A inteligência artificial (IA) continua a ser descrita como uma ferramenta com dois lados. Se, por um lado, liberta trabalhadores de tarefas repetitivas e pouco qualificadas, por outro ameaça reduzir o espaço de atuação em áreas criativas. Esta dualidade reflete-se na forma como as organizações estão a lidar com a tecnologia, que tanto pode traduzir-se em reduções de custos como em novos caminhos de crescimento.
As consequências para o emprego são, no entanto, a questão mais sensível. Em julho, empresas como Microsoft, Intel, Indeed e Glassdoor anunciaram cortes que, no conjunto, ultrapassaram os 15 mil postos de trabalho, enquadrados numa reorganização centrada na IA. De acordo com a plataforma Layoffs FYI, mais de 80 mil trabalhadores do setor tecnológico perderam o emprego desde o início do ano.
Um estudo do World Economic Forum estimou que até 2030 poderão desaparecer 92 milhões de empregos devido ao impacto da automação inteligente. Ao mesmo tempo, a mesma análise prevê a criação de 170 milhões de novas funções. Este paradoxo traduz a dificuldade em avaliar os riscos imediatos da IA, mas também a incerteza em antecipar profissões que ainda não existem.
Segundo um inquérito global da BCG, 41% dos colaboradores acreditam que o seu emprego poderá desaparecer na próxima década. Já uma sondagem da Enterprise Strategy Group revelou que 88% das organizações que adotaram IA já registaram melhorias tangíveis de eficiência, mas com um foco predominante em redução de custos.
Apesar do clima de apreensão, algumas empresas têm vindo a mostrar abordagens diferentes. Há empresas que já estão a implementar agentes de IA em áreas como a triagem de candidatos ou a produtividade dos colaboradores. Em vez de substituir trabalhadores, as empresa apostam em formação, certificações e programas de reconversão profissional, traduzindo-se numa melhoria das taxas de retenção.
Há ainda outras estratégias a serem consideradas por algumas empresas, como alinhar a sua estratégia interna com a evolução da IA, nomeadamente através de sistemas “agentic” — ferramentas autónomas que colaboram em tarefas delegadas. A transformação não é apenas tecnológica: envolve igualmente a gestão de mudança e a capacitação dos trabalhadores.
Este tipo de iniciativas mostra que a aposta não passa apenas por ganhos de produtividade, mas também por criar oportunidades de crescimento para os colaboradores.
A disseminação de ferramentas generativas também está a democratizar competências que até agora estavam confinadas a especialistas. Há empresas com sistemas internos que antes custavam dezenas de milhares de euros, e que foram substituídos por soluções desenvolvidas com o apoio da IA, envolvendo custos muito inferiores e permitindo maior autonomia aos departamentos.
Este cenário não elimina a necessidade de especialistas em TI, já que questões como segurança, integração e testes continuam a exigir validação técnica. O resultado é um aumento da procura por desenvolvimento personalizado, trazendo novos projetos para dentro das empresas.
Especialistas do setor sublinham que a adoção de IA deve assentar numa visão positiva: em vez de ser vista apenas como substituta de funções, pode ser motor de evolução das equipas e de melhoria da experiência de trabalho. O desafio para os decisores de tecnologia será, portanto, equilibrar a eficiência gerada pela IA com a valorização e o crescimento das pessoas.

