As “emendas Pix” causaram uma crise entre o Legislativo e o Judiciário nesta semana, após suspensão do modelo de transferência de recursos pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Esse tipo de emenda surgiu no ano de 2019, por meio da PEC 61/15, que foi apresentada pela então senadora e atual deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), que também é a presidente do Partido dos Trabalhadores (PT).
O texto, aprovado pelo Senado em abril de 2019 e enviado para a Câmara, recebeu a numeração 48/19. Posteriormente, a PEC foi promulgada e tornou-se a Emenda Constitucional (EC) 105/2019, que acrescenta o art.166-A, autorizando a transferência direta a estados, municípios e ao Distrito Federal, de recursos de emendas parlamentares individuais ao Orçamento. No entanto, o PIX Orçamentário só foi implementado em lei ordinária infraconstitucional, mais especificamente a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2021 (LDO).
“O que nós pretendemos com esta PEC é agilizar o repasse dos recursos das emendas direto para o Fundo de Participação dos Municípios ou direto para o Fundo de Participação dos Estados, para facilitar sua execução. Isso não retira a indicação do que deve ser feito com os recursos, indicação essa sempre feita pelo parlamentar autor da emenda. Esse é um primeiro esclarecimento”, disse Gleisi Hoffmann, na época da votação da proposta.
Naquele momento, a presidente do PT também “desmentiu” boatos de que a PEC “dificultaria a fiscalização da execução dos recursos”. “Isso é mentira, porque o Fundo de Participação dos Municípios e o Fundo de Participação dos Estados têm fiscalização rigorosa, seja pelo Parlamento local, Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais, seja pelos órgãos de contas dos Estados e do Distrito Federal. E mais: não fogem à apreciação também da fiscalização do Tribunal de Contas da União, que sempre pode ser chamado a se manifestar sobre as contas dos entes federados”, declarou a petista.
De acordo com a emenda, os repasses podem ser feitos sem necessidade de convênio. As transferências são de dois tipos: doação, quando o parlamentar encaminha recursos para o governo ou a prefeitura sem destinação específica; e finalidade definida, quando a verba vai “carimbada” para um uso determinado. A doação passou a se chamar transferência especial.
Em 2023, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), rebateu críticas da deputada Gleisi Hoffmann após ela criticar a ofensiva do Congresso sobre o Orçamento da União em querer obrigar o pagamento de emendas de comissões. Em resposta à petista, Pacheco reiterou o seu compromisso “com a responsabilidade fiscal e o aperfeiçoamento das ’emendas Pix'”, as quais ele apontou que foram “criadas pela [agora] deputada”.
Suspensão das emendas
Na última quarta (13), o ministro Flávio Dino suspendeu a execução de todas as emendas impositivas, com exceção dos recursos destinados a obras em andamento e em casos de calamidade pública. A determinação ficará em vigor até que o Congresso aprove regras para dar transparência à distribuição de verbas públicas.
A modalidade permite que deputados e senadores enviem verba pública diretamente às prefeituras, sem a necessidade de especificar o destino do dinheiro. A Abraji e a PGR questionaram justamente a dificuldade de dar transparência a esses repasse.
Por se tratar de um ato monocrático, ou seja, individual, Dino submeteu a decisão à análise do plenário da Corte. O julgamento virtual iniciou nesta sexta e a suspensão foi confirmada pelos outros 10 ministros.
O ato do STF vem sendo criticado pelos líderes do Congresso Nacional. Para o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), “o papel de limitar as emendas é do Congresso, não do STF”. Diante da possível suspensão e em reação ao Supremo, Lira decidiu destravar o andamento da “PEC das decisões monocráticas”.
O relator do Orçamento, senador Angelo Coronel, também reagiu à medida e disse que a “emenda Pix continua”.
Na terça (12), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, afirmou que o Congresso pretende preparar um novo modelo de “emenda pix” com mais transparência.
PT e outros partidos queriam suspender decisão de Dino; Barroso negou pedido
Nesta sexta-feira (16), o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, negou um pedido do Congresso Nacional para sustar as decisões do ministro Flávio Dino que suspenderam os pagamentos das emendas parlamentares impositivas, que incluem as chamadas “emendas pix”, as individuais e as de bancada.
De acordo com Barroso, não cabe à presidência do STF “sustar os efeitos de decisões proferidas por um de seus integrantes, em sede de suspensão de liminar, quando tais decisões já estão sendo objeto de deliberação pelo Colegiado do Tribunal”.
O Partido dos Trabalhadores (PT), sigla do presidente Lula e de Gleisi, foi um das 11 legendas que pediram a Barroso para sustar as decisões de Dino que suspenderam os pagamentos das emendas parlamentares impositivas, que incluem as chamadas “emendas pix”, as individuais e as de bancada.
O PT assinou o pedido junto com o PL (Partido Liberal), União Brasil, PP (Progressistas), PSD (Partido Social Democrático), PSB (Partido Socialista Brasileiro), Republicanos, PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira), Solidariedade, PDT (Partido Democrático Trabalhista), e MDB (Movimento Democrático Brasileiro).
Apesar da adesão do partido, o pedido não foi assinado pela presidente da sigla, a deputada Gleisi Hoffmann (PR). No caso do PT, assinaram o documento o líder da sigla na Câmara, Odair Cunha (MG), e o líder do governo na Casa, José Guimarães (PT-CE).
“O PT é mais amplo do que sua representação parlamentar e a presidenta Gleisi Hoffmann é crítica à maneira como o Orçamento da União vem sendo apropriado pelo Legislativo. Por isso não assinou a ação proposta pelos presidentes da Câmara e do Senado”, disse o partido em nota enviada à Folha de S. Paulo, na quinta-feira (15).
Nota técnica da Câmara e Senado
Após as decisões do ministro Flávio Dino, a Câmara e o Senado divulgaram uma nota técnica informando que a decisão sobre as transferências especiais “faz com que estes recursos fiquem sob a responsabilidade da União em relação à execução e à fiscalização”.
A nota técnica frisa que essas emendas “não precisam ter finalidade específica e nem programa de trabalho – itens exigidos agora por Dino – porque são encaradas como ‘doações'”. Os consultores ressaltam o crescimento das “emendas Pix” ao longo dos anos, passando de R$ 600 milhões em 2020 para R$ 8,2 bilhões neste ano.
Sobre a transparência, a nota afirma que “a autoria de todas as emendas é conhecida, mas que a ausência de programa de trabalho específico impossibilita o acesso às informações sobre o destino e aplicação dos recursos”.
Além disso, os consultores avaliam que a “União terá que tomar medidas caso não seja comprovada a aplicação dos recursos”.