não gera penalidade, mas esquece-la implica infração leve.
Motorista profissional tem tratamento diferenciado?
Não quanto à tipificação. Contudo, empresas podem aplicar sanções internas ou desligamento por descumprir normas de transporte.
Posso dirigir levando apenas foto da CNH no celular?
Não. Foto simples não possui assinatura digital certificada. Somente a CNH-e oficial supre a exigência.
Tenho processo de suspensão em curso. Não portar a CNH agrava a situação?
Pode somar pontos, acelerando a contagem que ensejará nova penalidade ou impedindo a conclusão favorável do processo de defesa.
Posso emprestar meu carro a alguém que esqueceu a CNH em casa?
Você responderá solidariamente se permitir, pois a obrigação de portar documento é pessoal e independe da posse do veículo.
Qual o valor atualizado da multa leve?
R$ 88,38, sujeito a reajuste conforme legislação.
Conclusão
Conduzir veículo sem portar a CNH é infração leve, mas traz implicações que vão além da multa, envolvendo pontuação, retenção, transtornos operacionais e possíveis aumentos em seguro. A legislação equilibra segurança viária com oportunidade de regularização, permitindo conversão em advertência quando demonstrada boa fé e ausência de reincidência. Ainda assim, a melhor medida é manter o documento — físico ou digital — sempre acessível, preservar a bateria do celular e verificar regularmente a validade da habilitação. Dessa forma, o motorista evita gastos, protege seu prontuário e contribui para um trânsito mais seguro e responsável.