O sentimento de Wall Street em relação às empresas associadas à inteligência artificial está mudando, e tudo gira em torno de duas companhias: a OpenAI, que está em queda, e a Alphabet, que vem apresentando uma rápida ascensão. A criadora do ChatGPT já não é vista como líder absoluta no avanço da tecnologia de IA e enfrenta questionamentos sobre sua falta de lucratividade e a necessidade de crescer rapidamente para honrar compromissos bilionários. Ao mesmo tempo, a controladora do Google surge como uma concorrente financeiramente robusta, com presença em todas as frentes do setor.
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— OpenAI era a queridinha no início deste ano, e a Alphabet era vista de forma muito diferente — disse Brett Ewing, estrategista-chefe de mercado da First Franklin Financial Services. — Agora o sentimento está bem mais moderado em relação à OpenAI.
Como resultado, ações de empresas ligadas à OpenAI, principalmente Oracle, CoreWeave e Advanced Micro Devices, mas também Microsoft, Nvidia e SoftBank, dona de 11% da empresa, enfrentam forte pressão vendedora. Enquanto isso, o embalo da Alphabet impulsiona não só seus papéis, mas também os de parceiras como Broadcom, Lumentum Holdings, Celestica e TTM Technologies.
A virada foi rápida e profunda. Há poucas semanas, qualquer empresa com vínculo com a OpenAI registrava fortes altas. Agora, essa conexão se tornou um peso. A mudança tem implicações amplas, dado o papel central da companhia, de capital fechado, na onda de entusiasmo com IA que impulsiona o mercado há três anos.
— Jogou-se luz sobre a complexidade dos financiamentos, dos acordos circulares, das questões de dívida — afirmou Ewing. — Isso até existe em certo grau no ecossistema da Alphabet, mas no caso da OpenAI ficou exposto como algo extremo, e entender isso mudou completamente o sentimento.
Um conjunto de empresas ligadas à OpenAI subiu 74% em 2025 — um número forte, mas distante dos 146% registrados por empresas associadas à Alphabet. O Nasdaq 100, índice de tecnologia, acumula alta de 22%.
A diferença entre ser líder ou vice não é somente simbólica; tem impacto financeiro concreto. Por exemplo: se usuários migram para o Gemini e desaceleram o crescimento do ChatGPT, fica mais difícil para a OpenAI pagar pela capacidade de computação na nuvem da Oracle ou pelos chips da AMD.
Já os parceiros da Alphabet surfam a onda positiva. As ações da Lumentum, que fabrica componentes ópticos para os data centers da empresa, mais que triplicaram no ano, entrando entre as 30 maiores altas do índice Russell 3000. A Celestica, que fornece hardware para a expansão de IA da Alphabet, acumula, 252% em 2025. A Broadcom, que produz os chips TPU usados pelo Google, subiu 68% desde dezembro.
— Por a OpenAI ter anunciado diversos acordos ambiciosos nos últimos meses, esse volume de movimentações naturalmente trouxe escrutínio e preocupação sobre a capacidade da companhia de financiar tudo isso, se não estaria assumindo mais do que pode cumprir — disse Colello. — O ritmo de crescimento da receita é incerto, e cada avanço dos concorrentes eleva o risco de a empresa não atingir suas metas.
Inicialmente, investidores receberam esses acordos com entusiasmo, por enxergarem ali a formação da próxima geração de vencedores da IA. Mas com a mudança de humor, adotaram uma postura de cautela.
— Quando achavam que a empresa poderia gerar receita e ser lucrativa, aqueles números gigantes pareciam possíveis — afirmou Brian Kersmanc, gestor na GQG Partners, que administra cerca de US$ 160 bilhões. — Agora chegamos ao ponto em que as pessoas deixaram de acreditar e passaram a questionar.
Kersmanc compara a euforia da IA à “bolha das pontocom, mas turbinada”, e diz que sua gestora passou de fortemente comprada em tecnologia para altamente cética.
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“Estamos tentando evitar áreas de superexposição — muitas alimentadas pela OpenAI”, afirma. “Como tantas partes do mercado foram tocadas por isso, o desmonte será doloroso. Não são só algumas poucas empresas de tecnologia que precisam cair, embora elas representem grande parte do índice. Há operações paralelas, como em utilities, com alta correlação. Esse é o nosso medo: não só a narrativa impulsionada pela OpenAI, mas o fato de que tantas coisas foram infladas pelo hype.”
Problemas de relações públicas também pesaram. A CFO da OpenAI, Sarah Friar, sugeriu recentemente que o governo dos EUA deveria “dar garantias que viabilizem o financiamento”, o que levantou sobrancelhas. Depois, ela e Sam Altman esclareceram que a empresa não fez tal solicitação.
Outro episódio foi a participação de Altman no podcast “Bg2 Pod”, no qual foi questionado sobre como a companhia pode fazer compromissos de gastos muito superiores à sua receita. “Se quiser vender suas ações, eu arrumo um comprador — chega”, respondeu o CEO.
A fala pegou mal, pois a diferença entre a receita da OpenAI e seus planos de gastos até 2033 é de cerca de US$ 207 bilhões, segundo o HSBC.
“Fechar essa conta exigiria mais receita do que prevemos, melhor gestão de custos, captações adicionais de capital ou emissão de dívida”, escreveu o analista Nicolas Cote-Colisson. A expectativa de que a empresa gere receita acima de US$ 12 bilhões em 2025 não alivia o nervosismo sobre seu custo de computação — nem para a companhia, nem para toda a cadeia de IA conectada a ela.
Ainda assim, Oracle e AMD não dependem exclusivamente da OpenAI. Elas atuam em setores com forte demanda e podem vender seus produtos para outros clientes. Além disso, a queda recente pode representar oportunidade de compra: empresas ligadas ao ChatGPT e aos chips que o sustentam estão mais baratas do que aquelas ligadas ao Gemini — algo que não ocorria desde 2016, segundo análise do Wells Fargo.
“Vejo muita demanda reprimida e espaço de penetração em vários setores, e isso deve sustentar o crescimento”, afirmou Kieran Osborne, diretor de investimentos da Mission Wealth, com US$ 13 bilhões sob gestão. “A monetização é o objetivo final dessas empresas e, enquanto buscarem isso, há fundamentos para o investimento.”

