governo vai aumentar controle de transações com moedas digitais

O governo pretende lançar ainda neste ano um programa para aumentar o controle sobre a comercialização de criptomoedas, como o Bitcoin, no país. A iniciativa é inspirada na regulamentação de importações vendidas por plataformas de comércio eletrônico por meio do Remessa Conforme.

Lançado no ano passado, o programa, que chegou a isentar de taxa de importação produtos de até US$ 50 declarados, é considerado bem-sucedido pela equipe econômica e, por isso, serve de referência para investidas similares nos próximos meses.

No caso das criptomoedas, ao contrário do cerco às compras de importados pela internet, o que será uma espécie de “Cripto Conforme” não deve contar com redução de impostos para exchanges, como são chamadas as corretoras de criptomoedas. A arrecadação é um dos alvos das regras que estão em discussão internamente no governo e com atores ligados ao setor.

O principal foco é aumentar a visibilidade da Receita sobre as transações com criptoativos que ocorrem no país, por meio da prestação de informações pelas plataformas, até para avaliar se os impostos devidos estão sendo pagos corretamente. A declaração já é obrigatória, mas o Fisco considera que a exigência não tem sido cumprida por algumas empresas do ramo, particularmente as que não têm registro no país.

Por isso, parte da ação consistirá em incentivar as corretoras estrangeiras a abrir empresas no Brasil, o que não é obrigatório. Quem não participar do programa de regularização, terá de enfrentar uma fiscalização mais rígida da Receita, em parceria com o Banco Central (BC), o regulador desse mercado. O acompanhamento das estrangeiras também contará com a ajuda de outros países, considerando que o problema é global.

Segundo o BC, a compra líquida de criptoativos por brasileiros foi de US$ 7,3 bilhões (R$ 40 bilhões no câmbio atual) entre janeiro e maio deste ano. Em 2023, somou US$ 11,2 bilhões (R$ 61 bilhões).

O setor de cripto, que envolve o investimento em moedas digitais, é um dos segmentos na mira do Fisco em virtude da característica do negócio, que demanda um volume grande de remessas para o exterior. O entendimento é de que, em geral, problemas com a Receita nesse trâmite podem ser indícios de lavagem de dinheiro.

As plataformas estrangeiras recebem reais dos investidores e fazem a conversão do dinheiro em outras moedas para que os recursos sejam enviados ao exterior para a aquisição das moedas digitais. Normalmente, usam uma ou mais instituições de pagamento nacionais nessa intermediação.

A Receita acredita que a maioria dos problemas está nessa cadeia. O órgão considera que seu controle sobre as operações de exchanges estrangeiras é limitado. Nas corretoras de criptomoedas sediadas no Brasil, a desconfiança é dissipada.

Isso porque o Fisco tem acesso às informações das operações de compra e venda e pode, assim, conferir se as empresas e os investidores em ativos deste tipo estão declarando e pagando os impostos devidos. Pessoas físicas que investem pelas plataformas têm de pagar Imposto de Renda se houver ganho de capital.

Como o mercado é relativamente novo, as regras da negociação de criptomoedas no país ainda estão em construção. Uma lei de 2022 deu as diretrizes para a regulação, a cargo do BC, mas ainda não foram publicadas as normas específicas. O setor cresce, e as autoridades sabem que há irregularidades ainda não mapeadas.

A sonegação de impostos como o IOF sobre operações de câmbio é uma delas. A Receita suspeita de casos em que plataformas estrangeiras fazem uma intermediação com outra empresa, e o dinheiro nem sai do país. Nesse caso haveria incidência de impostos sobre o faturamento, mas algumas têm conseguido escapar.

Desde o ano passado, a Receita já vem conversando com as associações do setor de criptoativos sobre a necessidade de regularização, nos moldes do que foi feito com o e-commerce.

No caso das “blusinhas”, as empresas que aderiram ao Remessa Conforme passaram a cobrar o imposto dos consumidores no ato da compra, evitando a sonegação e aumentando o controle sobre os produtos que entram no país. Além da taxa de importação (restituída pelo Congresso para artigos de até US$ 50), incide o ICMS estadual.

Para as criptomoedas, não haverá nenhuma mudança no trâmite tributário, só uma aproximação na relação entre o Fisco e as empresas. Em junho, foi formalizado no governo um grupo de trabalho para orientar as exchanges sobre as obrigações tributárias, estruturar a captação de informações sobre depositantes e sacadores das contas das corretoras e estabelecer uma estratégia de atuação em caso de descumprimento das regras.

A ideia agora é avançar para um programa mais estruturado e enviar um recado às empresas do setor para que acelerem a regularização no país. O grupo que está em contato com as exchanges segue o novo modelo de atuação do Fisco, que busca o diálogo com os contribuintes antes de autuá-los.

Uma primeira reunião foi realizada na semana passada com as empresas nacionais e estrangeiras que atuam no setor. O programa deve ser lançado ainda neste ano, segundo integrantes da Fazenda.

Em paralelo a isso, o governo iniciou a adesão ao chamado “Crypto-Asset Reporting Framework (Carf)”, um modelo de intercâmbio de informações entre países, que foi desenvolvido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reúne economias avançadas. Ele tem como objetivo facilitar justamente a fiscalização do setor de cripto diante do seu caráter transnacional.

Uma das maiores corretoras de criptomoedas do mundo, a Binance, que não têm registro no Brasil, afirmou em nota que mantém diálogo constante com autoridades no Brasil e no mundo. Diz que enviou representantes à reunião com a Receita na semana passada.

“A Binance mantém compromisso com o desenvolvimento da indústria de forma sustentável e segura no Brasil e no mundo, atua em conformidade com o cenário regulatório local e seguirá cumprindo as determinações fiscais e legais das autoridades brasileiras que sejam aplicáveis às suas operações.”

A plataforma Bitso informou que tem participado da construção regulatória do setor no país, inclusive em conversas com a Receita. A empresa, porém, já tem CNPJ no Brasil e registro de instituição de pagamento no BC. “Já recolhemos impostos aqui e declaramos as operações realizadas em nossa plataforma”, afirmou, em nota, Thales Freitas, CEO da Bitso Brasil.

A Associação Brasileira de Criptoeconomia (Abcripto) avalia que a iniciativa da Receita não trata de uma questão de incidência tributária, mas de declaração de operações, até mesmo para adequar as regras atuais ao compromisso no Carf, da OCDE.

“A associação entende que essa e todas as discussões que tragam maior segurança regulatória para o segmento cripto são fundamentais para que o mercado brasileiro seja cada vez mais seguro e o país siga sendo referência em segurança jurídica e compliance para todo o mundo”, diz nota da entidade.

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