Governo fala em soberania digital ao propor tecnologia própria de Inteligência Artificial

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Redação Rádio Pampa

| 11 de agosto de 2024

O Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (PBIA), batizado de IA para o Bem de Todos e apresentado ao governo federal pelo Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT), coloca a inteligência artificial (IA) como um passo fundamental para o País alavancar áreas como economia, saúde, educação e meio ambiente. O domínio nacional dessa tecnologia, diz o documento, pode ajudar o Brasil a chegar à soberania digital.

O PBIA estipula que o Brasil deve desenvolver sua própria tecnologia de IA, desde a estruturação dos bancos de dados utilizados para treinar as máquinas até o desenvolvimento de centros de dados (data centers) e de um supercomputador nacionais. O plano espera tornar o País mais independente de tecnologias estrangeiras, hoje em sua maior parte vindas dos EUA.

O conceito de soberania digital vem sendo utilizado pela União Europeia e por países como China, Chile e Rússia, além do Brasil, para serviços de infraestrutura considerados críticos para o desenvolvimento de uma nação.

Exemplo recente disso foi a pane na CrowdStrike, empresa americana de cibersegurança que teve de consertar, às pressas, uma atualização defeituosa que paralisou 8,5 milhões de computadores Windows, instantaneamente, por todo o mundo – hospitais tiveram de suspender cirurgias, aeroportos cancelaram voos e bancos não conseguiam operar.

“O Plano de IA (do Brasil) tenta compensar o problema da infraestrutura física digital, promovendo investimentos em data centers, e investimento em capacitação de profissionais de tecnologia”, diz Jaqueline Trevisan Pigatto, coordenadora de governança e regulação da organização Data Privacy Brasil.

Nuvem

Um dos aspectos do PBIA é a criação de uma nuvem brasileira, na qual informações essenciais e sensíveis de cidadãos brasileiros possam ser armazenadas e processadas numa estrutura física em território nacional. Atualmente, dados do sistema do governo (gov.br) são alocados na Amazon Web Services (AWS), serviço de nuvem da Amazon.

Para o advogado Luca Belli, professor de Direito na Fundação Getulio Vargas do Rio (FGV-Rio), estruturar um serviço de nuvem nacional “é um caminho lento, mas não impossível”. Ele frisa que, quando se fala em soberania digital, não se trata de se isolar tecnologicamente, e sim criar escolhas.

“Criar uma nuvem brasileira é uma demanda mais do que justa”, diz Belli, coordenador do CyberBrics, centro de pesquisa da FGV que estuda políticas de cibersegurança com foco nos países do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). “Não é como fechar fronteiras ou proibir o uso de AWS, Microsoft Azure e Google Cloud (as três maiores companhias de nuvem do mundo), mas sim dizer que há alternativas.”

Juntas, essas três corporações americanas têm mais de 60% do mercado de nuvem global, segundo dados da consultoria Synergy Research Group.

Espionagem

A soberania digital não é um assunto novo no Brasil. Mas o conceito ganhou força em 2013, quando o americano Edward Snowden revelou, por meio de documentos vazados, que a agência nacional de segurança dos EUA utilizava estrutura de telefonia e de internet para espionar países, inclusive aliados como o Brasil.

Jaqueline Pigatto, da Data Privacy Brasil, afirma que o escândalo tornou o País um dos pioneiros nas legislações sobre direitos digitais. Primeiro, com o Marco Civil da Internet, de 2014. Depois, com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), de 2018. E, agora, com as discussões sobre uma regulamentação da IA no Congresso.

Além disso, o Pix, sistema de pagamentos instantâneos implementado em 2020, é um exemplo “fantástico” de soberania digital no Brasil, diz Luca Belli, da FGV. “Antes, o Brasil era refém de Visa e Mastercard para pagamentos digitais, processados por duas empresas estrangeiras. Elas tinham o duopólio da coleta de dados dos indivíduos e de todas as empresas que vendem qualquer produto. O Pix destruiu essas empresas? Não. Mas criou alternativas.”

Belli acrescenta, no entanto, que implementar softwares, como o Pix, é mais simples do que investir em centros de dados ou num supercomputador, que demanda capacidade técnica de hardware. E que outras ações de soberania digital devem ser observadas, como gestão de dados, criação de algoritmos próprios, conectividade, capacidade computacional, eletricidade, cibersegurança e capacitação e regulação de riscos. “A lei, sozinha, não serve para nada. Ela precisa ser acompanhada de todos os elementos que compõem a soberania digital. Do contrário, pode ser só fachada.”

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