A promessa de autonomia dos agentes de IA esbarra em novas barreiras técnicas — e desafia o acesso democrático
Resumo
A autonomia prometida pelos agentes de IA enfrenta desafios técnicos que dificultam o acesso democrático, mas ferramentas como construtores de GPTs customizados ainda oferecem alternativas práticas para usuários comuns moldarem assistentes, mantendo a inclusão como princípio central.
Quando a OpenAI lançou o construtor de GPTs customizados, a promessa era clara: qualquer usuário poderia moldar uma Inteligência Artificial ao seu modo, criando assistentes de IA específicos para suas necessidades — sem precisar escrever uma linha de código. Autonomia total.
No entanto, à medida que os agentes autônomos ganham destaque nas big techs, ficou claro que a história não seria tão simples. Isso parece, até certo ponto, natural, como uma evolução do que a IA pode oferecer. Porém, há um fator preocupante: a distância entre ser um simples usuário do ChatGPT e se tornar um criador de agentes de IA continua considerável.
Por enquanto, a perspectiva é de que apenas usuários com qualificação técnica terão pleno domínio de seus próprios agentes autônomos.
O paradoxo é evidente: a mesma tecnologia que abriu as portas da criação para o público em geral começa a exigir conhecimentos que poucos dominam — como integração de APIs, publicação de código no GitHub e configuração de fluxos automáticos.
O risco é que os agentes de IA se tornem uma espécie de “reserva de mercado”, acessível apenas a quem domina essa nova camada de complexidade técnica. Se isso ocorrer, a revolução que começou como uma promessa de acesso democrático pode, na prática, se tornar uma limitação — ou, pelo menos, um obstáculo para novos usuários.
Contudo, essa não precisa ser a única via.
Encadeamento de GPTs customizados
Dentro do próprio ChatGPT, com o construtor de GPTs customizados, ainda é possível adotar uma lógica prática e acessível: o usuário pode construir pequenos assistentes especializados — um para revisar textos, outro para sugerir tags, outro para gerar metadados, outro para criar chamadas para redes sociais.
Cada GPT customizado cumpre uma função específica. E o próprio usuário, ao “chamá-los” para uma mesma interação, cria um encadeamento de tarefas que, na prática, replica a lógica dos agentes autônomos mais avançados — mas sem precisar programar ou integrar sistemas externos.
Essa abordagem (que uso diariamente nas minhas tarefas como editor e consultor) reforça um ponto essencial no uso de ferramentas como o ChatGPT: a força da autonomia do usuário (ainda relevante) diante do avanço do agente autônomo. E essa autonomia precisa ser valorizada como uma conquista — não como uma exceção.
Novos usuários
Esse debate se torna ainda mais urgente quando olhamos para o momento atual da Inteligência Artificial Generativa:
O ChatGPT já ultrapassou a marca de 600 milhões de usuários mensais ativos e 160 milhões de usuários diários ativos. O Gemini, principal aposta do Google nesse mercado, reúne cerca de 350 milhões de usuários mensais ativos.
Esses números demonstram o tamanho da transformação em curso — mas também revelam que uma parcela significativa desses usuários está chegando agora ao universo da IA generativa. Muitos estão em fase de descoberta, tateando para entender como utilizar no dia a dia — ou até mesmo se precisam incorporá-la.
Para esse novo público, a promessa de autonomia é mais do que um benefício: é o principal atrativo.
Se as plataformas complicarem o caminho, valorizando mais os agentes autônomos, mesmo para usuários comuns (no mesmo nível dos corporativos), impondo barreiras técnicas, correm o risco de frustrar justamente quem mais precisa sentir que pode moldar uma Inteligência Artificial para si.
Autonomia como princípio
Pareço indignado, mas não. Sei que logo teremos plataformas amigáveis para a criação de agentes de IA por conta própria, assim como, se o usuário quiser, pode mergulhar na sua ferramenta de Inteligência Artificial e aprender sobre como virar um especialista no assunto…
Minha questão é a revolução que a Inteligência Artificial Generativa iniciou (e ainda está em curso) foi, antes de tudo, uma revolução do acesso: uma ferramenta poderosa nas mãos de mais pessoas, em mais lugares, para mais propósitos.
Se queremos que essa revolução cumpra seu potencial, a autonomia do usuário precisa ser defendida como um princípio. Não como um privilégio.
(*) Alexandre Gonçalves é jornalista, fundador da agenteINFORMA – conteúdo e produtos digitais, e editor das newsletters agenteGPT (insights e sua experiência de usuário do ChatGPT), e agenTV3 (monitora e faz curadoria de notícias sobre a implementação da TV 3.0 no Brasil).