Após a ONG Me Too, de combate ao assédio sexual, ter divulgado na quinta-feira (5/9) a informação de que recebeu denúncias de assédio sexual contra o ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou que “alguém que pratica assédio não vai ficar no governo”.
A declaração do presidente, a primeira após as denúncias virem à tona, foi dada em uma entrevista à Rádio Difusora de Goiânia, onde ele estava na manhã desta sexta-feira.
Lula afirmou que é preciso dar direito a quem tiver que se defender, admitindo a “presunção da inocência”, e disse que vai colocar a Polícia Federal, a Comissão de Ética da Presidência da República e o Ministério Público Federal para investigar o caso.
“Eu estou numa briga danada contra a violência contra as mulheres”, afirmou. “Eu não posso permitir que tenha assédio [no governo].”
“Vamos ter que apurar corretamente. Mas acho que não é possível a continuidade no governo, porque o governo não vai fazer jus ao seu discurso de defesa das mulheres, de defesa, inclusive dos direitos humanos, com alguém que esteja sendo acusado de assédio”, acrescentou o presidente.
Lula disse que tomará uma decisão na tarde de sexta-feira, após conversar com três ministros e outras três ministras mulheres, sem afirmar quais seriam. Depois, o presidente se reunirá com Silvio Almeida e Anielle Franco para tomar sua decisão.
Ainda na noite de quinta-feira, a primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, publicou em sua rede social uma foto em que ela aparece beijando a testa de Anielle Franco, ministra da Igualdade Racial e que, de acordo com o site Metrópoles, teria sido uma das vítimas do assédio de Almeida.
Sobre foto, Lula disse que trata-se de uma “demonstração inequívoca de que as mulheres estão com as mulheres”.
“E é o normal não tem uma mulher que seja favorável a alguém que seja acusado de assédio.”
Na nota em que faz a acusação, o Me Too Brasil diz que “confirma, com o consentimento das vítimas, que recebeu denúncias de assédio sexual contra o ministro Silvio Almeida, dos Direitos Humanos”.
As mulheres denunciantes foram atendidas por meio dos canais de atendimento da organização e receberam acolhimento psicológico e jurídico, diz a ONG num comunicado à imprensa.
Silvio Almeida negou as acusações e pediu que a Controladoria-Geral da União, o Ministério da Justiça e a Procuradoria-Geral da República investiguem o caso.
“Repudio com absoluta veemência as mentiras que estão sendo assacadas contra mim. Repudio tais acusações com a força do amor e do respeito que tenho pela minha esposa e pela minha amada filha de um ano de idade, em meio à luta que travo, diariamente, em favor dos direitos humanos e da cidadania neste país”, afirmou o ministro, que, além de divulgar uma nota, postou um vídeo nas redes sociais se defendendo das acusações.
O ministério das Mulheres publicou uma nota na sexta-feira pela manhã afirmando que as denúncias “são graves” e que “a prática de qualquer tipo de violência e assédio contra a mulher é inadmissível e não condiz com os princípios da administração pública Federal e da democracia.”
A pasta pede que “toda denúncia seja investigada de forma célere, com rigor e perspectiva de gênero, dando o devido crédito à palavra das vítimas, e que os agressores sejam responsabilizados de forma exemplar”.
Já o Palácio do Planalto informou que a Comissão de Ética da Presidência decidiu abrir um procedimento de apuração sobre o caso.
“O ministro foi chamado na noite desta quinta para prestar esclarecimentos ao controlador-geral da União, Vinícius Carvalho, e ao advogado-geral da União, Jorge Messias, por conta das denúncias publicadas pela imprensa contra ele”, disse o Planalto, em nota.
“O Governo Federal reconhece a gravidade das denúncias. O caso está sendo tratado com o rigor e a celeridade que situações que envolvem possíveis violências contra as mulheres exigem.”
O que se sabe sobre as denúncias
A notícia de que mulheres denunciaram Silvio Almeida por assédio sexual foi divulgado primeiro pelo site Metrópoles e depois confirmada pela ONG Me Too.
As autoras da denúncia pediram anonimato. Na nota divulgada à imprensa, o Me Too disse que as vítimas teriam enfrentado dificuldade para “validar suas denúncias” e, por isso, decidiram tornar o caso público.
“Como ocorre frequentemente em casos de violência sexual envolvendo agressores em posições de poder, essas vítimas enfrentaram dificuldades em obter apoio institucional pra a validação de suas denúncias. Diante disso, autorizaram a confirmação do caso para a imprensa.”
Segundo o site Metrópoles, todos os episódios teriam ocorrido no ano passado. O portal também disse que uma das vítimas do assédio sexual seria a ministra Anielle Franco, da Igualdade Racial.
A ministra ainda não se manifestou sobre o caso.
O que diz Silvio Almeida
Silvio Almeida reagiu primeiro com uma nota e depois com a divulgação de um vídeo em suas redes sociais com teor semelhante, negando as acusações e dizendo que vai pedir a responsabilização de quem fez a denúncia.
“Confesso que é muito triste viver tudo isso, dói na alma. Mais uma vez, há um grupo querendo apagar e diminuir as nossas existências, imputando a mim condutas que eles praticam. Com isso, perde o Brasil, perde a pauta de direitos humanos, perde a igualdade racial e perde o povo brasileiro”, afirmou.
Ele chamou as denúncias de mentiras sem provas, pediu uma apuração cuidadosa, e relacionou o que chamou de “difamações caluniosas” ao fato de ser um homem negro.
“Toda e qualquer denúncia deve ser investigada com todo o rigor da lei, mas para tanto é preciso que os fatos sejam expostos para serem apurados e processados. E não apenas baseados em mentiras, sem provas”, disse.
“Tais difamações não encontrarão par com a realidade. De acordo com movimentos recentes, fica evidente que há uma campanha para afetar a minha imagem enquanto homem negro em posição de destaque no Poder Público, mas estas não terão sucesso. Isso comprova o caráter baixo e vil de setores sociais comprometidos com o atraso, a mentira e a tentativa de silenciar a voz do povo brasileiro, independentemente de visões partidárias.”
Silvio Almeida encerrou seu comunicado dizendo que sempre “lutará pela verdadeira emancipação das mulheres”.
“Quaisquer distorções da realidade serão descobertas e receberão a devida responsabilização. Sempre lutarei pela verdadeira emancipação da mulher, e vou continuar lutando pelo futuro delas. Falsos defensores do povo querem tirar aquele que o representa. Estão tentando apagar a minha história com o meu sacrifício”, disse.
O que diz o Me Too
Após a divulgação das denúncias pelo site Metrópoles, a ONG Me Too confirmou a existência de acusações contra Silvio Almeida e afirmou que está dando apoio psicológico e jurídico às vítimas.
A organização não deu detalhes sobre as autoras da denúncia, mas explicou que elas tiveram dificuldades em validar as acusações institucionalmente.
“Vítimas de violência sexual, especialmente quando os agressores são figuras poderosas ou influentes, frequentemente enfrentam obstáculos para obter apoio e ter suas vozes ouvidas. Devido a isso, o Me Too Brasil desempenha um papel crucial ao oferecer suporte incondicional às vítimas, mesmo que isso envolva enfrentar grandes forças e influências associadas ao poder do acusado”, disse a ONG.
Segundo o Me Too, “a denúncia é o primeiro passo para responsabilizar judicialmente um agressor, demonstrando que ninguém está acima da lei, independentemente de sua posição social, econômica ou política”.