O futuro das contas públicas, já incerto, está prestes a enfrentar uma nova ameaça: o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF), já iniciado, de mais de 15 Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) contestando alterações feitas pela reforma da Previdência aprovada em 2019 nas regras de aposentadoria do regime previdenciário dos servidores públicos federais (RPPS).
Se o governo perdesse todas as ações, o déficit da Previdência cresceria no mínimo R$ 498 bilhões ao longo dos anos, de acordo com os cálculos da Advocacia-Geral da União (AGU) — ou perto de 40% do déficit atuarial total estimado para o RPPS. Embora os ministros já tenham formado maioria para negar boa parte das demandas dos servidores públicos, em três delas o placar é favorável à derrubada de artigos da reforma e em uma está empatado, aguardando devolução do pedido de vista do ministro Gilmar Mendes. A derrota do governo apenas nesses quatro itens significaria, segundo a AGU, um aumento de R$ 206,4 bilhões no déficit atuarial do RPPS. O problema se agravará considerando o impacto inevitável na Previdência dos servidores estaduais e municipais.
Está em jogo o princípio seguido pela reforma de 2019 de equiparar o RPPS ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), dos trabalhadores formais de empresas privadas que contribuem para o INSS. A reforma teve um sentido de justiça social que poderá ser perdido, a depender das decisões do Supremo.
As ações têm como objetivo restabelecer regras de favorecimento ao funcionalismo. Uma delas pretende elevar o benefício das aposentadas atingidas pela revisão dos conceitos de “integralidade” e “paridade” existentes antes da reforma. Por eles, o servidor se aposentava com benefício igual ao último salário recebido e garantia de ter os mesmos aumentos concedidos ao funcionalismo da ativa, uma regra insustentável.
O retrocesso de maior impacto na contrarreforma em curso no Supremo seria provocado pela ação que pede a volta da contribuição previdenciária de 11% fixos, seja qual for o salário do funcionário. Não faz sentido magistrados, procuradores, fiscais da Receita, entre outras categorias da elite do funcionalismo, serem tratados da mesma forma que os demais servidores. Por isso a reforma criou alíquotas progressivas de 7,5% a 22%, como nas empresas privadas. Só esse retrocesso traria um impacto de R$ 73,8 bilhões. É justamente esse ponto que aguarda o voto de Gilmar.
O cerco jurídico armado por sindicatos e associações de servidores contra a reforma confirma o bordão irônico segundo o qual “no Brasil, até o passado é incerto”. Ao ameaçar o equilíbrio fiscal, a corrida ao Judiciário põe em risco a estabilidade econômica. Déficits públicos geram mais inflação, juros altos, recessão e desemprego. Quem paga a conta dos privilégios do funcionalismo é o resto da população.