“Enquanto o governo federal não agir, a cultura da sonegação continuará trazendo prejuízos bilionários ao país”, afirma AMIG



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Mesmo com prejuízos bilionários, o governo federal continua fechando os olhos para a cultura da sonegação que permeia a atividade mineral no Brasil. Segundo auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), publicada no último dia 28 de agosto, entre 2014 e 2021, 70% dos títulos minerários deixaram de pagar os “royalties” de mineração. Entre aqueles que pagaram, de 2017 a 2022, houve uma média de 40,2% de sonegação.

A auditoria foi realizada em razão de riscos, impropriedades e irregularidades constatados pelo TCU e pela Controladoria Geral da União (CGU). Esse trabalho vem sendo desenvolvido ao longo dos últimos anos. A área técnica do TCU, responsável pelo relatório, afirmou que “a incapacidade de análise do passivo processual já existente na Agência Nacional de Mineração (ANM), de aproximadamente 12.243 processos de cobrança da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), implica o potencial risco de prescrição de aproximadamente R$ 20 bilhões já lançados e pendentes de constituição.”

Os números assustadores reforçam os pleitos que, há décadas, a Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais e do Brasil (AMIG) defende para acabar com a prática da autofiscalização e da autorregulamentação adotadas pelas empresas mineradoras. A associação já se posicionou dezenas de vezes cobrando uma atuação mais firme no Congresso Nacional, no Governo Federal e na própria ANM.

“A AMIG completou, neste ano, 35 anos de fundação e o que temos visto é que o Brasil, nas últimas décadas, relegou a atividade de mineração a segundo plano. Temos uma agência mineradora sem estrutura e sem pessoal para executar seu papel fiscalizador e regulador, o que propicia o crescimento de escândalos e catástrofes no setor”, destaca o presidente da AMIG, José Fernando Aparecido de Oliveira.

Em 2022, a ANM fiscalizou apenas dezessete empresas de mineração, sendo que há 39.024 processos ativos na fase de lavra naquele ano. No período de 2017 a 2021, foram fiscalizados apenas 1,1% de 6.154 processos ativos na fase de concessão de lavra sem pagamentos da CFEM associados a eles e somente dois dos 1.163 processos ativos de autorização de pesquisa com guia de utilização emitida.

A AMIG tem apontado que os sistemas atuais da ANM não permitem o acompanhamento da real produção mineral fiscalmente escriturada, não sendo possível ter conhecimento do quanto se deixa de arrecadar e do valor monetário submetido ao risco de decadência.

Na auditoria realizada pelo TCU estimou-se que, no período de 2014 a 2021, a arrecadação poderia ter sido entre 30,5% e 40,2% superior, o que representa uma receita potencial da CFEM não arrecadada na faixa entre R$ 9,38 bilhões e R$ 12,35 bilhões, no mesmo período, enquanto a arrecadação do royalty, em 2021, foi de R$ 10,3 bilhões.

O setor de mineral lida com grandes margens de lucro, o que pode criar uma pressão intensa para maximizar os ganhos. Segundo a AMIG, isso pode levar algumas empresas a buscar formas de reduzir custos de maneira não ética, incluindo a sonegação fiscal e a evasão de regulamentações. A associação ressalta que a mineração é um setor com operações complexas e frequentemente em regiões remotas. A falta de transparência nas operações e nas transações financeiras facilita as práticas de sonegação e evasão fiscal.

“Sistemas de tecnologia da informação obsoletos e limitados, quadro de pessoal reduzido e insuficiência de acordos de cooperação com a Secretaria da Receita Federal e secretarias de fazenda estaduais são as principais causas que levam à subarrecadação de receitas minerárias e à decadência e prescrição dos respectivos créditos”, destaca a AMIG.

A associação alerta que a sonegação da CFEM e a decadência e prescrição de créditos dela decorrentes prejudicam a União, os estados/Distrito Federal e municípios produtores e afetados, incluindo a própria ANM, que poderiam se beneficiar de bilhões de reais a mais por ano em arrecadação.

Calote da Vale S/A – Desde agosto de 2022, a associação tem realizado uma campanha nacional cobrando uma dívida bilionária da Vale S/A com 28 cidades brasileiras, que ultrapassa R$ 2,4 bilhões, referente ao não pagamento dos royalties de mineração por parte da mineradora. A dívida se refere a um período de quase 20 anos de exploração.

A dívida foi auditada pela ANM, na época pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). “É um montante que foi apurado de 1996 a 2005; ou seja, daqui a dois anos, a dívida vai completar 30 anos”, afirma Waldir Salvador, consultor de Relações Institucionais e Econômicas da AMIG. “Fomos à Vale inúmeras vezes para dialogar. A justiça derrotou, por 13 vezes em primeira instância e uma vez em segunda instância, a tese que a Vale defende para não pagar o royalty da mineração. E já perdeu todas as vezes, administrativamente. Inclusive, a dívida foi ratificada em um grupo de trabalho em 2018, formado pelas prefeituras e pela ANM, a pedido da própria Vale”, enfatiza.

Reunião entre a AMIG e ANM

No dia 26 de agosto, a associação teve uma reunião com a superintendência de arrecadação da ANM, que contou com a participação do corpo técnico das duas entidades. Na ocasião, foram apresentadas várias sugestões à agência para trabalho em conjunto em pleitos que visam garantir uma atividade mineral segura e justa para o lado público e privado da mineração.

A agência mostrou que está em processo de reestruturação e que novas resoluções serão publicadas a partir de outubro deste ano, com o objetivo de melhorar a eficácia da fiscalização e o aperfeiçoamento dos sistemas. Além disso, foi informado que, até dezembro desse ano será publicado o edital do concurso e a nomeação dos novos servidores deverá ocorrer em outubro de 2025, e a agência ganhará um reforço no quadro de funcionários que atuarão na fiscalização.

Hoje, há apenas três fiscais responsáveis pela fiscalização do pagamento da CFEM em todo o Brasil. “Essa situação é insustentável e, se persistir, vai destruir a atividade mineral. A ANM precisa estar no patamar das demais agências reguladoras federais. Afinal, a mineração representa 4% do PIB do Brasil. Dessa forma, o país permitirá que ela se estruture, modernize, execute seu planejamento estratégico e, como consequência, teremos o crescimento da arrecadação, a diminuição ou quem sabe até a erradicação da cultura permanente de sonegação, da falta de transparência, da evasão fiscal, da corrupção e do desrespeito às normas ambientais predominantes na atividade de mineração”, alerta Waldir Salvador.

 

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LORRAINE GABRIELLE SILVEIRA SOUZA
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