
(Foto: Igor Omilaev na Unsplash)
O jornalismo ainda não conseguiu se reinventar para se inserir na era da disseminação digital de notícias pela internet e já tem pela frente um desafio ainda maior: o dos sistemas de agentes de inteligência artificial, que acabam de sair do campo experimental para virarem um produto comercial, como o programa ChatGPT Pulse.
Trata-se de uma nova e ainda mais radical quebra de paradigmas profissionais do jornalismo porque o novo projeto da empresa OpenAI pode, entre outras coisas, montar diariamente uma plataforma noticiosa personalizada a partir de interesses e necessidades do usuário.
Os sistemas de agentes são um tipo especial de programa que se distingue dos demais modelos da inteligência artificial por cinco características básicas: têm um objetivo específico determinado por humanos, tomam decisões com autonomia dentro do objetivo fixado, são capazes de aprender e se modificar, podem planejar ações futuras e usam raciocínios lógicos.
Os agentes inteligentes já são usados em programas como AlphaFold , especializado em pesquisa científica sobre proteínas; o Adept AI, projetado para a área de administração de negócios; o Fetch AI no segmente de logística urbana e o Waymo, usado para determinar roteiros em veículos automáticos.
A grande diferença do Pulse em relação a projetos anteriores sobre personalização do noticiário jornalístico está na amplitude do campo de dados pessoais usados por algoritmos especializados. O programa guarda tudo o que o usuário leu, ouviu, viu, escreveu e conversou durante um certo período de tempo e relaciona tudo isto com dados, fatos, eventos e ideias em circulação no contexto social, político e econômico de quem o utiliza.
A qualidade da resposta a uma consulta na inteligência artificial está diretamente ligada ao volume de dados que um algoritmo é capaz de varrer para recombiná-los e produzir uma conclusão. O usuário pode, por exemplo, solicitar ao sistema de agentes inteligentes a produção de um discurso, uma apresentação profissional, um roteiro de viagem, um cardápio de um jantar, redigir uma notícia ou um trabalho acadêmico.
Repensar o jornalismo
Se tomarmos como referência as rotinas, normas e valores ainda vigentes na profissão, o Pulse poderia ser visto como uma espécie de sentença de morte do jornalismo convencional apoiado em estruturas analógicas. O avanço da inteligência artificial no campo da informação aumenta a urgência em repensar o exercício do jornalismo, especialmente se levarmos em conta que programas como o Pulse, e outros que devem ser lançados proximamente, vão alterar drasticamente o processo de produção de notícias.
Até agora a função de repórteres, redatores e editores era investigar dados, fatos e eventos para produzir textos, áudios ou imagens capazes de explicar o que acontece, ou vai acontecer, para leitores, ouvintes, telespectadores e internautas. Estas funções já estão sendo feitas com muita rapidez, intensidade, diversidade de fontes e contextualização por algoritmos digitais. O jornalismo está deixando de ser uma atividade especializada na formatação de notícias para agir mais como um curador e instrutor de dados, fatos e eventos relevantes para públicos específicos.
A curadoria permite ao profissional orientar as pessoas sobre o tipo de notícia mais útil, adequada e importante para elas. Ele passa a ser uma espécie de conselheiro, condição que vai exigir conhecimento das necessidades, preferências e desejos informativos das pessoas. Vai requerer também pesquisa e reflexão sobre os temas identificados como relevantes para o exercício da curadoria de notícias junto a públicos específicos.
Para desempenhar estas novas funções o jornalismo necessitará do apoio de ferramentas tecnológicas como os sistemas de agentes inteligentes. Sem eles é virtualmente impossível a repórteres, editores e influenciadores mergulhar na avalanche informativa, neutralizar a desinformação e checar notícias falsas na internet.
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Carlos Castilho é jornalista com doutorado em Engenharia e Gestão do Conhecimento pelo EGC da UFSC. Professor de jornalismo online e pesquisador em comunicação comunitária. Mora no Rio Grande do Sul.

