Das inseguranças do domicílio judicial eletrônico: questão superada?


Opinião

O domicílio judicial eletrônico surgiu com o propósito de concentrar as comunicações emitidas pelos tribunais pátrios e possibilitar, de forma 100% digital e gratuita, o recebimento e o acompanhamento pelos destinatários.

CNJ

De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), os benefícios do sistema cingem-se, basicamente, mas não exclusivamente, em melhorar o gerenciamento das comunicações processuais, proporcionar maior celeridade ao processo — já que haverá redução no tempo de comunicação dos atos praticados — e, até mesmo, melhorar a eficiência do processo judicial, com a diminuição de recursos financeiros (custas e despesas processuais).

Para tanto, o cadastro tornou-se obrigatório para a União, estados, Distrito Federal, municípios, entidades da administração indireta e para as empresas públicas e privadas (artigo 15 da Resolução CNJ 455 de 27/4/22). As pessoas jurídicas de direito privado tinham que se cadastrar até 30 de maio de 2024.

A Advocacia-Geral da União e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional têm entre 1º de julho de 2024 e 30 de setembro de 2024. E todas as demais pessoas jurídicas de direito público têm entre 1º de outubro de 2024 e 19 de dezembro de 2024 (artigo 1º da Portaria CNJ 46 de 16/2/24). Com relação às pessoas físicas, o cadastro é facultativo e sem data limite.

Ocorre que essa novidade acendeu um sinal de alerta aos departamentos jurídicos das empresas privadas e aos advogados de forma geral, à medida, em que se tratando de novidade, não é raro que alguns tribunais encaminhem todas as comunicações processuais, inclusive em relação àqueles processos que já possuem advogados constituídos, via domicílio judicial eletrônico. No entanto, o principal objetivo da criação do domicílio judicial eletrônico era o envio de citações e intimações pessoais, nos termos do artigo 16 da Resolução CNJ 455 de 27/4/22 [1].

Problemas em prazos processuais

Para além da insegurança jurídica, anteriormente, o principal problema dos tribunais ao utilizarem o domicílio judicial eletrônico para comunicar todos os atos processuais é que a própria parte cadastrada tinha a possibilidade de tomar ciência de determinada intimação, antes mesmo do próprio advogado constituído nos autos, o que poderia ocasionar eventuais perdas de prazo, pois sequer o advogado constituído teria pleno controle sobre isso.

Diante desse cenário, a OAB requereu junto ao CNJ “supressão da possibilidade de as partes abrirem intimações destinadas aos advogados constituídos pelo Domicílio Judicial Eletrônico” [2]. E foi então aprovada a Resolução CNJ 569 de 13/8/24, a qual consignou que “o Domicílio Judicial Eletrônico será utilizado exclusivamente para citação por meio eletrônico e comunicações processuais que exijam vista, ciência ou intimação pessoal da parte ou de terceiros, com exceção da citação por edital, a ser realizada via DJEN” (artigo 18 da Resolução CNJ 455 de 27/4/22).

Assim, para fins de contagem de prazos processuais que não exijam intimação pessoal, será considerado a partir da publicação no Diário de Justiça Eletrônico Nacional (DJEN), nos termos do artigo 11, §3º da Resolução CNJ 455 de 27/4/22.

Spacca

Conscientização da sociedade

Contudo, fato é que para o bom funcionamento do domicílio judicial eletrônico, dependeremos da conscientização da sociedade e dos empresários que, às vezes, sequer possuem um jurídico interno atento a tais inovações e obrigações. Daí porque surge o questionamento: o intuito de modernizar o sistema envolvendo o Poder Judiciário estaria em harmonia com desburocratização do acesso à Justiça e a facilitação das pessoas ao Poder Judiciário, que tanto defendia Ada Pellegrini Grinover e Kazuo Watanabe?

Afinal, segundo lição de Kazuo Watanabe, que cunhou a expressão, nessa visão mais ampla, o efetivo acesso à Justiça depende de múltiplos fatores, como por exemplo: “(i) a organização judiciária adequada à realidade do país, com sua modernização e realização de pesquisa permanente para o conhecimento dessa realidade e dos conflitos que nela ocorrem (…) (vi) remoção dos diferentes obstáculos (econômico, social, cultural, e de outras espécies) que se anteponham ao acesso à ordem jurídica justa” [3].

De todo modo, não se nega que se trata de importante mudança que tenderá a ser observada e incorporada no dia a dia pelos operadores do direito, a fim de que seja possível, em um futuro próximo, harmonizar as inovações promovidas pelo CNJ, resguardando a segurança jurídica daqueles que litigam nessa seara e, sobretudo, o acesso à justiça.


 “O cadastro no Domicílio Judicial Eletrônico é obrigatório para a União, para os Estados, para o Distrito Federal, para os Municípios, para as entidades da administração indireta e para as empresas públicas e privadas, para efeitos de recebimento de citações e intimações, conforme disposto no art. 246, caput e § 1o, do CPC/2015, com a alteração realizada pela Lei no 14.195/2021”.

 Confira-se: https://www.oab.org.br/noticia/62389/cnj-atende-oab-e-determina-correcao-e-suspensao-do-domicilio-judicial-eletronico

 Cf. Ada Pellegrini Grinover. Ensaio sobre a processualidade: fundamentos para uma nova teoria geral do processo. Brasília, Gazeta Jurídica, 2018, pp.75-76.



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