O juiz Vinícius Paiva Galhardo
apresentou nesta sexta-feira (24), durante o III Congresso Estadual de Inovação
e Empreendedorismo Jurídico – Inova ADV Experience 2025, um panorama das ações
que vêm modernizando o Poder Judiciário de Mato Grosso. O evento, realizado no
Complexo dos Juizados Especiais, em Cuiabá, foi promovido pelo Instituto
Mato-Grossense de Advocacia Network (Iman) e conta com parceria institucional
do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT).
Em sua palestra, o magistrado –
que é cooperado do Núcleo de Justiça Digital de Execução Fiscal Estadual do
TJMT e membro do Laboratório de Inovação do Tribunal de Justiça do Estado
(InovaJus-MT) – propôs uma discussão sobre o tema “Justiça na Era Digital:
Caminhos para um sistema moderno e inclusivo”. A mesa de debates teve como presidente a
promotora de Justiça Fernanda Pawelec Vasconcelos, e como mediadores o juiz
Túlio Duailibi Alves Souza e a magistrada Hanae Yamamura.
O magistrado destacou avanços, em
especial representados pela criação de um banco de jurisprudência próprio do
TJMT, que já reúne mais de quatro mil decisões.
“Estamos criando um banco de
decisões do nosso Tribunal, reunindo entendimentos que refletem a posição
majoritária da Corte. Esse acervo servirá como base para a aplicação uniforme
da lei e para garantir o que buscamos no processo civil: estabilidade e
previsibilidade nas decisões”, explicou Galhardo.
O juiz também apresentou detalhes
sobre o sistema LexIA (Lex, de “lei” em latim, e IA, de inteligência
artificial), ferramenta tecnológica desenvolvida exclusivamente pelo Poder
Judiciário mato-grossense. A plataforma de inteligência artificial utiliza
precedentes do próprio TJMT, do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo
Tribunal Federal (STF) para auxiliar na análise processual.
“A inteligência artificial não é
o fim da Justiça como a conhecemos. É o início de uma Justiça mais humana, uma
Justiça que liberta magistrados das tarefas mecânicas e lhes devolve tempo para
o que é essencial: fazer Justiça com técnica, reflexão e empatia”, afirmou.
De acordo com o magistrado, a
LexIA vem sendo aprimorada pela equipe técnica do Tribunal, com a participação
direta de magistrados e assessores, que criam e validam os “agentes” utilizados
pela IA. A ferramenta já demonstrou resultados expressivos: aumento de 102,5%
na produtividade e redução de cerca de 45% no tempo médio de elaboração de
votos, passando de seis para três dias.
“Esses números mostram que
estamos no caminho certo, pois o objetivo final é o cidadão, entregando uma
tutela jurisdicional célere e qualificada. E o que observamos é que, com o
auxílio da inteligência artificial, a qualidade do trabalho também aumenta”,
ressaltou Galhardo.
“A LexIA representa mais do que
um sistema, é um compromisso com uma Justiça moderna, ética, transparente e
inclusiva. Uma Justiça que usa a inteligência das máquinas para potencializar a
sabedoria humana. E, como toda inovação verdadeira, seu propósito final não é
acelerar o processo, mas aproximar a Justiça de quem mais precisa”, finalizou.
Participante do painel, a juíza
do Foro da Capital Hanae Yamamura ressaltou a importância de manter o foco no
ser humano diante dos avanços tecnológicos no sistema de Justiça.
“O que a inteligência artificial
pode nos auxiliar, na verdade, é justamente nas tarefas mais simples, nas
rotinas que podem ser automatizadas. Mas é o ser humano que importa. O
essencial é compreender a realidade de quem está diante de nós. Não existe
inteligência artificial capaz de sentir a urgência, a dor ou o medo de uma
mulher que pede proteção. A tecnologia pode agilizar processos, mas jamais
substituirá o olhar atento e a empatia de um juiz ou de um oficial de justiça”,
destacou.
A magistrada também ressaltou que
a advocacia deve acompanhar esse processo de transformação, entendendo as novas
ferramentas e cobrando o melhor uso delas em favor da sociedade.
“Precisamos aprender a usar essas
tecnologias e, ao mesmo tempo, saber cobrar o seu uso responsável. A celeridade
é importante, mas o cuidado é essencial. Onde for possível acelerar, que se
acelere; onde for preciso sensibilidade, que ela prevaleça”, afirmou a juíza Hanae
Yamamura.
O juiz Túlio Duailibi Alves
Souza, coordenador do Núcleo Gestor da Justiça Restaurativa do Tribunal de
Justiça de Mato Grosso (NugJur-TJMT), defendeu que a modernização tecnológica
do Poder Judiciário deve vir acompanhada de empatia, cuidado e conexão humana.
“A transformação digital nos
desafia a todo instante – seja nas estratégias de gestão, nas decisões
institucionais ou nos investimentos em tecnologia. Mas não podemos perder de
vista o essencial: a Justiça é feita por pessoas e para pessoas. Falar de
automação sem olhar para o cuidado com o ser humano é um equívoco”, destacou.
O juiz lembrou a experiência
vivida pelo Judiciário durante a pandemia, quando a digitalização dos processos
se tornou uma necessidade urgente. Segundo ele, o momento exigiu coragem e
criatividade, mas também revelou o potencial transformador da tecnologia quando
usada com propósito.
“Em 2019, quase todos os
processos ainda tramitavam em papel. A pandemia nos obrigou a acelerar um
processo que levaria anos. Em poucos meses, conseguimos digitalizar
praticamente tudo. A partir daí, passamos a realizar audiências e sessões
virtuais, e isso mudou completamente a nossa forma de trabalhar”, recordou.
O juiz destacou que,
especialmente nas áreas da Infância e Juventude, o uso da tecnologia trouxe
avanços concretos, ampliando o acesso à Justiça e garantindo maior celeridade
nos atendimentos.
“Dentro da Infância e Juventude,
o tempo custa caro. O tempo de uma criança ou de um adolescente é muito
diferente do nosso. Quando passamos a realizar audiências virtuais, deixamos de
perder tempo com burocracias e conseguimos garantir respostas mais rápidas. E
isso fez toda a diferença”, explicou.
Para o magistrado, o desafio
atual é manter o equilíbrio entre eficiência tecnológica e sensibilidade
humana.
“Não dá para tratar o processo como
mera resolução de papéis. O que precisamos é resolver conflitos. A Justiça
Restaurativa nos ensina exatamente isso: colocar-se no lugar do outro,
exercitar a empatia e compreender que cada decisão tem impacto direto na vida
de alguém”, afirmou.
Ao concluir, o juiz reforçou que
a evolução digital é inevitável, mas deve caminhar lado a lado com a
valorização das pessoas que fazem a Justiça acontecer. “Aprender a lidar com a
automação sem descuidar do vínculo humano talvez seja o nosso maior desafio. A
tecnologia deve servir à Justiça, e não o contrário. Porque nada substitui o
olhar no olho de quem bate às portas do Poder Judiciário”, concluiu.

