As recentes declarações de Luciana Gatti, uma das coordenadoras do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), causaram indignação no setor agrícola do país. No último domingo, 15, ela disse, em entrevista ao canal GloboNews, que os “agricultores causam as queimadas para melhor colher a cana-de-açúcar”.
“Os plantadores o fazem para deixar a colheita mais barata”, afirmou. Ainda segundo ela, os agricultores coordenam a ação com o objetivo de “desgastar o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva”. Ela, no entanto, não apresentou quaisquer evidências que sustentassem tais afirmações.
Instituições se manifestaram depois de declaração sobre as queimadas
Um dia depois das declarações, a Organização de Associações de Produtores de Cana do Brasil (Orplana) divulgou uma nota em que afirma serem “falsas e infundadas” as declarações de Luciana. “Demonstram, inclusive, profundo desconhecimento sobre o tema.”
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A instituição também afirma que o setor está “firmemente comprometido com a sustentabilidade e a preservação do meio ambiente”.
Prejuízos na agricultura
Atualmente, a Orplana representa 35 associações de fornecedores e mais de 12 mil produtores de cana-de-açúcar no país. Ao todo, os agricultores do setor tiveram um prejuízo de 1,2 bilhão por causa dos incêndios florestais que se alastram por boa parte do Brasil.
A Orplana não foi a única instituição a se manifestar contra as declarações da coordenadora do Inpe. A União de Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica), por sua vez, solicitou à GloboNews o direito de resposta depois da fala de Luciana. A emissora concedeu.
Em entrevista ao canal, o presidente da Unica, Evandro Gussi, rebateu as denúncias do Inpe sobre as queimadas. De acordo com ele, “a queima da palha da cana como método de colheita foi banida há mais de dez anos”. “Quando a cana está queimada, isso representa um grave prejuízo para o setor sob várias perspectivas.”
Além disso, Gussi afirmou que “a cana queimada atrapalha a colheita”. “Hoje, o fogo no canavial representa prejuízo.”
Ex-ministro critica as declarações da coordenadora do Inpe
Antônio Cabrera Mano Filho, ministro da Agricultura durante o governo de Fernando Collor, classificou como “aberração” as declarações de Luciana. De acordo com ele, a denúncia não tem “nenhum embasamento científico e é totalmente contrária sobre como a verdadeira ciência realmente funciona”.
Cabrera também criticou a “centralização governamental da ciência”. Ele afirmou que isso “destrói o espírito da própria ciência”.
“Hoje, com raríssimas exceções de áreas de pequenos produtores com grande declividade, ninguém ‘taca fogo’ em cana”, afirmou o ex-ministro da Agricultura. “O produtor sabe que a palha traz inúmeros benefícios agrícolas, ajuda a evitar erosão, provê nutrientes para o solo e preserva sua umidade.”
Ele ainda disse que, “em uma plantação de cana queimada, tem de se colocar mais adubo”. “E como é quase impossível fazer um corte rápido em grandes áreas que foram incendiadas, ocorre uma grande perda de açúcar.”
Ou seja, conforme Cabrera, “cada palha queimada significa uma renda menor na venda de energia pela maioria das usinas que fazem a cogeração”.
“Sempre tive o sentimento de que a ciência nunca está resolvida”, afirmou. “Até porque a ciência não é uma coleção de verdades. Ela é e sempre será uma exploração contínua de novas descobertas.”
Declaração sobre queimadas “digna de um militante partidário”
Cabrera ainda disse que a declaração da coordenadora do Inpe foi “digna de militante partidário. De acordo com ele, a postura de Luciana na entrevista à GloboNews “reforça aquele sentimento de nunca confiar cegamente em especialistas”.
“Isso não é informação técnica. Mas tem consequências desastrosas para o nosso agro.”
“Eu mesmo não aceito ‘ciência’ de uma pessoa que afirma que o produtor paulista ‘taca fogo em cana para colher’”, afirmou o ex-ministro. “Isso não é informação técnica. Mas tem consequências desastrosas para o nosso agro. Temos que ter cuidado com esse tipo de conhecimento falso, pois ele é mais perigoso do que a ignorância.”