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Empresa que recolhe dados da íris a troco de criptomoedas voltou ao ativo

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As portas da loja estão abertas numa rua de Lisboa, com letreiros bem visíveis à entrada onde se pode ler a palavra World. Quem lá entra normalmente já sabe ao que vai: encosta os olhos a uma máquina leitora da íris, que fotografa também o rosto, permitindo a recolha de dados biométricos que depois servirão para provar que é o humano correspondente quando realizar transações financeiras na aplicação World App, que logo ali é descarregada no telemóvel do interessado, recebendo, imediatamente 50 wordcoins, a criptomoeda criada pela mesma empresa.

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Em março de 2024, a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) decidiu suspender o exercício da atividade à então Worldcoin. O argumento foi o de que o recurso à biometria poderia pôr em causa a salvaguarda dos direitos à proteção de dados pessoais. Um ano depois, a agora World volta ao ativo.

A empresa, com sede na Alemanha, chegou a Portugal em 2022, lançada pela Tools for Humanity (TFH) – cofundada pelo CEO da OpenAI, Sam Altman, o criador do ChatGPT – e logo começou a usar a biometria de íris para verificação de identidade digital. O objetivo seria criar o maior ecossistema de cripto de sempre, pretendendo-se posicionar como incubadora de um novo sistema financeiro global.

De repente, em vários centros comerciais portugueses viram-se filas de pessoas em frente às bancas da World, estrategicamente colocadas. Muitos dos interessados seriam menores, segundo denúncias enviadas à CNPD em 2023. Os funcionários da ‘ofereciam’ 10 worldcoins a troco da íris, que poderia ser convertida em dinheiro e transferida para as contas bancárias pessoais. À época equivaleria a cerca de 78 euros. Era-lhes dito que a leitura da íris seria o garante que cada utilizador é um indivíduo de carne e osso.

Sendo a íris um dado único e imutável da pessoa, elemento crucial da identidade e da privacidade, com a qual é possível, por exemplo, criar identidades falsas, a CNPD recebeu várias denúncias e abriu um processo de averiguações. Em março de 2024, à semelhança do que também aconteceu em Espanha, decidiu que a World teria de suspender a atividade em Portugal até apuramento de todos os factos.

Depois desta deliberação, que acatou, a World Foundation, representante legal da World, juntou ao processo documentos para demonstrar que a empresa tem estabelecimento na União Europeia, em concreto, a ZipCode GmbH, em Erlangen, no Estado da Baviera, na Alemanha.

Em julho de 2024 a CNPD deliberou que competência para analisar o processo recaia sobre a Autoridade bávara (BayLDA) que, a 19 de dezembro de 2024 , concluiu sobre a conformidade da World com o Regulamento Geral de Proteção de Dados da União Europeia. A autoridade alemã ordenou à World que, no período um mês, implementasse um procedimento que permitisse apagar os dados biométricos. «Todos os utilizadores que disponibilizaram os seus dados da íris à World terão, no futuro, a possibilidade ilimitada de ver implementado o seu direito ao apagamento», afirmou então o presidente da BayLDA, Michael Will.

Assim, a World regressou a Portugal com a garantia de que a criptografia das imagens do rosto e olhos ficam apenas armazenados no telemóvel onde a App é descarregada, levando apenas alguns segundos a ser apagada. «Cada código da íris é diferente e não revela nenhuma informação pessoal», diz a World. A empresa assegura também que não vende, nem venderá, os dados pessoais ou biométricos e que todos são encriptados de forma segura.

A DECO proteste foi uma das entidades que alertou a CNPD. «Parece-nos que o valor que se pode receber não compensa os problemas que esta venda pode eventualmente trazer no futuro», lê-se no texto enviado à CNPD. Já a iniciativa Cidadãos pela Cibersegurança alertou que há o risco muito sensível de que a worldcoin seja um esquema Ponzi, onde os novos utilizadores pagam os antigos. E afirma: «O valor real da worldcoin reside nos seus dados biométricos, que podem ser vendidos a terceiros para fins lucrativos.»

O Nascer do SOL enviou um e-mail à World Foundation com várias questões, mas sem qualquer resposta até ao fecho desta edição. O Banco de Portugal e a PGR também não responderam. Apenas a Polícia Judiciária informou que nenhuma investigação existe envolvendo a World.

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