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o dilema da regulação da IA

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Opinião

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Recentemente, o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, trouxe um ponto fundamental durante seminário no BNDES: como equilibrar os ganhos de eficiência da inteligência artificial (IA) com a proteção da cidadania. Vivemos um momento em que a inovação tecnológica corre a passos largos, mas não podemos deixar para trás os valores que sustentam uma sociedade democrática.

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Braço robótico humanoide escrevendo com caneta sobre papel

Quando falamos de inteligência artificial, não estamos tratando apenas de algoritmos e códigos. A inteligência artificial é muito mais complexa do que isso. Simon Lindgren nos ajuda a entender essa complexidade ao descrevê-la como um assemblage — um conjunto de elementos e consequências que vão muito além do tecnológico. Englobam elementos técnicos, sociais, políticos e econômicos que moldam nossa realidade e redefinem as relações profundamente.

Afinal, como Lindgren destaca, a inteligência artificial “tanto consiste em coisas, quanto faz coisas”. Ela não é apenas uma ferramenta passiva, mas possui alto grau de imprevisibilidade, influenciando decisões humanas fundamentais, inclusive em questões políticas e jurisdicionais. Por isso, analisar a inteligência artificial exige olhar além da superfície tecnológica e compreender suas bases materiais e sociais, e é por essas razões intrínsecas que o debate de seus impactos sobre direitos fundamentais está na ordem do dia mundialmente.

A Coalizão Internacional em Defesa da Governança de Inteligência Artificial Centrada em Direitos Humanos, lançada no Fórum de Governança da Internet 2025 na Noruega, reuniu 21 países em torno de uma causa comum: proteger direitos fundamentais como privacidade, liberdade de expressão e participação democrática.

A Itália da mesma forma nos traz um exemplo interessante. Aprovou uma lei nacional de inteligência artificial alinhada ao AI Act da União Europeia, combinando investimentos robustos ao mesmo tempo em que traz exigências com uma regulação responsável. Até mesmo nos Estados Unidos, alguns estados como Colorado, Utah, Texas e Califórnia estão legislando para trazer segurança e mitigar ameaças no uso da tecnologia.

Essa preocupação global com o impacto da inteligência artificial sobre direitos fundamentais revela uma verdade fundamental que Andrew Feenberg já havia alertado sobre como as escolhas e decisões tecnológicas, mesmo quando apresentadas como imparciais e objetivas, frequentemente carregam em si valores e tendências implícitas que podem não estar evidentes à primeira vista. Assim, a inteligência artificial não é uma tecnologia neutra, afinal, ela traz internamente um código de valores, vieses e escolhas sociais específicas.

Quando um algoritmo de contratação privilegia sistematicamente determinados candidatos, não se trata de uma falha técnica, mas do reflexo de vieses sociais que foram incorporados aos dados de treinamento e às decisões de design. A aparente objetividade matemática ofusca escolhas profundamente humanas e políticas.

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Por isso, a democratização da inteligência artificial não é apenas desejável — é uma necessidade ética. Os especialistas em inteligência artificial, por mais brilhantes que sejam, carregam suas próprias limitações e perspectivas. A participação pública no desenvolvimento e controle dessas tecnologias serve como um mecanismo de correção essencial, revelando pontos cegos e desafiando pressupostos que passariam despercebidos em laboratórios fechados.

Tecnologia, progresso humano e democracia

Dario Durigan tem razão quando fala em flexibilidade regulatória baseada na gestão de riscos e se alinha ao projeto brasileiro (PL 2.338/2023), visto que a futura regulação brasileira busca exatamente isso — um marco regulatório que não afaste a inteligência artificial, mas incorpore cuidados essenciais aos valores democráticos e sociais necessários a garantir o desenvolvimento responsável de uma tecnologia que se mostra cada vez mais essencial e estrutural.

A inteligência artificial apresenta riscos que simplesmente não conseguimos prever completamente – desde efeitos de longo prazo sobre o mercado de trabalho até impactos psicológicos e sociais ainda não mapeados. Aceitar essa incerteza não significa paralisar a inovação, mas reconhecer que existem situações incertas e imprevisíveis que exigem salvaguardas robustas.

No entanto, o papel do governo nesse cenário vai além de regular. Somos protagonistas na construção de um estado digital que verdadeiramente sirva à população. A digitalização dos serviços públicos com inteligência artificial pode revolucionar a eficiência, transparência e acessibilidade. Mas isso exige cuidado redobrado com ética, proteção de dados e combate aos vieses algorítmicos.

O grande desafio é construir um arcabouço normativo que seja dinâmico e responsivo, sem sufocar a inovação. A regulação da inteligência artificial não é empecilho ao empreendedorismo — é o que traz responsabilidade e prestação de contas ao processo. A participação da sociedade no desenvolvimento e controle da inteligência artificial é crucial para que as soluções tecnológicas reflitam nossos valores coletivos.

Construir um estado digital robusto e democrático demanda, assim, políticas públicas que promovam inclusão digital, reduzam desigualdades e garantam que os benefícios da inteligência artificial cheguem a todos. Nossa soberania digital depende da capacidade de formular políticas e estratégias para a inteligência artificial que estejam alinhadas aos nossos valores enquanto sociedade e como nação.

Diante disso, toda essa complexidade da inteligência artificial exige uma governança que compreenda suas múltiplas dimensões — da infraestrutura tecnológica às implicações éticas e sociais. Só assim garantiremos que o progresso tecnológico seja sinônimo de progresso humano e democrático, mantendo sempre a humanidade no centro das decisões, assegurando que os algoritmos sirvam às pessoas e não o contrário, afinal, em uma era de máquinas inteligentes, nossa maior inteligência deve ser manter o controle.

Fato é que o futuro da inteligência artificial será tão humano quanto permitirmos que seja.



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