Inteligência Artificial pode detectar solidão analisando padrões de fala

Por Vivaldo José Breternitz

Os resultados de um estudo recentemente publicado pela revista Psychiatry Research demonstram que a inteligência artificial (IA) pode detectar a solidão analisando padrões de fala; essa é uma forma promissora de identificar e abordar esse problema, especialmente em idosos.

A solidão é um problema que afeta pessoas de todas as idades, mas é especialmente comum em idosos. Pode ser definida como o sofrimento causado por uma lacuna entre os relacionamentos sociais desejados e os reais e pode ter um impacto significativo tanto na saúde mental quanto física. Os métodos tradicionais de avaliação de solidão, como UCLA Loneliness Scale e DeJong Giervald Scale, podem ser de aplicação demorada e sujeitos a vieses.

Os autores do estudo “Decoding loneliness: Can explainable AI help in understanding language differences in lonely older adults?” tiveram como objetivo desenvolver um modelo de IA que pudesse analisar dados de fala para detectar a solidão, oferecendo assim um método de avaliação mais escalável e menos intrusivo. O estudo abrangeu 97 pessoas vivendo em um abrigo situado na área de San Diego, Califórnia.

Para coletar dados, os pesquisadores realizaram entrevistas clínicas e administraram o UCLA Loneliness Scale, além de conduzirem entrevistas qualitativas cobrindo seis tópicos principais: relacionamentos sociais, solidão, envelhecimento bem-sucedido, significado e propósito na vida, sabedoria e uso de tecnologia.

Usando as características linguísticas extraídas das transcrições das entrevistas, os pesquisadores desenvolveram um modelo de IA baseado em redes neurais para identificar quais aspectos dos dados de fala eram mais indicativos de solidão.

A análise revelou que tanto elementos semânticos quanto não semânticos da fala eram indicadores significativos de solidão. Elementos semânticos, que se relacionam ao significado e conteúdo das palavras, revelaram que indivíduos solitários frequentemente faziam referência ao status social, à religião e expressavam emoções mais negativas. Indivíduos não solitários frequentemente falavam sobre família e estilo de vida, indicando um foco em conexões sociais e atividades.

O uso de pronomes pessoais também variou significativamente. Indivíduos solitários usavam pronomes singulares de primeira pessoa, como “eu” e “mim”, com mais frequência, refletindo uma perspectiva mais centrada em si mesmos. Em contraste, indivíduos não solitários usavam pronomes plurais de primeira pessoa, como “nós” e “nosso”, sugerindo um maior senso de inclusão e conexão com os outros.

Elementos não semânticos, que incluem aspectos da fala que transmitem como algo é dito em vez do que é dito, também foram indicadores críticos de solidão. O estudo descobriu que preenchimentos conversacionais (por exemplo, “uu”, “hum”), repetições e o uso de expressões popularizadas pela internet eram mais frequentes na fala de indivíduos solitários. Além disso, indivíduos solitários, tendiam a fornecer explicações mais detalhadas e talvez racionalizadas de suas experiências.

Os resultados fornecem evidências de que “a maneira como nos comunicamos pode refletir nossos sentimentos sobre relacionamentos sociais”, como disse Ellen Lee, uma das autoras do estudo; afirmou também que novas abordagens de IA nos permitem entender como a linguagem pode ser vinculada ao funcionamento social.

Deve-se observar que o estudo tem algumas limitações, especialmente por cobrir uma amostra relativamente pequena de idosos residentes no mesmo local e com um bom nível de educação – os pesquisadores esperam expandir seu trabalho para populações mais diversas e validar as conclusões a que chegaram até o momento.


*Vivaldo José Breternitz é Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo, professor da FATEC SP, consultor e diretor do Fórum Brasileiro de Internet das Coisas.

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