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O Brasil tem tudo para surfar na onda da IA. Mas vai aproveitar as oportunidades?

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A corrida da inteligência artificial (IA) no Brasil já começou. Sem apito de juiz, sinal verde ou qualquer aviso de largada, aplicações de IA já transformam a vida de muitos brasileiros. O País reúne alguns dos elementos mais importantes para deixar sua marca nessa verdadeira revolução global. A questão é saber se vamos aproveitar as oportunidades e vencer os desafios que vêm pela frente.

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Há quase 50 anos, em Velha roupa colorida, Belchior cantava que “o passado é uma roupa que não nos serve mais”. De lá para cá, o mundo foi chacoalhado pela evolução tecnológica no campo da informação e das comunicações. Dos softwares e dos computadores pessoais à expansão da internet – e agora com a ascensão da IA – cada novo salto acelerou um senso de urgência e de transformação. Se quiser colher os benefícios desse novo movimento, o Brasil vai precisar abandonar alguns cacoetes do passado e apostar em trunfos que poucos países têm na manga.

Brasileiros adoram tecnologia e estão entre os que mais usam o ChatGPT no mundo, mas desigualdade de acesso ainda pesa Foto: gguy/Adobe Stock

O brasileiro gosta de experimentar novas tecnologias (somos um país de early adopters), mas essa disposição encontra obstáculos na imensa desigualdade que também se revela nas medidas sobre acesso à internet e aos dispositivos necessários para rodar as principais aplicações de IA. Ainda assim, os números mostram um país em plena transformação digital. Somos o quarto maior usuário do ChatGPT globalmente e, mais uma vez, o Brasil liderou o crescimento do e-commerce na América, com alta de 16% em 2024.

Essa energia, porém, precisa ir além do consumo. O Brasil já demonstrou capacidade de criar startups que passaram a disputar o mercado global em diversos setores. Ao mesmo tempo, nas universidades brasileiras surgem soluções que, com o devido apoio, podem ganhar escala e se tornar a espinha dorsal da inovação em IA no País. Casos de sucesso são inspiradores, mas a sua recorrência depende de um número maior de estudantes, professores e profissionais treinados para lidar com um mundo no qual o uso de IA será a regra.

O Brasil pode servir de exemplo com aplicações de IA no campo da saúde, em especial se valendo de uma condição muito peculiar que é a amplitude do Sistema Único de Saúde (SUS). A integração da IA ao SUS é um tema estratégico que pode revolucionar o acesso, a eficiência e a qualidade da saúde pública.

Posicionamento estratégico

Por outro lado, o desenvolvimento de aplicações de IA requer poder computacional para treinamento de modelos, levando a altíssimas demandas energéticas. Aqui entra em cena o debate sobre data centers e o posicionamento estratégico do País. Com 48,5% de sua matriz energética renovável, 12% da água doce mundial e vastas áreas disponíveis, o País tem vantagens estruturais invejáveis.

Nossa matriz energética limpa reduz custos e emissões, enquanto a abundância de água facilita o resfriamento de máquinas. Outros países estão em busca de modelos competitivos para atrair a instalação de data centers de IA, como Cingapura, que desenvolveu um padrão para os chamados “data centers tropicais”. Mas a cidade-Estado enfrenta escassez hídrica e tem limitações territoriais que são completamente estranhas ao cenário brasileiro.

O tamanho do Brasil pode impulsionar polos tecnológicos regionais. Cidades como Fortaleza, com acesso a cabos submarinos de internet, e Goiânia, com incentivos fiscais e uma lei estadual dedicada à criação de estímulos para inovação com IA, emergem como hubs estratégicos. A integração com energia renovável, como a solar e a eólica no Nordeste, pode ajudar a colocar o Brasil no mapa.

O tamanho do Brasil pode impulsionar polos tecnológicos regionais (…). A integração com energia renovável, como a solar e a eólica no Nordeste, pode ajudar a colocar o País no mapa

Para alcançar esse objetivo, a regulação pode ser uma chave para desbloquear o potencial da IA. A Câmara dos Deputados se prepara para discutir o Projeto de Lei 2338/2023, que cria um marco regulatório da IA no País, inspirado no modelo da lei europeia. Ancorado em uma matriz de risco, o projeto cria novas obrigações para desenvolvedores e empresas, além de expandir o regime de responsabilidade civil pelos danos causados.

Risco, obrigações e responsabilidades são temas que devem ser debatidos em um projeto que pretende regular uma nova tecnologia, mas é importante que o Congresso alcance um equilíbrio para que a redação da lei brasileira de IA não crie burocracias desnecessárias, aumentando o custo jurídico para o desenvolvimento e aplicação de IA sem uma melhoria significativa na proteção de direitos. Uma regulação sobre o tema precisa ser indutora de inovação responsável, dando segurança jurídica para os desenvolvedores e assegurando controles em casos de danos.

Nenhuma nação tem o modelo ideal de regulação de IA, mas o Brasil está posicionado para buscar um caminho original e que pode colocar o País em destaque no cenário global. Em Velha roupa colorida, Belchior trocou o corvo de Edgar Alan Poe, que repetia o triste “nunca mais”, pelo assum-preto, pássaro brasileiro, que em vez de simbolizar o lamento pela não repetição do passado, mirava na direção de um futuro renovado. Se com a IA preparamos o nosso futuro, não podemos entrar na festa com as roupas do passado.

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