BRASÍLIA – O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) encaminhou nesta sexta-feira, 30, ao Congresso Nacional um projeto de lei que eleva a alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), um tributo cobrado sobre o lucro das empresas, e a do Imposto de Renda incidente sobre os Juros sobre Capital Próprio (JCP), um tipo de remuneração paga pelas companhias aos seus acionistas.
O objetivo é arrecadar R$ 21 bilhões no próximo ano, quando o Executivo se comprometeu com a meta de déficit zero. O aumento da CSLL, como antecipou o Estadão, será restrito a 2025, enquanto que a alteração no JCP será permanente – ou seja, sem data delimitada no projeto de lei.
Dentre as empresas, a medida tributária será sentida, principalmente, pelos bancos, que terão uma elevação de dois pontos porcentuais na alíquota da CSLL: passando de 20% para 22%.
Já a cobrança sobre as companhias financeiras não bancárias será elevada em um ponto porcentual (de 15% para 16%), assim como a das demais companhias (de 9% para 10%). A expectativa é de que essas elevações rendam R$ 14,9 bilhões em 2025 e um residual de R$ 1,3 bilhão em 2026.
Em relação ao JCP, a proposta do governo é de que a alíquota do Imposto de Renda passe de 15% para 20% – o que renderia, segundo o projeto de lei, R$ 6 bilhões em 2025, R$ 4,99 bilhões em 2026 e R$ 5,3 bilhões em 2027. Os valores dos demais anos não foram estimados no texto.
O projeto foi enviado ao Congresso em regime de urgência constitucional, que impõe à Câmara e ao Senado o prazo de 45 dias para a deliberação da proposta, sob pena de trancamento da pauta. A justificativa do presidente Lula é de que as medidas “são relevantes para o resultado fiscal e o equilíbrio das contas públicas e serão consideradas nas projeções de receitas” do Orçamento de 2025.
O governo também pondera que precisa seguir os princípios da anterioridade nonagesimal (só cobrar o novo tributo após 90 dias da publicação da lei, no caso da CSLL) e anual (a partir do exercício seguinte, no caso do JCP).
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já havia anunciado na semana passada que o governo iria encaminhar junto ao Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2025 proposta prevendo aumento das alíquotas da CSLL e da tributação sobre o JCP.
Segundo afirmou na ocasião, as medidas servirão como uma espécie de garantia caso as propostas aprovadas pelo Senado não sejam suficientes para compensar a desoneração da folha das empresas e dos municípios no ano que vem.
“O combinado com o Senado é que, se as medidas anunciadas pelos senadores não forem suficientes, a lei orçamentária tem de prever quais seriam, para os anos seguintes, as medidas compensatórias da desoneração (da folha das empresas e dos municípios)”, disse Haddad na semana passada.
“Então, isso vai ser encaminhado, não como medida provisória, mas como projeto de lei — e (as medidas) podem vir a não ser aprovadas se as projeções (de arrecadação extra) do Senado se confirmarem. Vamos encaminhar só as medidas que eventualmente tenham de ser aprovadas até o fim do ano caso a estimativa do Senado não se concretize”, enfatizou.
O projeto, porém, deverá enfrentar resistências no Congresso. Nas últimas semanas, líderes partidários firmaram o entendimento de que aumento de tributos como contrapartida à desoneração significará dar “com uma mão e tirar com outra”. Eles alegam que o Parlamento já cumpriu o seu papel na recomposição da base tributária e, por isso, defendem que o foco, agora, seja na revisão mais efetiva de gastos.
O PLOA de 2025 será encaminhado nesta sexta-feira ao Congresso com a previsão de pente-fino em benefícios sociais e previdenciários, mas sem mudanças estruturais nos gastos obrigatórios – que vêm pressionando o arcabouço fiscal.
Está prevista para esta sexta a divulgação de um sumário-executivo com os principais números do projeto. A entrevista coletiva para detalhar o texto, no entanto, só ocorrerá na segunda-feira, 2, às 11h.
Fim de benefício fiscal para bebidas
O governo também usou o projeto de lei para revogar um dispositivo que permitia abatimento de créditos de PIS/Cofins (tributos federais) de empresas do setor de bebidas, segundo determinação do Tribunal de Contas da União (TCU), que exigiu o religamento do Sistema de Controle de Bebidas (Sicobe) num prazo de 60 dias. O objetivo do Executivo é evitar uma alta do gasto tributário (ou seja, renúncia de receita) no valor de R$ 1,8 bilhão por ano.
O Sicobe, que vigorou entre 2009 e 2016, era um sistema de controle de produção industrial, compulsório para fabricantes de águas, refrigerantes e cervejas, que gravavam um tipo de selo digital, com tinta especial, em cada embalagem de bebida.
Esse sistema era operacionalizado pela Casa da Moeda. Posteriormente, ele foi substituído por um mecanismo em que as próprias empresas declaravam a produção – o chamado Bloco K do Sistema de Escrituração Pública Digital. Duas decisões administrativas de 2016, porém, descontinuaram o sistema, sob alegação do alto custo de manutenção.
Com a decisão do TCU, a retomada do Sicobe implicaria a retomada do recolhimento de uma taxa pela utilização do selo, que permite abatimento de Pis/Cofins, como ocorre com empresas de cigarro. Hoje, o fluxo funciona da seguinte forma: a empresa paga essa taxa à Receita; o Tesouro então repassa o valor à Casa da Moeda, a qual usa o recurso para pagar os fornecedores do selo.
O pagamento dessa taxa permite que a empresa tenha um abatimento tributário. Só que o projeto do governo revoga exatamente essa possibilidade de as empresas abaterem integralmente o valor do PIS/Cofins devido.
“A revogação do dispositivo tem por objetivo evitar o aumento do gasto tributário decorrente da dedução nele prevista como crédito presumido, cujo custo estimado é de R$ 1,8 bilhão por ano“, diz o texto do projeto enviado ao Congresso.
“Esse montante é suficiente, por exemplo, para custear integralmente os sistemas informatizados da Receita Federal, necessários à arrecadação tributária e previdenciária federal, que incluem a gestão do comércio exterior e dos principais cadastros informatizados do País, cujo custo de manutenção estimado é de R$ 1,7 bilhão por ano”, complementa o texto.
O que é a desoneração da folha?
A desoneração da folha de pagamentos das empresas foi instituída em 2011 para setores intensivos em mão de obra. Juntos, eles incluem milhares de empresas que empregam 9 milhões de pessoas.
A medida substitui a contribuição previdenciária patronal de 20% incidente sobre a folha de salários por alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta. Ela resulta, na prática, em redução da carga tributária da contribuição previdenciária devida pelas empresas.
Por decisão do Congresso, em votações expressivas, a política de desoneração foi prorrogada até 2027, mas acabou suspensa por uma decisão liminar do STF em ação movida pelo governo. A alegação é que o Congresso não previu uma fonte de receitas para bancar o programa e não estimou o impacto do benefício nas contas públicas.
O Legislativo, porém, argumenta que medidas foram aprovadas para aumentar as receitas da União e que a estimativa de impacto estava descrita na proposta aprovada. O ministro da Fazenda anunciou, então, um acordo para manter a desoneração em 2024 e negociar uma cobrança gradual a partir do próximo ano.
A proposta foi aprovada pelo Senado em agosto e agora será analisada pela Câmara dos Deputados.
Ela vale para 17 setores da economia. Confira abaixo quais são:
- confecção e vestuário
- calçados
- construção civil
- call center
- comunicação
- empresas de construção e obras de infraestrutura
- couro
- fabricação de veículos e carroçarias
- máquinas e equipamentos
- proteína animal
- têxtil
- TI (tecnologia da informação)
- TIC (tecnologia de comunicação)
- projeto de circuitos integrados
- transporte metroferroviário de passageiros
- transporte rodoviário coletivo
- transporte rodoviário de cargas