O governo federal concentrou a economia com a revisão dos gastos públicos em 2025 nos benefícios previdenciários e no Benefício de Prestação Continuada (BPC), duas despesas obrigatórias que vêm subindo ininterruptamente. Dos R$ 25,9 bilhões previstos em corte de gastos no ano que vem, R$ 6,4 bilhões são referentes ao BPC e R$ 10,5 bilhões de benefícios pagos pelo INSS, incluindo o auxílio-doença (hoje auxílio por incapacidade temporária).
O Bolsa Família vai contribuir com R$ 2,3 bilhões e gastos com pessoal, com R$ 2 bilhões — nesses pontos, o governo tem chamado de reprogramação orçamentária, porque se trata de uma iniciativa interna dos órgãos. Já o Proagro deve dar contribuição de R$ 3,7 bilhões e o Seguro Defeso, de R$ 1,1 bilhão. Os dados foram detalhados nesta quarta-feira pela equipe econômica.
No caso do INSS, a economia vem com a implementação do Atestmed, sistema on-line que dispensa a perícia presencial para a concessão do auxílio-doença, e da adoção de medidas cautelares e administrativas. O Atestmed gera economia porque dispensa pagamentos atrasados por demora em perícia, por exemplo.
Em relação ao Bolsa Família, o secretário de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas e Assuntos Econômicos, Sérgio Firpo, explicou que, devido a ações internas do Ministério de Desenvolvimento Social, o orçamento do programa em 2025 será o mesmo de 2023, de R$ 166,3 bilhões. Na última avaliação do orçamento deste ano, a previsão para 2024 era de R$ 168,6 bilhões.
— Os R$ 25,9 bilhões são, para simplificar, um corte de gastos. Caso a gente não tivesse feito esse esforço, teria R$ 25,9 bilhões a mais de despesas no Orçamento. Trata-se sim de corte de gastos. Não estamos acabando com um programa como um todo, mas, dentro dos programas existentes, estamos fazendo esforço para revisar cada um dos itens para que, de fato, a gente economize R$ 25,9 bilhões no ano que vem — disse o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan.
Veja as áreas atingidas:
- Benefício de Prestação Continuada (BPC) / CadÚnico desatualizado: R$ 4,3 bilhões
- Benefício de Prestação Continuada (BPC) / Reavaliação Pericial: R$ 2,1 bilhões
- INSS / Atestmed: R$ 6,2 bilhões
- INSS / Medidas Cautelares e Medidas Administrativas: R$ 1,1 bilhão
- Reavaliação Benefícios por Incapacidade: R$ 3,2 bilhões
- Bolsa Família: R$ 2,3 bilhões
- Pessoal: R$ 2 bilhões
- Proagro: R$ 3,7 bilhões
- Seguro defeso: R$ 1,1 bilhão
Segundo Durigan, algumas medidas vão ser acompanhadas de modificações legislativas para dar mais segurança jurídica ao governo, como é o caso de medidas cautelares e medidas administrativas relativas aos benefícios previdenciários. O secretário explicou que as mudanças já estão presentes no projeto de compensação de desoneração da folha de pagamento, discutido no Congresso, e que não devem ser enviadas novas medidas ao Legislativo.
A economia com o seguro defeso (pago a pescadores artesanais durante períodos em que não pode pescar) também contará com um ajuste para endurecer as regras, com expectativa de redução de 20% dos benefícios pagos atualmente, que giram em torno de 1 milhão por ano, conforme o Ministério do Planejamento.
O plano é parte da solução encontrada para fechar as contas e manter de pé o arcabouço fiscal nos próximos anos. A meta fiscal para 2024 e 2025 é zero, com intervalo de tolerância de 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB).
Atualmente, a projeção para este ano é de déficit primário de R$ 28,8 bilhões, no limite da margem de tolerância. Além disso, R$ 15 bilhões em despesas foram congeladas.
Ministro pôs economia com BPC em dúvida
O ministro Desenvolvimento Social (MDS), Wellington Dias, responsável pelo cadastro dos beneficiários, disse ao GLOBO — em entrevista publicada nesta quarta-feira — que a redução de gastos com o BPC era incerta. O ministro disse que o trabalho de revisão do cadastro já foi iniciado, mas só deve terminar em março de 2025. Até lá, é possível que exclusões de nomes diante da constatação de irregularidades sejam compensadas pela entrada de novos beneficiários, já que o número de requerimentos do auxílio tem aumentado. Segundo ele, por isso, não é possível estimar desde já o resultado a que se chegará.
O secretário de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas e Assuntos Econômicos, Sérgio Firpo, argumentou que a projeção é conservadora. Em relação à reavaliação dos beneficiários do auxílio-doença, iniciada em julho, o secretário explicou que 50% dos pagamentos são cessados logo após a análise, mas até 90 dias depois outros benefícios podem ser cancelados.
— Essa é uma preocupação que todos temos. Sobre a incerteza, toda projeção é incerta, há uma incerteza, a questão é que a gente tem estimativas que são as melhores que conseguimos gerar com base nas informações existentes. A gente acredita que boa parte das evidências trazidas corroboram nossas estimativas — disse.
Guimarães acrescentou que, caso as medidas não sejam suficientes, o governo terá de lançar mão de congelamento do orçamento, como já fez este ano. O secretário ainda destacou que pode ser feito pente-fino em outros programas, além de outros eixos que vão fazer parte do trabalho de revisão de gastos.
— Se não for suficiente, vai acontecer algo semelhante ao que aconteceu este ano, que não é ideal, que é fazer contingenciamento ou bloqueio no orçamento público. Todos queremos que isso não ocorra e então vamos trabalhar para que a revisão seja até maior, para que tenhamos mais discricionárias para fazer políticas públicas — disse.
A revisão do BPC — uma checagem ampla para fechar as portas contra fraudes — passou a ser uma das principais apostas para se chegar ao valor. O BPC é um salário mínimo pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda.
O benefício está na mira do governo porque o número de favorecidos vem aumentando rapidamente desde 2022. De janeiro de 2019 a maio de 2022, houve aumento de 130 mil beneficiários. De lá para cá, o crescimento ultrapassa 1 milhão.
A revisão no BPC vai começar com cerca de 460 mil pessoas que não atualizam o cadastro há bastante tempo, de um total de cerca de 6 milhões de beneficiários. É desse grupo que deve sair o maior número de irregularidades detectadas.
Em média, o índice de fraudes nesses casos gira em torno de 50%, de acordo com o ministro. No caso do BPC, um milhão de beneficiários representa desembolsos de cerca de R$ 16,8 bilhões ao ano.
O pente-fino em programas é considerado o primeiro passo de uma agenda de revisão de gastos do governo. Isso se tornou mais necessário diante do aumento ininterrupto de despesas obrigatórias, como benefícios previdenciários e assistenciais, e da resistência da ala política do governo em fazer mudanças mais estruturais nos gastos, como nas regras dos mínimos constitucionais de saúde e de educação.
— O que temos discutido muito é a revisão vertical, aprofundamento das políticas públicas vigentes para tentar entender se há possibilidade de melhoria. Esse é o foco. Os outros eixos são a integração de políticas públicas, possibilidade de revisão de vinculações e revisão em benefícios tributários — disse o secretário-executivo do Ministério do Planejamento, Gustavo Guimarães.
Firpo afirmou que o debate sobre a integração de políticas públicas, que aperfeiçoa o desenho, evitando desperdícios e aumentando a cobertura, não está interditado.
— É algo que a gente tem discutido e o debate não está interditado, o presidente Lula nos deu essa possiblidade de realizar estudos que serão feitos dentro do ministério e podem ser levados ao Executivo caso seja avaliado que são necessárias — afirmou.
Além do corte de gastos, a equipe econômica vai enviar junto com o orçamento projetos de lei para aumentar a arrecadação no ano que vem com a tributação de Juros sobre o Capital Próprio (JCP) e a CSLL. Essas medidas, porém, podem ser retiradas até o fim do ano, caso o governo verifique que as medidas apresentadas pelo Senado para compensar a desoneração da folha serão suficientes para compensar a perda de receitas.
Para este ano, a Receita Federal estima que a compensação seja de cerca de R$ 26 bilhões. Conforme o projeto de lei, que agora está na Câmara, em 2025 começará uma reoneração gradual.
Segundo o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Duringan, a ampliação do auxílio-gás, anunciada pelo presidente Lula nesta segunda, não irá impactar na economia de recursos com a revisão de benefícios prevista pela equipe econômica para o ano que vem.
— A ideia é fazer esse programa que seja uma aderido por diversas empresas que tenham compatibilidade fiscal, que prevê renúncias, se de fato o projeto for aprovado como foi apresentado, então ele não consome a economia que foi anunciada hoje.
Atualmente, 5,6 milhões de famílias têm o benefício. A ideia é que, a partir de janeiro de 2025, os beneficiários do Bolsa Família possam receber diretamente dos revendedores, botijões de gás de cozinha de graça. Hoje, o benefócio é pago bimestralmente junto com o Bolsa Família como um adicional. Assim, o beneficiário tem liberdade sobre o que fazer com o dinheiro.