Ler Resumo
No admirável mundo novo da inteligência artificial (IA), o ano de 2025 representou um salto — os robôs movidos a algoritmos, que já fazem parte do cotidiano das relações profissionais, invadiram sem pompa nem circunstância recantos íntimos, e dá-lhe imensas e inescapáveis discussões éticas. O adolescente americano Adam Raine, de 16 anos, tirou a própria vida, em abril, depois de trocar milhares de mensagens com o ChatGPT, a mais conhecida ferramenta de IA. Depois de um tempo, a máquina assumiu o papel de terapeuta do garoto. Os pais do menino, após vasculharem os longos diálogos, decidiram processar a companhia OpenAI, de Sam Altman, acusada de “morte por negligência”. A empresa, é natural, rechaçou as acusações e tratou de desenvolver mecanismos que, desde então, bloqueiam sugestões descabidas evidentemente radicais, como o suicídio.
O problema, contudo, permanece aí, com o risco de pessoas solitárias, especialmente os adolescentes, substituírem os vínculos reais, de carne e osso, por interações digitais que oferecem validação imediata e não exigem esforço emocional. “O risco é criar uma intimidade sem reciprocidade, em que parece haver relação humana, mas não há”, diz a psicóloga Ilana Pinsky. A IA trabalha com uma proximidade confortável e sem consequências, mas carrega o risco de afastar usuários das complexidades dos relacionamentos reais. O estrondoso debate que atravessou o ano deixa uma questão central: o que perdemos, e quais os perigos, ao delegar a vida aos algoritmos? Altman, em entrevista exclusiva para as Páginas Amarelas de VEJA, tocou na ferida: “Nem todo mundo que quer um terapeuta consegue um ou pode pagar por um, ou talvez não haja o suficiente no mundo, ou talvez não haja bons o suficiente no mundo — então talvez seja muito melhor do que nada. Talvez o melhor médico do mundo seja muito melhor do que o ChatGPT. Mas, se não há alternativa, se não é possível pagar por um médico, especialmente em regiões mais pobres, será muito melhor do que nada”. É um bom ponto, mas não há dúvida: a IA precisa ser levada ao divã.
Publicado em VEJA de 24 de dezembro de 2025, edição nº 2976

