O governo do presidente Lula (PT) lançou uma ofensiva na última semana para responder à proliferação dos incêndios florestais. O Planalto abriu os cofres, tenta articular e dividir a responsabilidade com os estados e faz novas promessas.
Cobrado por ações concretas diante da proliferação de imagens trágicas das queimadas, o governo organizou uma semana com anúncios e reuniões. Acabou, no entanto, com menos efeito prático que o esperado.
Os episódios também viraram munição política, com troca de acusações entre governo e oposição, sobretudo nos estados.
Tudo acontece às vésperas da Assembleia Geral da ONU, em Nova York, onde Lula pretende levar um discurso em defesa de ações práticas para a crise climática.
Por vezes considerada uma ilha, isolada dos problemas do Brasil, a capital federal se viu atingida pelas queimadas no Parque Nacional de Brasília. A cidade ficou encoberta por uma densa fumaça, que chegou também na Esplanada dos Ministérios.
No mesmo dia em que a fumaça alcançou o Planalto, o governo organizou uma reunião ampliada com os principais ministros envolvidos no tema.
O governo Lula viu a crise climática cair em seu colo, apesar de a União ser responsável apenas pelas áreas de conservação federais. A gestão petista buscou, então, se articular com outros poderes e entes federados, também numa tentativa de dividir a responsabilidade
Com os chefes de outros poderes, o presidente admitiu que o Brasil não estava 100% preparado para os incêndios. Lula insistiu no caráter criminoso das queimadas, ainda que isso esteja sob apuração.
“O dado concreto é que hoje, no Brasil, a gente não estava 100% preparado para cuidar dessas coisas. As cidades não estão cuidadas. Até 90% das cidades estão despreparadas para cuidar disso. Os estados são poucos os que estão com preparação, que têm defesa civil, bombeiro, brigadistas quase ninguém tem”, afirmou.
A situação das queimadas se agravou nas últimas duas semanas, desafiando o governo a apresentar medidas à altura. A proposta de criação da autoridade climática, uma promessa de campanha, foi desengavetada.
A ideia, gestada no ministério de Marina Silva, conseguiu um timing que ajudasse a aprovar a medida no Congresso Nacional, segundo auxiliares de Lula. Havia uma expectativa no governo de que o projeto possa tramitar rapidamente no Planalto, mas o texto ainda está sob análise da Casa Civil.
No mesmo pacote, o ministério do Meio Ambiente também apresentou o marco regulatório da emergência climática e o plano de prevenção a eventos extremos e o comitê científico sobre o tema.
Um integrante do governo apontou que as queimadas fizeram o núcleo de governo priorizar propostas ambientais que antes não estavam entre as prioridades. No entanto, lamentou que a situação precisasse chegar a este nível para haver sensibilidade de outras esferas da Esplanada.
O governo editou uma medida provisória com a liberação de R$ 514 milhões e ainda fez a promessa de outros desembolsos. Além disso, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) disponibilizará R$ 400 milhões para o apoio aos bombeiros dos estados da Amazônia Legal.
O Ministério da Justiça e Segurança Pública afirma que há 312 bombeiros com atuação em 22 municípios da Amazônia Legal e Pantanal.
A mobilização atende a determinação de Flávio Dino, ministro do STF (Supremo Tribunal Federal). Os recursos também só foram liberados graças ao ex-ministro da Justiça, que autorizou créditos extraordinários fora do limite de gastos do arcabouço fiscal.
Sob pressão, o governo ainda recorreu a outras medidas que estavam paradas, mas que integrantes agora indicam como uma “resposta” para a sociedade. Uma delas é o endurecimento de penas para quem causa incêndios florestais, ação que vinha sendo pedida pela pasta do Meio Ambiente e não encontrava ressonância na Casa Civil.
Apesar do apelo do momento, a medida pode ter poucos efeitos práticos, considerando que o próprio presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), chegou a chamá-la de “populismo legislativo”. Um aliado lembra que o governo costuma lançar pacotes em momentos de crise, mas que as medidas acabam no esquecimento.
No mais recente ato desta ofensiva, o governo editou duas medidas na sexta (20): para aumentar multas por incêndios e flexibilizar repasse aos estados para combate a queimadas.
A gestão Lula pretendia repetir o mesmo clima cordial da reunião anterior com os governadores, mas acabou por promover um palanque privilegiado para críticos. Após uma reunião com o ministro Rui Costa (Casa Civil), o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, acusou a União de ter procrastinado na crise das queimadas.
Caiado é um dos nomes que tenta construir uma candidatura de oposição a Lula em 2026 e disputa o eleitorado do bolsonarismo.
Mas ele não foi o único a criticar. “Não posso dizer que o governo federal está agindo tardiamente. Essa reunião está acontecendo, ela é bem-vinda, mas eu disse que, na minha opinião, seus efeitos concretos e mais objetivos vão acontecer para o ano de 2025”, afirmou o governador do Mato Grosso, Mauro Mendes (União Brasil).
As queimadas também viraram motivo para acusações sem provas, ataques e revanchismos. Os bolsonaristas encontraram na crise climática atual a oportunidade de rebater críticas recebidas durante as queimadas do Pantanal, em 2020.
Jair Bolsonaro (PL) publicou em suas redes sociais cenas de queimadas. O seu antigo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, culpou os pequenos agricultores ligados ao MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).
Lula, por sua vez, também sugeriu que a oposição e seus aliados estavam por trás dos incêndios. O petista disse que “uma pessoa muito importante” na convocação dos atos do 7 de Setembro na avenida Paulista havia indicado que botaria “fogo no Brasil”.