(Série “A Guerra às Drogas: o preço da proibição” — Artigo 4 de 5)
Da REDAÇÃO – texto produzido com o auxílio da IA ChatGPT
Durante mais de meio século, a política mundial de drogas foi construída sobre um paradoxo:
prometia proteger a saúde, mas o que produziu foram mortes, doenças e exclusão.
A criminalização afastou usuários dos serviços médicos, espalhou o medo e empurrou milhões de pessoas para a clandestinidade.
Hoje, há consenso crescente — inclusive dentro da ONU e da OMS — de que o modelo repressivo agrava os danos que diz combater.
O que a ciência sabe sobre o uso de drogas
O uso de substâncias psicoativas acompanha a humanidade desde a Antiguidade.
O problema não está na existência das drogas, mas na forma como as sociedades lidam com elas.
Estudos epidemiológicos da OMS e de centros de pesquisa em saúde pública mostram que a imensa maioria dos usuários não desenvolve dependência, ainda que estejam expostos a uma série de outros efeitos adversos, e que os transtornos por uso de substâncias (SUDs) são fenômenos clínicos tratáveis, não morais.
A World Health Organization (WHO), no relatório “Drugs (psychoactive)”, detalha que aproximadamente 296 milhões de pessoas entre 15-64 anos usaram drogas psicoativas em 2021 e que “apenas” cerca de 39,5 milhões têm transtornos por uso de substâncias (SUD).
Estudos de epidemiologia revelam que para a Cannabis (maconha) cerca de ~9% dos que a experimentam desenvolverão algum transtorno de uso de cannabis (CUD) e/ou se tornarão dependentes segundo critérios da DSM IV (1994). Para a Nicotine (tabaco/nicotina) e para opioides, os riscos de dependência são mais elevados — ou seja, a maioria dos usuários dessas substâncias ainda pode não desenvolver dependência, mas a proporção é maior comparada a outras drogas.
A criminalização, porém, impede o tratamento.
O medo de ser preso afasta usuários de unidades de saúde, e o estigma reduz a procura por ajuda.
Em comunidades vulneráveis, isso se traduz em epidemias silenciosas de HIV, hepatites e tuberculose, especialmente entre pessoas que usam drogas injetáveis.
A falácia da proibição como prevenção
Defensores da ilegalidade alegam que a proibição desestimula o consumo.
A experiência mostra o contrário:
- O consumo global de drogas ilícitas aumentou cerca de 23 % entre 2010 e 2023 (World Drug Report 2024, UNODC).
- As overdoses fatais cresceram, sobretudo com o fentanil e os opioides sintéticos.
- O estigma associado às drogas agrava a exclusão e favorece práticas de risco.
Em outras palavras, a repressão fracassou como estratégia de saúde pública.
A política da redução de danos
A partir dos anos 1990, países europeus e latino-americanos começaram a adotar uma nova abordagem: a redução de danos.
Seu princípio é simples: aceitar que o uso existe e minimizar seus riscos, em vez de negá-lo.
Isso inclui:
- Distribuição de seringas esterilizadas e kits de higiene;
- Programas de troca e descarte seguro;
- Testes de pureza e dosagem;
- Tratamento com substitutos (como metadona);
- Acolhimento sem julgamento em serviços de saúde e assistência social.
Em 2001, Portugal descriminalizou o porte de todas as drogas para consumo pessoal.
Os resultados são amplamente documentados:
- Queda de mais de 80 % nas infecções por HIV entre usuários injetáveis;
- Redução drástica de overdoses;
- Estabilização do consumo, sem “epidemia” entre jovens;
- Aumento do acesso ao tratamento e da reinserção social.
Modelos semelhantes funcionam na Suíça, Holanda, Canadá e Uruguai, com variações regulatórias.
O caso brasileiro
O Brasil possui experiências pontuais de redução de danos — como o programa de Santos (SP) nos anos 1990 e as ações de ONGs em Porto Alegre e Recife — mas sem respaldo consistente do Estado.
As políticas públicas nacionais continuam centradas em internação compulsória, abstinência e repressão policial.
Mesmo o Sistema Único de Saúde (SUS), referência mundial, enfrenta barreiras legais e ideológicas para acolher usuários.
Em vez de investir em atenção psicossocial e reabilitação, governos multiplicam comunidades terapêuticas religiosas, muitas denunciadas por maus-tratos e violações de direitos humanos.
Custos e benefícios comparados
Pesquisas de economia da saúde indicam que cada US$ 1 investido em prevenção e tratamento economiza até US$ 7 em repressão, prisões e custos médicos.
A regulação e o controle de qualidade reduzem contaminações e overdoses, e os recursos fiscais podem financiar campanhas de esclarecimento.
Em Uruguai e Canadá, parte da arrecadação tributária do mercado legal da cannabis é destinada a programas de educação e prevenção.
Nos EUA, estados como Colorado e Califórnia usam as receitas para financiar bolsas de estudo e tratamento público.
Do medo à responsabilidade
Tratar o uso de drogas como problema de saúde pública significa substituir o medo pela responsabilidade.
Implica reconhecer que o consumo existe, compreender suas causas (sociais, emocionais, econômicas) e criar políticas baseadas em evidências, não em dogmas.
Significa também devolver à medicina, à psicologia e à educação o espaço que lhes foi roubado pela polícia e pelos tribunais.
Doença social, não crime individual
A política de drogas deve ter como centro a vida, não o castigo.
O usuário não é um inimigo a ser eliminado, mas um cidadão a ser cuidado.
A redução de danos é o nome contemporâneo da civilização em um tema que, por décadas, serviu apenas à barbárie.
O que o mundo começa a perceber — e o Brasil ainda reluta em aceitar — é que punir não cura, mas tratar pode libertar.
Ilustração da capa: Saúde e redução de danos – Imagem gerada por IA ChatGPT
No próximo artigo:
“O custo da proibição: economia, fiscalidade e desigualdade social”
Como o mercado clandestino e o encarceramento drenam recursos públicos, enquanto a regulação poderia financiar saúde, educação e justiça social.
Leia também os artigos anteriores:
0. Série Especial: A Guerra às Drogas — o Preço da Proibição
1. Introdução: A guerra às drogas e o preço da proibição
2. O império da proibição: a gênese política da guerra às drogas
3. Cárcere e punição: os mínimos obrigatórios e o encarceramento em massa

