Motivo de disputa com AGU, SecexConsenso do TCU será julgada pelo STF

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Plenário do TCU / Crédito: Flickr/@150778624@N04

O governo buscou diminuir a tensão entre o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Advocacia-Geral da União (AGU) em torno da Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos (SecexConsenso). O JOTA apurou que partidos do Centrão e ministérios trabalharam em prol do TCU nesse conflito, o que levou o Palácio do Planalto a articular para reduzir o embate entre os comandos das duas instituições.

A SecexConsenso foi criada pelo TCU em dezembro de 2022. O novo órgão atua na mediação de contratos de licitação, o que foi visto por integrantes da AGU como uma interferência na sua atribuição de garantir o respaldo jurídico dos contratos firmados pela União com as empresas concessionárias de serviços públicos, como obras em rodovias. A competência de o TCU fazer mediações será julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em ação ajuizada pelo Partido Novo.

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Marco Aurélio Barcelos, diretor-presidente da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), defende que a SecexConsenso é positiva para o ambiente de negócios.

De acordo com o executivo, a relicitação da BR-040 levou sete anos como reflexo da demora para chegar a acordos no âmbito da mediação realizada isoladamente por ministérios e agências antes da SecexConsenso. Barcelos ressalta que AGU, Ministério dos Transportes e a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e técnicos da União participam do espaço criado pelo TCU.

Em 2022, a ANTT aplicou 43 multas contra as concessionárias no valor total de R$ 175 milhões. O montante foi menor que o R$ 1,2 bilhão do ano anterior, quando foram aplicadas 475 multas. As multas são questionadas na Justiça pelas empresas. “Você aproveita essas renegociações [na SecexConsenso] para avaliar essas discussões [judiciais], esses passivos e judicializações para passar uma régua tanto de um lado [empresas] quanto de outro [União]. O fato de as concessionárias terem sofrido penalidades administrativas da ANTT, não significa que essas penalidades são devidas. Tanto é que elas são discutidas judicialmente”, pondera.

Comando da AGU

Em 3 de julho, a AGU publicou o Decreto 12.901/2024 criando a Rede Federal de Mediação e Negociação, com o intuito de esvaziar o órgão do TCU. Dantas suspendeu as atividades da SecexConsenso, iniciando um imbróglio político que culminou com a suspensão do decreto por Lula.

O presidente revogou o texto elaborado pela Advocacia Geral, comandada pelo ministro Jorge Messias, vinte dias depois. O pano de fundo foi o trabalho do Centrão para evitar a perda de poder do TCU nas mediações de contratos bilionários.

Ao iniciar a sessão do tribunal nesta quarta-feira (7/8), Dantas fez uma sinalização para o advogado-geral da União, anunciando que a AGU será notificada de todas as mediações discutidas no TCU. Em público, Messias elogiou o convite do TCU em publicação no X.

Interesse de ministérios

Os movimentos de apaziguamento partiram também de ministérios com contratos de licitação em apreciação na SecexConsenso e de pastas que pretendem utilizar o órgão para resolver contendas contratuais. É o caso do Ministério de Minas e Energia, que busca apoio no TCU para resolver o atraso nas obras de quatro usinas termelétricas compradas pela Âmbar Energia, empresa do grupo J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista. O caso segue em análise no órgão do TCU.

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O Ministério dos Transportes tem 14 contratos de licitação de obras de rodovias em análise na SecexConsenso, seja por interesse de as concessionárias devolvê-las por falta de capacidade ou por projetos concluídos cuja renovação será antecipada. De acordo com a secretária de Transportes Rodoviários, Viviane Esse, os contratos somam cerca de R$ 110 bilhões em investimentos. A pasta pretende relicitar esses contratos para destravar os investimentos. O conjunto soma mais da metade das 27 concessões rodoviárias firmados pelo ministério.

Esse define como “extremamente positiva” a criação da SecexConsenso para retomar os contratos com baixo desempenho de obras. “É claro que a SecexConsenso não vai se aplicar a todos os contratos, temos 14 que vamos tentar otimizar. Mas acho muito importante que a gente possa levá-los à SecexConsenso, que foi uma medida inovadora do ministro Bruno Dantas. É algo bastante moderno do ponto de vista de resolução de conflito. Acho muito melhor a gente discutir e fazer por meio do consensualismo do que do litígio, que tende a ser mais longo”, avalia.

Embate no STF

O caso foi parar no STF, após ação do Partido Novo questionar a constitucionalidade da SecexConsenso existir sob o chapéu do TCU, cuja função é julgar as contas das União. O ministro Edson Fachin será relator da ADPF 1.183, cujo prazo para apreciar o tema segue em aberto.

Na ação, o Novo alega que a secretaria amplia os poderes do presidente do TCU, ao permitir que ele decida quais conflitos serão submetidos à conciliação, além de envolver o tribunal na formatação de políticas públicas, o que extrapola as atribuições constitucionais do tribunal.

O professor de Direito Público da FGV Carlos Ari Sundfeld recorda que o TCU já teve a função de analisar contratos da administração pública antes da Constituição de 1988, quando passou a ter atuação restrita à análise e auditoria das contas da União. “O tribunal pode aplicar sanções se houver irregularidades e fazer auditorias adicionais, diz a Constituição, para verificar a economicidade das políticas públicas e dos órgãos. Mas gerando relatórios que contribuem para a gestão administrativa sem caráter impositivo”, afirma.

O jurista vê inconstitucionalidade na atuação ativa do TCU na celebração de contratos. “O que está acontecendo é que as administrações públicas estão acionando o TCU para fazer ponderações do que ele acha como deve ser, se é bom ou ruim o acordo. Acabou sendo um instrumento muito usado pelas agências reguladoras, pois viram nisso um fator de proteção e segurança para suas futuras ações. A preocupação jurídica é que nada disso é função do TCU. A Constituição não prevê isso”, afirma Sundfeld.

Justino de Oliveira, professor da USP e do IDP em Brasília, avalia ter havido avanços do debate sobre o consensualismo no meio Jurídico na última década. Segundo ele, isso levou a uma evolução dos órgãos de controle a buscarem mais diálogo e mediação no lugar da punição de agentes públicos e privados. “Tivemos a edição da Lei Federal 13.655, em 2018, que trouxe diretrizes muito importantes para que os órgãos de controle se atualizassem frente ao consensualismo e à negociação”, observa.

Como resultado, de acordo com Oliveira, os órgão passaram a ter olhar menos punitivo e mais voltado para a mediação de conflito. “Tanto órgãos da administração pública quanto o TCU foram atualizando a sua forma de agir, sobretudo na fiscalização e controle. O Tribunal de Contas da União entendeu que nas matérias que têm competência ou jurisdição, em vez de só atuar como fiscalizador e controlador no sentido de impor alguma sanção, também lhe caberia uma atuação negociador ou mediador dos processos de competência do TCU”, diz.

Oliveira não vê inconstitucionalidade na atuação do TCU na mediação de conflitos por estar prevista na lei de 2018, conhecida pela sigla LINDB (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro). Mas entende que diante do questionamento sobre a baixa transparência da SecexConsenso na negociação de contratos, o STF pode estabelecer procedimentos mais transparentes.

Barcelos, da ABCR, avalia que ação do Novo partiu de “premissas equivocadas de quem não entendeu como funciona o procedimento âmbito da SecexConsenso”. Para o representante das concessionárias, o STF deveria rejeitar a ação. “Eu acredito que não há inconstitucionalidade e, por isso, presumo que a ação deveria ser julgada improcedente”, defende.

Até o momento duas entidades pediram para ingressar como amicus curiae no processo: o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União e a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon). Ambos são favoráveis à manutenção da SecexConsenso.

O MPTCU aponta que a “IN/TCU nº. 91/2022 está em consonância com as diretrizes normativas referentes à autocomposição administrativa, conferindo, ainda, maior tutela ao interesse público, ao prever a intervenção obrigatória do Ministério Público em seu procedimento”.

Já a Atricon aponta que há outros tribunais de contas que estão investindo no consensualismo, como o Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso (TCE-MT) e o o Tribunal de Contas do Município de São Paulo (TCM-SP). “Se faz importante que este Eg. STF declare a possibilidade de os Tribunais de Contas se valerem de mecanismos de resolução de conflitos por meio do consensualismo, os quais revelam exercício instrumental de suas competências – visando ao cumprimento de suas atribuições relacionadas ao controle externo”, afirma a instituição.

Já Sundfeld avalia que o STF deve impor limites à postura do Tribunal de Contas de assumir funções que, na opinião dele, caberiam à administração pública no âmbito da União. ”O Supremo, já provocado várias vezes para dizer com clareza se o que o TCU vem fazendo é legítimo ou excessivo, tem sido tímido. O STF, provavelmente porque ele tem tido uma atitude que vai além das suas competências, não se sente muito confortável em fazer uma meditação clara da atuação constitucional do TCU”, afirma.



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