Receber uma notificação de infração de trânsito quando você não estava dirigindo o veículo pode gerar frustração e preocupação, especialmente se os pontos forem lançados na sua carteira de motorista injustamente. Isso é mais comum do que se imagina e pode ocorrer por diferentes motivos, como não indicação do verdadeiro condutor, clonagem de veículos ou falhas na transferência após a venda.
Neste artigo, você vai entender passo a passo o que fazer quando a infração não corresponde ao condutor do veículo, como indicar o responsável corretamente, quais os prazos, como se defender e quando é necessário recorrer à Justiça.
Como funciona o registro de uma infração de trânsito
Toda infração de trânsito é vinculada a um veículo por meio da placa. Quando um agente de trânsito autua o veículo durante abordagem, ele identifica diretamente o condutor e registra a infração. Porém, a maioria das infrações no Brasil ocorre sem abordagem, como nos casos de radares eletrônicos, lombadas eletrônicas e câmeras de monitoramento.
Nesses casos, a notificação é enviada ao proprietário do veículo, mesmo que ele não estivesse dirigindo no momento. É por isso que o Código de Trânsito Brasileiro permite a indicação do real infrator, transferindo a responsabilidade pela infração para quem de fato estava dirigindo.
Diferença entre proprietário e condutor do veículo
É fundamental entender que o proprietário do veículo não é, necessariamente, quem está dirigindo. O proprietário é a pessoa cujo nome consta no documento do carro. Já o condutor é quem efetivamente estava dirigindo no momento da infração.
Assim, se outra pessoa cometeu a infração dirigindo seu carro, você pode e deve indicá-la como responsável, dentro do prazo estipulado, para que os pontos não sejam atribuídos à sua CNH injustamente.
O que acontece se não houver indicação do condutor
Quando o proprietário não realiza a indicação do verdadeiro condutor dentro do prazo, presume-se que ele estava dirigindo, e a infração será registrada em seu nome. Isso pode levar a uma série de problemas, como:
Por isso, é essencial agir rapidamente sempre que a infração não corresponder ao condutor real.
Como indicar o condutor infrator corretamente
O procedimento para indicar quem realmente cometeu a infração é simples, mas exige atenção aos prazos e documentos exigidos pelo órgão autuador. Veja o passo a passo:
1. Verifique o prazo na notificação
Normalmente, você tem 15 dias corridos para indicar o condutor a partir da data de recebimento da notificação de autuação.
2. Preencha o formulário de indicação
Cada órgão de trânsito (DETRAN, DNIT, PRF, etc.) tem seu próprio modelo de formulário, disponível no site oficial. Preencha com os dados do proprietário e do condutor.
3. Assinatura de ambas as partes
O formulário deve ser assinado tanto pelo proprietário quanto pelo condutor indicado. Em alguns casos, é necessário reconhecer firma das assinaturas.
4. Anexe os documentos exigidos
Em geral, você deve enviar:
Cópia da CNH do condutor indicado
Cópia do CRLV do veículo
Cópia da notificação
Cópias de RG e CPF das partes (se solicitadas)
5. Envio e protocolo
A documentação pode ser enviada pelos Correios, entregue pessoalmente ou protocolada eletronicamente, conforme o canal disponibilizado pelo órgão de trânsito responsável.
6. Acompanhamento
Verifique se a indicação foi aceita. Se não for, você poderá apresentar defesa administrativa.
O que fazer quando você não sabe quem cometeu a infração
Se a infração foi cometida por alguém que não pode ser identificado (ex: o carro foi furtado, clonado ou emprestado sem autorização), a responsabilidade pela defesa continua sendo do proprietário. Nesses casos, é possível apresentar provas demonstrando que:
O veículo foi furtado ou roubado (com registro de Boletim de Ocorrência)
O veículo foi clonado (com diferenças de características, adesivos, ou local onde estava)
O veículo já havia sido vendido (mas o novo proprietário não fez a transferência)
Infrações com abordagem presencial
Quando há abordagem presencial por parte do agente de trânsito, a infração é registrada com base em uma verificação direta de documentos e do condutor. Mesmo assim, podem ocorrer erros, como:
Troca de documentos entre condutores
Erro de preenchimento no auto de infração
Identificação incorreta do motorista
Se houver evidências claras de erro, é possível contestar a infração com provas documentais, testemunhas ou imagens.
Veículo clonado e infrações atribuídas incorretamente
Casos de clonagem de veículos têm aumentado nos últimos anos. Quando um carro é clonado, outra pessoa utiliza um veículo idêntico ao seu, com a mesma placa, geralmente para cometer infrações ou crimes.
As consequências recaem sobre o proprietário do carro original, que precisa comprovar que não cometeu a infração. Para isso, é necessário:
Registrar um Boletim de Ocorrência
Reunir provas como fotos do carro, laudos periciais, localização via GPS, notas fiscais de serviços
Apresentar defesa ao órgão autuador solicitando o cancelamento da multa
Se o problema persistir, é possível ingressar com ação judicial para anular as penalidades e obter novo número de placa.
Venda do veículo sem transferência e recebimento de infrações
Muitas pessoas vendem o carro e confiam que o novo dono fará a transferência. Porém, isso nem sempre ocorre. Enquanto o novo proprietário não registra a transferência no DETRAN, o antigo dono continua sendo legalmente responsável por:
A forma correta de evitar isso é:
Preencher e assinar o CRV (antigo DUT) com firma reconhecida
Comunicar a venda ao DETRAN com cópia do documento
Guardar todos os comprovantes
Se a infração ocorrer após a venda, esses documentos serão fundamentais para apresentar a defesa.
Como funciona a defesa administrativa de infrações
Quando a infração é indevida ou atribuída ao condutor errado, a lei permite ao cidadão se defender por meio de recursos administrativos. As fases são:
Defesa prévia
Apresentada após a notificação de autuação, antes da multa ser imposta.
Recurso à JARI (1ª instância)
Se a defesa prévia for indeferida e a multa aplicada, é possível recorrer à Junta Administrativa de Recursos de Infrações.
Recurso ao CETRAN (2ª instância)
Se a decisão da JARI também for desfavorável, o cidadão pode recorrer ao Conselho Estadual de Trânsito.
Cada etapa requer argumentação fundamentada, dentro do prazo, e apresentação de documentos e provas.
Quando acionar a justiça
Se os recursos administrativos não forem suficientes para resolver o problema, ou se houver prejuízo relevante, como suspensão da CNH ou dano moral, o caminho judicial pode ser necessário. É possível pedir:
Anulação da infração
Cancelamento dos pontos na CNH
Indenização por danos morais
Troca da placa em caso de clonagem comprovada
Para isso, é recomendado procurar um advogado especializado em direito de trânsito.
Jurisprudência sobre infrações atribuídas indevidamente
A jurisprudência brasileira reconhece o direito do proprietário de não ser responsabilizado por infrações cometidas por terceiros, desde que ele comprove a situação.
Exemplos de decisões judiciais:
Isenção de pontos por venda não transferida devidamente comunicada
Cancelamento de multas de veículo clonado
Reversão de suspensão de CNH por erro de atribuição de infrações
Indenização por dano moral por inscrição indevida em dívida ativa por multa
Esses casos demonstram a importância da documentação e da atuação ativa do proprietário.
Perguntas e respostas
O que acontece se eu não indicar o condutor?
A infração será automaticamente registrada em seu nome, e os pontos lançados na sua CNH.
É possível indicar o condutor após o prazo?
Não. Após o prazo, a indicação não será aceita e será necessário recorrer da infração para tentar reverter a penalidade.
E se o condutor se recusar a assinar o formulário?
A indicação exige a assinatura do condutor. Sem ela, o procedimento não será aceito. Em alguns casos, pode ser necessário recorrer judicialmente.
Como provar que o veículo foi clonado?
Com Boletim de Ocorrência, fotos, perícia, registros de localização, e comparações que demonstrem que o veículo no auto de infração não é o seu.
Se vendi o carro, mas não transferiram, o que fazer?
Apresente a comunicação de venda feita ao DETRAN, cópia do CRV assinado com firma reconhecida e demais comprovantes na defesa da infração.
Preciso de advogado para recorrer da multa?
Não para as fases administrativas, mas é recomendável para ações judiciais ou casos mais complexos, como clonagem ou suspensão da CNH.
Conclusão
Ser responsabilizado por uma infração que você não cometeu é algo injusto e prejudicial. Felizmente, o sistema legal brasileiro oferece mecanismos para que o verdadeiro condutor seja identificado e responsabilizado corretamente.
Agir dentro dos prazos, reunir os documentos exigidos e apresentar a defesa corretamente são os primeiros passos. Quando for necessário, o caminho judicial também pode ser uma alternativa eficaz, especialmente em casos graves como clonagem, fraude ou prejuízo à vida profissional do condutor.
Se você recebeu uma infração que não corresponde ao condutor real do veículo, não ignore. Corrigir esse erro é seu direito e sua responsabilidade.